STF derruba liminar que obrigaria Congresso a votar 3.210 vetos presidenciais em ordem cronológica
Por seis votos a quatro, o STF (Supremo Tribunal Federal) derrubou a liminar que obrigaria o Congresso a votar em ordem cronológica 3.210 vetos presidenciais sem apreciação, acumulados desde 2000, antes de tratar qualquer outra matéria. A questão foi julgada pela Corte em sessão plenária nesta quarta-feira (27), em Brasília.
ENTENDA A QUESTÃO
• A Constituição estabelece que o Congresso aprecie os vetos presidenciais em até 30 dias depois de sua publicação. Se os vetos não forem votados nesse prazo, a pauta da Câmara e do Senado fica trancada, isto é, nenhum projeto pode ser votado até que o veto seja apreciado.
• Desde 2000, o Congresso não cumpre a Constituição, e 3.210 vetos presidenciais não apreciados estão acumulados. Durante esse período, a pauta das casas não foi trancada graças a acordos entre os parlamentares.
• Em dezembro de 2012, a presidente Dilma Rousseff vetou o dispositivo aprovado pelo Congresso que determinava aos Estados e municípios produtores a distribuição dos royalties do petróleo de contratos já firmados ou licitados.
• O veto de Dilma incomodou a maioria dos parlamentares, que se articularam para derrubar o veto no Congresso.
• Para evitar a derrubada do veto, parlamentares de Estados produtores entraram com uma ação no STF, questionando os mais de 3.200 vetos que não foram apreciados pelo Congresso.
• O ministro Luiz Fux, em decisão provisória, aceitou o pedido dos deputados e determinou que o Congresso aprecie os vetos em ordem cronológica, caso contrário nenhum projeto poderá ser votado.
• Polêmica, a questão envolve os três poderes e opõe parlamentares de Estados produtores e não-produtores. O Executivo teme que a derrubada "em massa" dos vetos provoque um rombo de R$ 470 bilhões. Congresso e Palácio do Planalto temem também que haja um colapso institucional se a decisão de Fux for mantida.
Seis magistrados --o revisor Teori Zavascki, Rosa Weber, Dias Toffoli, Cármen Lúcia, Ricardo Lewandowski e Gilmar Mendes-- divergiram do relator do processo, ministro Luiz Fux, que defendia a votação dos vetos em ordem cronológica. Marco Aurélio Mello, Celso de Mello e Joaquim Barbosa seguiram o relator.
O tema entrou para o âmbito do Supremo em dezembro passado, quando Fux, em decisão individual, aceitou o mandado de segurança do deputado federal Alessandro Molon (PT-RJ) e concedeu liminar que impedia o Congresso de votar qualquer projeto até que todos os vetos fossem apreciados em ordem cronológica.
O parlamentar fluminense impetrou o mandado para evitar que o Congresso Nacional derrubasse os vetos da presidente Dilma Rousseff na lei dos royalties. A mandatária vetou dispositivos na lei que obrigavam os Estados e municípios produtores de petróleo a distribuir os royalties --compensação financeira pela produção-- de contratos já firmados e licitados.
Hoje, na votação colegiada, o relator manteve seu entendimento. “É inconstitucional a apreciação aleatória dos vetos presidenciais pendentes”, afirmou. “Resta necessário a apreciação dos vetos presidenciais em sua ordem cronológica”, acrescentou o ministro Fux.
“É absolutamente inimaginável que no exercício da função jurisdicional se possa se dizer ‘o que passou, passou’”, disse. "Todos os vetos são urgentes de forma equivalente."
Marco Aurélio classificou o acúmulo de vetos como "ato omissivo dos nossos representantes", assim como Barbosa, que em voto breve sustentou que a questão dos vetos acumulados é um “fenômeno de extrema gravidade.”
Apesar de seguir o relator, Barbosa afirmou que a questão é "um exemplo da hipertrofia do poder executivo no nosso sistema de governo.”
Ministros divergem de relator
Zavascki divergiu do relator ao considerar que o mandado de segurança, com pedido de liminar, não pode servir de instrumento de repressão "às normas editadas pelo Legislativo em desacordo com o processo legislativo."
O magistrado argumentou que o tema dos vetos presidenciais no Congresso não pode ser tratado pelo STF no julgamento de uma liminar. “Não se mostra compatível com o sistema brasileiro o controle de constitucionalidade por mandados de segurança”, sustentou o revisor.
"Dada a gravidade da situação, a continuidade [dos trabalhos do Legislativo] se impõe para debater a decisão com tranquilidade”, disse Cármen Lúcia.
Toffoli afirmou que o STF não pode determinar a apreciação cronológica dos vetos porque essa decisão prejudicaria os trabalhos do Congresso. "Não podemos obstar o Legislativo de legislar.”
Apesar de seguir o revisor, Gilmar Mendes classificou o acúmulo dos vetos como "um dado que evidencia alguma patologia, alguma doença [do Congresso]."
Royalties
Molon entrou com mandado de segurança para suspender a sessão do Congresso de dezembro na qual seriam apreciados os vetos da presidente à lei dos royalties aprovada no Legislativo.
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Dilma vetou o dispositivo aprovado no Congresso que permitia a redistribuição dos royalties do petróleo para contratos já licitados e firmados com os Estados e municípios produtores, aplicando a regra somente para contratos futuros. A decisão desagradou a deputados de Estados não-produtores, que se mobilizaram para derrubar o veto.
Diante da iminência da derrubada do veto, os parlamentares dos Estados produtores --em especial do Rio de Janeiro-- fizeram manobras para impedir a votação na Câmara. Uma delas foi o mandado de segurança apresentado por Molon e aceito por Fux, que é carioca.
Repercussão
Parlamentares dos Estados produtores de petróleo, Rio de Janeiro e Espírito Santo, afirmaram ao UOL que vão entrar com Adins (ações diretas de inconstitucionalidade) caso o Congresso derrube os vetos da presidente Dilma Rousseff à lei que regula a distribuição dos royalties do petróleo.
"Nós perdemos uma batalha, mas não perdemos a guerra", afirmou Molon. "Lamento profundamente a decisão [do Supremo]. Na prática, ela vai permitir que o Congresso derrube o veto dos royalties, violando mais uma vez a Constituição."
O senador Ricardo Ferraço (PMDB-ES) também criticou a decisão do STF. “Toda minha expectativa era que Supremo mantivesse a liminar. Essa liminar abria de fato uma oportunidade para que nós tivéssemos uma regra estabelecida, uma forma de as minorias [no Legislativo] serem minimamente respeitadas.”
3.210 vetos
A decisão do ministro impediu o Congresso de votar qualquer matéria --exceto Medidas Provisórias (MPs)-- até que fossem apreciados, em ordem cronológica, 3.210 vetos presidenciais, relativos a mais de 200 matérias, que não foram tratados no Congresso desde 2000.
A Constituição Federal estabelece que o Legislativo aprecie em no máximo 30 dias os vetos presidenciais. Caso o veto não seja votado, os parlamentares ficam impedidos de aprovar qualquer projeto, e a pauta da casa fica trancada --e somente Medidas Provisórias podem ser apreciadas.
Nos últimos 13 anos, entretanto, os parlamentares desrespeitaram a regra, por meio de acordos e manobras políticas. Desde a decisão de Fux, nenhum projeto foi tratado no Legislativo, inclusive a Lei Orçamentária Anual de 2013 (LOA), que deveria ter sido aprovada em dezembro de 2012.
Além da distribuição dos royalties do petróleo, os vetos não apreciados dizem respeito a temas como as mudanças no Código Florestal, aprovadas no ano passado; ao aumento de salários de servidores públicos; à criação de cargos em autarquias e tribunais; e até sobre reajustes de salários mínimos.
Entre os 224 projetos vetados, em 57 o veto presidencial foi integral e 167 tiveram vetos parciais. A Câmara, em média, aprova mais de 700 projetos por ano. Só da MP do Código Florestal, por exemplo, foram 140 trechos vetados em uma única proposta. Desde os vetos dos royalties, já foram vetadas 20 propostas, que resultaram em 42 vetos.
O temor da Presidência da República é que a derrubada “em massa” dos vetos provoque um rombo no orçamento de 2013. Cálculos apresentados pelo Executivo mostram que os gastos com os vetos podem ultrapassar os R$ 470 bilhões.
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