Antes mesmo de criá-lo, Câmara tira regra que poderia dar R$ 3,6 bi a fundo eleitoral
A Câmara dos Deputados decidiu na noite desta quarta-feira (23) fatiar o texto-base da PEC (Proposta de Emenda à Constituição) 77/03, da reforma política, e começou a colocar em votação separadamente os pontos do projeto. A estratégia, negociada desde ontem entre o presidente da Casa, Rodrigo Maia (DEM-RJ), e os líderes das bancadas, foi fazer o parcelamento para que o projeto não fosse rejeitado integralmente.
Com a decisão, o primeiro ponto a ser colocado em votação foi a vinculação do fundo público de financiamento de campanhas eleitorais às receitas tributárias do governo federal. E os deputados decidiram por 441 votos a 1 não vincular o fundo à receita da União.
Da forma como foi aprovado na comissão especial que discutiu a proposta de reforma política nos últimos meses, o texto da PEC 77/2003 estabelecia a criação do "Fundo Especial de Financiamento da Democracia", que seria abastecido por 0,5% da receita líquida do país apurada nos 12 meses anteriores.
Para a eleição do ano que vem, por exemplo, o valor do fundo, a partir da renda somada entre junho de 2016 e junho de 2017, seria de aproximadamente R$ 3,6 bilhões.
A ideia do relator da proposta, deputado Vicente Candido (PT-SP) é que, ao invés de ter o percentual pré-determinado na Constituição, o montante destinado ao fundo seja definido na Lei Orçamentária, pela Comissão Mista de Orçamento do Congresso, no ano anterior a cada eleição.
Deputados que se manifestaram contra a vinculação alertaram, porém, que a retirada do item não significa que o valor não será ainda maior. O fundo com dinheiro público foi chamado de "obsceno" no plenário.
Curiosamente, a decisão sobre a fonte de receita do fundo foi tomada antes mesmo de a criação dele ser aprovada. Este será o terceiro ponto do projeto a ser votado, ainda sem data, já que a sessão de hoje foi encerrada. Em outro dia, os deputados também votarão mudanças no sistema eleitoral, com a possível criação do voto "distritão".
A expectativa é que a votação da reforma política só seja retomada na semana que vem, já que às quintas-feiras normalmente não há quórum para a apreciação de PECs, que exigem votos de 60% dos 513 parlamentares.
O item foi o primeiro a ser apreciado nesta quarta-feira no primeiro turno da votação fatiada da PEC, cujos rito e ordem foram definidos após um acordo de líderes e consulta ao plenário via requerimento proposto pelo PP. Por conta da repercussão negativa do valor do fundo, houve consenso de que esse deveria ser o primeiro ponto votado pelos deputados.
A apreciação da PEC havia sido pautada para o plenário e adiada duas vezes --ontem e na quarta-feira da semana passada-- por falta de consenso sobre as principais propostas do texto.
Na votação fatiada determinada pelo plenário, o próximo item votado será o sistema eleitoral. Os deputados vão decidir se instituem o modelo conhecido como "distritão" nas eleições de 2018 e 2020 e do distrital misto a partir de 2022.
Por se tratar de uma proposta de Emenda à Constituição, a matéria precisa ser aprovada por três quintos dos deputados (308) e dos senadores (49), em dois turnos na Câmara e em dois turnos no Senado, para entrar em vigor. Caso haja qualquer mudança no texto durante essa tramitação, o processo é reiniciado.
Para que as mudanças passem a valer já nas eleições do ano que vem, todo o processo precisa ser encerrado no Legislativo até a primeira semana de outubro, em acordo com o princípio da anualidade. O tema é tratado hoje como prioridade no Congresso.
Outros projetos de reforma
Além da PEC 77/03, também estão em tramitação na Câmara outros dois textos de reforma política. Também sob relatoria de Vicente Candido, um projeto de lei dispõe sobre assuntos como a regulamentação da distribuição do fundo público proposto na PEC e outras normas infraconstitucionais, como as regras para propaganda eleitoral, por exemplo. A votação do relatório de Candido estava marcada para esta quarta (23) na Comissão Especial de Reforma Política, mas a sessão foi encerrada quando o plenário começou a distutir a PEC 77/03. Assim, a votação na comissão deve ser retomada na terça que vem.
Já o texto-base da PEC 282/16, que foi proposto pelos senadores Ricardo Ferraço (PSDB-ES) e Aécio Neves (PSDB-MG), está sob relatoria da deputada Shéridan (PSDB-RR), foi aprovado em comissão na tarde desta quarta e também deverá ir a plenário na próxima semana. O relatório propõe o fim das coligações e a criação da cláusula de barreira --ou de desempenho-- dos partidos.
Confira abaixo as principais mudanças propostas pela reforma política:
Financiamento público de campanha
Atualmente: Com a proibição das doações de pessoas jurídicas a campanhas eleitorais pelo STF (Supremo Tribunal Federal) em 2016, só é permitido aos partidos usar valores do Fundo Partidário - fundo anual de manutenção dos partidos -, doações de pessoas físicas e recursos do próprio candidato para custear as campanhas.
Como pode ficar: O reflexo da proibição de doações de empresas foi sentido nas eleições municipais do ano passado, que custaram R$ 3,5 bilhões – em 2012, foram consumidos R$ 4,6 bilhões em valores atualizados. Como alternativa, os parlamentares querem criar o FFD (Fundo Especial para o Financiamento da Democracia), que seria um fundo com dinheiro público, cujo valor seria atrelado à receita corrente líquida da União.
Inicialmente, o Fundo corresponderia a 0,5% da Receita Líquida da União apurada no período de 12 meses encerrado em junho do ano anterior à eleição. Para as eleições de 2018, esse valor seria em torno de R$ 3,6 bilhões. No entanto, por causa da repercussão negativa na sociedade, os deputados tiraram essa porcentagem fixa de pauta. Agora, a proposta é que o valor do Fundo seja decidido anualmente na Lei Orçamentária, pela Comissão Mista de Orçamento do Congresso.
Eleição de deputados e vereadores
Atualmente: No sistema atual, o proporcional, o candidato conta com os seus votos e com aqueles dados ao partido ou à coligação para ser eleito. Neste modelo, candidatos com poucos votos podem acabar se elegendo se parceiros de sigla tiverem obtido votações maciças, que garantiram uma cota grande de cadeiras para o partido, enquanto políticos com uma votação mais expressiva podem ficar de fora.
Como pode ficar: A partir do ano que vem, se a proposta for aprovada, os parlamentares das câmaras municipais, assembleias legislativas e a Câmara dos Deputados serão escolhidos por um modelo eleitoral majoritário, apelidado de “distritão”, em que são eleitos os deputados mais votados em cada Estado. Neste modelo, não há votos em partidos.
A partir de 2022, o distritão daria lugar ao distrital misto. Nele, o eleitor dá dois votos para o Legislativo: um para o candidato do partido no distrito dele e outro para qualquer candidato do partido na cidade ou no Estado que ele mora. O candidato mais votado em cada distrito é eleito para metade das vagas na casa legislativa. A outra metade é preenchida pelos mais votados dos partidos.
Fim das coligações partidárias
Uma das PEC da reforma política quer proibir a formação das coligações partidárias nas eleições para o Legislativo a partir de 2020. Além disso, a nova regra limitaria o acesso dos partidos ao fundo partidário e à propaganda gratuita no rádio e na TV, por meio do critério de representatividade do partido na Câmara dos Deputados. Atualmente todos os 35 partidos políticos existentes no Brasil têm direito a receber os recursos do Fundo Partidário.
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