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OPINIÃO

Investir na cultura não é mamata, é adubo

8.fev.23 - A ministra da Cultura, Margareth Menezes, recebe jornalistas em café da manhã - Joedson Alves/Agencia Brasil
8.fev.23 - A ministra da Cultura, Margareth Menezes, recebe jornalistas em café da manhã Imagem: Joedson Alves/Agencia Brasil

Margareth Menezes*

Especial para UOL

23/03/2023 04h00

Assumimos o novo Ministério da Cultura com uma missão muito especial, irrigar e fazer reflorescer a produção artística e cultural brasileira, depois de mais de quatro anos de perseguição e desrespeito aos milhares de trabalhadores da cultura que desenvolvem, dignamente, suas atividades profissionais por toda uma vida e até por gerações.

O nosso setor cultural sempre produziu conquistas valiosas e já colocou o Brasil em posição de destaque através da emancipação, transformação e desenvolvimento social e econômico.

Somos 6 milhões de trabalhadores, homens e mulheres, de todas as idades, de todas as raças, de todos os gêneros. Estamos em todos os lugares trabalhando, aprendendo, enriquecendo e embelezando o mundo com aquilo de mais singular que é produzido pela humanidade: a arte.

O Brasil é um país cheio de cores, sabores, sons, imagens, tradições. Somos um povo criativo, diverso, estamos juntos, misturados, singular e plural. E não apenas nos realizamos e nos identificamos nessa bela mistura, mas absorvemos outros fazeres que, mais ainda, nos enriquecem como sociedade. Temos como reposta o reconhecimento do nosso povo, que é o nosso suporte.

O retorno do MinC (Ministério da Cultura) e da produção cultural brasileira se torna mais intenso e simbólico neste momento em que reatamos a vida plena em sociedade, com a democracia restaurada e sem o sofrimento que nos foi imposto pelo desmonte da pasta, pela perseguição política e pela pandemia de covid-19.

Nesse contexto, entre os segmentos produtivos da economia, foram os trabalhadores e trabalhadoras da cultura e nossas atividades culturais que mais sofreram as consequências impostas nessa travessia amarga.

A atividade cultural é, quase sempre, coletiva, gregária. O desmonte do MinC deixou sequelas profundas na produção econômica do setor.

Choramos, sofremos e morremos, também. Perdemos espaço de trabalho, ao menos 300 cinemas fecharam e continuam fechados, em um país em que só 7% dos mais de 5.000 municípios possuem esse equipamento.

Essa retomada do fazer da cultura não poderia ser realizada sem o justo financiamento aos seus realizadores. Quando traduzimos nossa atividade em valores econômicos, nosso setor é responsável por 3,1% da riqueza nacional. Mesmo sendo um potente setor produtivo, até hoje recebíamos apenas 0,5% dos incentivos fiscais que eram destinados, anualmente, pelo governo federal.

Essa renúncia de impostos é oferecida pela Lei Rouanet, uma importante ferramenta de financiamento da cultura brasileira que possibilitou que, a cada RS 1,00 renunciado, R$ 1,60 retornasse à economia.

Os recursos da Lei Rouanet estão viabilizando, todos os anos, a execução de cerca de 3.000 ações culturais, em todas as linguagens artísticas.

Essas ações promoveram a profissionalização do setor, com a formação e o crescimento de atores, músicos, compositores, técnicos, produtores, diretores, roteiristas, cineastas, figurinistas, cenógrafos, costureiras, marceneiros, eletricistas e dezenas de outros profissionais da cultura que, juntos, movem essa grande engrenagem que é a construção de um bem cultural. Apesar desse impacto relevante, a lei não prescindia de ajustes em sua gestão.

Com o apoio do presidente Lula e a cultura na pauta principal do seu governo, poderemos ampliar as possibilidades de suporte, com recursos oriundos das leis Paulo Gustavo e Aldir Blanc. Com esses dois novos mecanismos de financiamento, chegaremos aos mais diversos fazedores da cultura, localizados em todos os lugares do Brasil, mediante o repasse de recursos financeiros para estados e municípios.

Neste novo cenário, é imprescindível a invenção de um novo arcabouço legal que enxergue a cultura brasileira em toda a sua especificidade e diversidade, que reconheça as distintas necessidades dos realizadores e que entenda a dinâmica de produção dos segmentos artísticos.

Simplificar os procedimentos, privilegiar a avaliação dos resultados obtidos e ampliar a fruição dos bens culturais pela sociedade brasileira são as mais importantes metas quando pensamos em financiar um setor que tem a criatividade como insumo primeiro. Tudo com mais transparência, mais segurança processual e jurídica, mais tecnologia de acompanhamento e maior possibilidade de distribuição equilibrada em todo o país.

Os principais avanços, no fomento direto, são as novas definições e modelos dos mecanismos que promoverão melhor gestão dos recursos, possibilitando a manutenção de espaços culturais, a concessão de bolsas e premiação, a implementação de instrumentos de financiamento reembolsável e a realização de editais de apoio à produção cultural.

No fomento indireto, via incentivos fiscais da Lei Rouanet, retornamos os projetos de planos anuais ou plurianuais, apresentados por instituições culturais, museus, orquestras, grupos de teatro e outros corpos artísticos estáveis.

Requalificamos a Cnic (Comissão Nacional de Incentivo à Cultura), com a participação de membros da sociedade de todas as regiões, representando nossa pluralidade. Ainda, faremos o diálogo com patrocinadores com o objetivo de induzir a desconcentração dos recursos e viabilizar ações que tenham conexão com as demandas do setor.

Financiar o fazer cultural e entregar resultados à sociedade nunca foi mamata. Se trata de "adubar", de "aguar" e fazer "florescer" a inventividade dos brasileiros e dos trabalhadores da cultura, promovendo o desenvolvimento e a proteção das diversas manifestações artísticas e culturais, para reconstrução de um Brasil diverso, alegre, colorido, sonoro, unido e sem ódio.

O MinC voltou!

*Margareth Menezes é cantora, compositora e Ministra da Cultura no governo Lula.