Esquema em Blumenau (SC) fraudou até conserto em mecânica; candidato comprou voto por R$ 20
Vinícius Segalla e Guilherme Balza
Do UOL, em Blumenau (SC) e São Paulo
04/05/2013 06h00
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Investigações do Ministério Público de Santa Catarina apontam que o esquema instalado em Blumenau (139 km de Florianópolis) para desviar recursos públicos além de fraudar licitações milionárias alcançou também serviços menores, como consertos de carros.As fraudes nas contratações ocorriam com a participação de servidores da URB (Companhia Urbanizadora de Blumenau), apontada pelo MP como pivô no esquema, que pode ter desviado mais de R$ 100 milhões, para beneficiar empreiteiras e candidatos a vereador ligados ao esquema.
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Uma das interceptações telefônicas do MP mostra a servidora Maria Helena Pereira Gastaldi, responsável pelo setor de compras da URB, conversando com uma representante de uma oficina mecânica chamada Letícia. No diálogo, a interlocutora diz que o conserto de uma picape Saveiro ficou orçado em R$ 2.771, porque seria necessário “fazer o motor todo”.
Em resposta, Gastaldi pede à Letícia que consiga mais dois orçamentos em outras mecânicas porque a “lei manda fazer três orçamentos”. A interlocutora responde que até segunda-feira enviaria os outros orçamentos, conforme pedido.
As investigações apontam que, além das fraudes, os servidores, em troca de propina e outras vantagens, viabilizavam o desvio de material da URB para empreiteiras, autorizavam a contratação de funcionários fantasmas e adulteravam medições de obras.
Segundo o MP, o esquema de fraudes em licitações para desviar dinheiro público teve a participação ativa de vários servidores subordinados a Eduardo Jacomel, então diretor-presidente da URB, como Victor Silveira Faria, diretor técnico da URB e coordenador da campanha do vereador Robinsom Soares, o Robinho, além da própria Maria Helena.
As transcrições mostram que Victor, aproveitando-se das prerrogativas de seu cargo, fez favores a eleitores para angariar votos a Robinho, como direcionar o asfaltamento de vias, fazer religações de energia, entre outros. O investigado, sustenta o MP, utilizou telefone funcional e veículo da prefeitura em atos de campanha.
Conversas entre Victor e Maria Helena com o empreiteiro Moisés Rodrigues, o Tchê, indicam que os dois servidores receberam propina pelos atos ilícitos.
Voto por R$ 20
Um dos candidatos beneficiados pelo esquema em Santa Catarina foi Bráz Roncáglio (PR), que não se elegeu vereador no ano passado, mas hoje ocupa o cargo de segundo suplente do PR na Câmara de Blumenau.
Roncáglio era diretor de gerência na Secretaria de Articulação Política de Blumenau, mas se afastou do cargo para a disputa eleitoral. As investigações mostram que ele usou os contatos e as facilidades que tinha por ter trabalhado na administração municipal para obter favores eleitorais.
A exemplo de outros candidatos, a principal “tática” de Roncáglio era direcionar o asfaltamento de vias que poderiam beneficiá-lo eleitoralmente, conforme demonstram várias interceptações feitas pelo Ministério Público.
Em uma das ligações, com data de 3 de julho de 2012, Braz se esqueceu de desligar o celular após encerrar a conversa e foi flagrado comprando um voto por R$ 20. Segundo o MP, um transeunte o reconheceu no carro e se aproximou. Em seguida, o candidato afirmou que ele costuma ajudar as pessoas pobres.
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O interlocutor, então, pede ajuda para comprar um “arrozinho” porque se acidentou e está na “pior”. Braz, então, lhe dá R$ 20 para “comprar comidinha” e diz que é “filho do povo” e gosta de ajudar quem trabalha, de acordo com a transcrição.
Célio Dias
Outro candidato que teria se beneficiado com o esquema é Célio Dias (PR), que se elegeu vereador no município com a maior votação de seu partido, com 2.606 votos.
De acordo com o Ministério Público, Dias, enquanto candidato, se aproveitou da influência que tinha por ter sido diretor administrativo e financeiro da Secretaria de Articulação Política e ex-diretor-presidente da URB para conquistar votos.
Ele teria liberado alvarás a comerciantes em troca de apoio político e se beneficiado da relação com o empreiteiro Israel de Souza, cujas empresas mantinham dezenas de contratos com a administração municipal.
As transcrições mostram Dias pedindo material de pavimentação para Israel e demonstram que a campanha do vereador utilizou caminhões e kombis das empresas do empreiteiro para a instalação de placas e outros serviços –o que é considerado crime eleitoral.
Segundo o MP, o esquema criminoso instalado na URB permaneceu atuando durante a presidência de Dias na URB.
Outro lado
Roncáglio conversou por telefone com a reportagem e disse que só irá se pronunciar, respondendo às acusações, depois da decisão do TRE. “Muita coisa que se fala não se faz. E muita coisa que não se fala, se faz”, disse. “Não há nada que me desabone nas minhas escutas telefônicas. Não cometi roubo, nada dessas coisas”, afirmou.
A reportagem ligou para o gabinete de Célio Dias, mas foi informada por uma assessora de que ele não irá falar sobre o assunto até a decisão do TRE sobre sua candidatura.
O UOL ligou para o celular de Maria Elena, mas não a localizou. Victor também foi procurado no telefone pessoal, mas não atendeu a ligação. Uma mensagem eletrônica foi deixada na caixa postal dele, porém até o fechamento da reportagem não houve retorno por parte do investigado.
Ambos foram procurados na URB, mas uma mulher disse que eles não trabalham mais no órgão.