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Em vídeo, Doria "promove" marca de empresário que fez doação à prefeitura

No vídeo de um minuto, o prefeito mostra os produtos da marca de um empresário que doou R$ 600 mil à Prefeitura de SP - Divulgação
No vídeo de um minuto, o prefeito mostra os produtos da marca de um empresário que doou R$ 600 mil à Prefeitura de SP Imagem: Divulgação

Janaina Garcia

Do UOL, em São Paulo

15/02/2017 15h48Atualizada em 15/02/2017 15h48

Um vídeo de um minuto com a propaganda de suplementos vitamínicos de uma rede popular de farmácias de São Paulo viralizou na internet nos últimos dias não pelos produtos, mas pelo garoto-propaganda.

Nele, o prefeito de São Paulo, João Doria (PSDB), aproveita a quarta reunião do secretariado para divulgar os produtos do empresário Sidney de Oliveira, dono da rede Ultrafarma –que tem entre os garotos-propagandas contratados nomes como o jogador Neymar.

Um dia antes, Oliveira havia formalizado a doação de um cheque de R$ 600 mil à Prefeitura para a compra de medicamentos à rede municipal de saúde.

De acordo com a assessoria de imprensa da administração, a quantia foi repassada “dentro do que determina a legislação e não envolve contrapartidas aos doadores”. A doação será publicada no Diário Oficial em cerca de 20 dias.

No vídeo, Doria explica que dará “mais uma boa dose de vitamina” para os secretários e expõe, para a câmera, frascos de suplementos como ômega 3 e vitaminas com a logomarca de Oliveira. Segundo o prefeito, é o jeito de “aguentar o tranco” imposto pela rotina de trabalho.

O vídeo foi compartilhado nas redes sociais do tucano, que tem presença contumaz no ambiente digital –com mais de 2,2 milhões de seguidores no Facebook, no Instagram e no Twitter.

Divulgação divide seguidores do tucano

No Twitter, a divulgação promovida por Doria recebeu críticas e elogios. “Vitamina Sidney Oliveira da Ultrafarma. Ê mercham [merchandising] heim prefeito! Ele fez doação para as farmácias das UBSs? Pra merecer isso?”, escreveu um usuário identificado como Cícero. “Prefeito, acompanho suas publicações todos os dias, mas ainda não vi [nada] sobre o transporte escolar cancelado. Pode falar sobre isso?”, pediu a usuária Bárbara.

“Não consigo entender algumas pessoas, se o político não trabalha reclama, se trabalha tem que aguentar esses chatos”, defendeu o usuário Adilson. Também o usuário identificado como “O misantropo” se mostrou favorável à divulgação dos produtos feita por Doria: “Já fiz minha lista de suplementos pra comprar”, postou.

Para especialistas, vídeo é legítimo

Para professores dm direito consultados pela reportagem, a propaganda dos produtos feita por Doria é legítima, uma vez gratuita, face à doação feita pelo empresário antes do vídeo.

“É possível que as entidades privadas façam doações à prefeitura --e é perfeitamente legítimo que o prefeito faça esse tipo de divulgação sem estar pagando por isso, sem esse comprometimento. É natural que a prefeitura dê algum tipo de publicidade”, afirmou a professora de direito administrativo da FGV (Fundação Getúlio Vargas) Vera Monteiro.

Na avaliação da advogada, havendo interesse da comunidade empresarial em colaborar com a prestação de serviços da prefeitura, “e se não houver nenhum tipo de restrição ao acesso a esse tipo de relacionamento”, não há impedimento para vídeos como o que o tucano promoveu.

“Quanto mais doações, melhor. Quanto mais remédios ou produtos para a saúde, por exemplo, melhor --e acredito que isso venha como contrapartida à doação”, disse, para completar: “Não é só um ato de benemerência --é natural que, após doarem, os empresários queiram alguma publicidade disso”, definiu.

Segundo a Prefeitura, porém, as duas situações não têm relação.

Professor de direito público na faculdade de direito da UnB (Universidade de Brasília), Jorge Galvão analisou que o vídeo “não quebra a impessoalidade prevista na Constituição”, ao administrador público, porque não envolve algum tipo de pagamento.

“Se fosse algo mais incisivo, com o prefeito fazendo propaganda para a marca, em vídeo institucional da empresa, ou então para as emissoras de TV e rádio, teríamos um problema. No caso em questão, não parece haver nada que configure o dolo de se locupletar como agente político”, concluiu.