Marcha para Jesus em SP prega contra corrupção, poupa Temer e defende reformas
O discurso de combate à corrupção abriu nesta quinta-feira (15), em São Paulo, a 25ª edição da Marcha Para Jesus, maior evento evangélico do país. A estimativa dos organizadores é de que 2 milhões de fiéis participem do ato ao longo do dia. A Polícia Militar não fez estimativa.
Apesar das críticas à corrupção na classe política, os organizadores da marcha pouparam o presidente Michel Temer (PMDB), investigado e citado em delações da JBS, e apoiaram a aprovação das reformas Trabalhista e Previdenciária, mote de manifestações públicas que levaram milhares de pessoas às ruas nas últimas semanas.
"A oração inicial foi para mostrar que só ela mesmo, a oração, para quebrar esse ciclo de corrupção que estamos enfrentando no país", explicou ao UOL o apóstolo Estevam Hernandes, fundador da marcha. Para ele, na prática, isso se traduz na necessidade de "uma renovação completa na política".
Indagado se isso representaria, por exemplo, também a renúncia ou o impeachment de Temer --que foi convidado para o evento, mas não confirmou presença--, o apóstolo negou.
"Estamos em um processo em que ele já substituiu Dilma Rousseff e, apesar de ele ter o nome citado em delações, não há uma sentença definitiva. Além disso, sinto que o país talvez não suportasse outra mudança tão brusca de rumos --acredito que a mudança mesmo deve vir pelas eleições de 2018", acrescentou. "Isso é o que todo mundo espera."
Mais tarde, porém, em entrevista coletiva, Hernandes minimizou: disse ser "favorável a que se termine esse mandato por causa de todo o trauma que a nação tem passado", só que ressalvou: "Mas não que nós ou eu tenhamos um apoio explícito em relação ao Temer".
"Nós oramos contra a corrupção, a prostituição, baseados em um princípio de que a bíblia fala que se nós oramos e clamamos, Deus muda as situações", definiu. "Se ele [Temer] se recuperar desse momento crítico pelo qual está passando, e se ele tiver uma sustentação do congresso, ele pode chegar ao final do mandato -- agora: a gente sabe que é extremamente complicado", concluiu.
Sobre o que o público evangélico espera de um Congresso substancialmente envolvido em escândalos de corrupção? "Que se votem projetos fundamentais à retomada da economia, como as reformas Trabalhista e Previdenciária. Pessoalmente, sou a favor de ambas", posicionou-se o apóstolo.
Em sentido oposto ao do fundador da Renascer, entidades da sociedade civil organizada vêm se mostrando mais céticas e contrárias aos supostos benefícios das reformas. Uma delas, por exemplo, foi a CNBB (Conferência Nacional dos Bispos do Brasil), que se posicionou publicamente contra as medidas por considerar que elas "escolhem o caminho da exclusão social" ao prejudicar direitos dos trabalhadores.
Também coordenador da Marcha, o bispo Leandro Miglioli --que se apresenta como "Leandro Hernandes", já que o apóstolo e fundador da Renascer é considerado seu "pai espiritual" -- disse que a postura da Marcha "é clamar, e não ser combativa".
"A posição da Marcha em relação a todas essas questões do momento político é apenas no sentido de orar para que haja sabedoria", definiu. "Mas, em todas as esferas, há quem faz o bem e quem faz o mal --cabe às pessoas separar o joio do trigo. A massa evangélica tem liberdade para isso", encerrou.
Alckmin e Doria ausentes
Entre os políticos presentes à marcha deste ano, estão o senador e bispo Magno Malta (PR-ES) e deputados federais e estaduais. O governador de São Paulo, Geraldo Alckmin (PSDB), havia confirmado presença no evento, mas acabou cancelando no começo da tarde, segundo a assessoria do Palácio dos Bandeirantes.
"É possível separar as coisas --não estamos validando ninguém, e não será autorizado comício político", respondeu Hernandes, sobre o fato de o governador paulista também figurar na lista de delação de executivos da Odebrecht, no âmbito da operação Lava Jato.
À tarde, quem compareceu foi o prefeito em exercício da Capital, Bruno Covas (PSDB), que explicou que o titular, João Doria (PSDB), está em viagem a Porto Rico pelos 15 anos da filha. "É uma viagem agendada há mais de dois anos -- muito antes de ele [Doria] sonhar em disputar as prévias do partido".
Ao todo, oito trios elétricos comandam a micareta gospel da praça da Luz, desde as 10h, até a praça Heróis da FEB, na zona norte.
"Ainda que o Diabo não queira, o Brasil é do Senhor"; "O nosso general é Cristo" e "Esta é a forma de mudar este país: orando" são alguns dos brados nos carros de som.
Fiéis evitam comentar crise política
No meio da multidão, a gerente de contas Paula Endo, 35, disse ter ido à Marcha "para agradecer e entregar o ano novo". Ela contou que acabou de retornar com a família das imediações de Miami, nos Estados Unidos, onde viveram nos últimos três anos.
Qual a sensação de estar de volta no meio de uma crise política e econômica?, quis saber a reportagem.
"Mesmo fora, eu acompanhava o que se passava aqui. Me parece muito claro que o povo não parte para mudança. --elegeu as pessoas que estão no poder, mas essas parecem não saber fazer o que se espera delas". Sobre a crise no governo Temer e no Congresso, porém, preferiu não opinar.
As amigas Bruna Silva, 44, dona de casa, e Leticia Rodrigues, 30, auxiliar de cozinha, ambas da Mooca, estavam este ano pela primeira vez na Marcha. Ambas disseram rezar "pela família" e "contra a fome", mas também preferiram não avaliar o que acham do momento político do país.
"Mudou o governante, mas não mudou nada com isso. Seguimos pagando pelos erros dos outros", resumiu Bruna. "Sobre político nem opino, porque me parecem todos iguais", arrematou Leticia.
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