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Com cortes na Justiça do PR, juiz federal preserva equipe de Moro na Lava Jato

Marcelo Malucelli, diretor da Justiça Federal no Paraná - Nathan Lopes/UOL
Marcelo Malucelli, diretor da Justiça Federal no Paraná Imagem: Nathan Lopes/UOL

Nathan Lopes e Flávio Costa

Do UOL, em Curitiba

16/09/2017 04h00

Diretor da Justiça Federal no Paraná, o juiz Marcelo Malucelli diz estar movendo esforços para evitar prejuízos à Operação Lava Jato, frente ao contingenciamento de recursos federais e à falta de funcionários do Judiciário.

Em entrevista exclusiva concedida ao UOL na última quinta-feira (14), o magistrado afirmou que o órgão está enfrentando dificuldades em repor as vagas de quem está se aposentando. A diminuição natural dos quadros, porém, não tem afetado a 13ª Vara, do juiz federal Sergio Moro. Funcionários de outras varas foram realocados para auxiliar o trabalho do juiz da Lava Jato. “A gente faz um remanejamento. Não temos como contratar especificamente. Dependemos de concurso público. E as outras varas têm prestado esse auxílio admirável", explicou.

Com o congelamento dos gastos federais, Malucelli coloca o foco na gestão para se adequar à nova realidade. “A contingência tem um lado positivo que nos obriga a fazer o mesmo ou mais com menos. Existem gastos. E, se temos eficiência, esses gastos vêm a reboque”.

Até o momento, o diretor diz manter os pagamentos do foro em dia, mas tem problemas para conseguir verba para investimentos. “Na medida do possível, estamos tentando manter, até diminuir os gastos. Estamos conseguindo”.

E quando a Lava Jato vai acabar? “Tem que perguntar para o MPF [Ministério Público Federal], a PF [Polícia Federal]. Nem o doutor Moro creio que saiba responder isso. Eu menos ainda”.

Ponto turístico

Malucelli já comandou o foro federal no Paraná entre 2007 e 2009. Em seu retorno pós-Lava Jato, ele se surpreendeu ao ver que o prédio da Justiça havia se transformado em ponto turístico.

Até me chama a atenção que as pessoas vêm, tiram foto na frente do prédio da Justiça. Nunca achei que fosse algo interessante para ser ponto turístico. Acho bacana. Para mim, como juiz, acho isso inédito. Sou juiz há 25 anos e nunca fiz nada parecido na minha vida

Marcelo Malucelli, diretor da Justiça Federal no Paraná

A fama da Justiça Federal no Paraná se deve ao juiz Sergio Moro, que, desde 2014, está à frente dos processos da Lava Jato. Malucelli elogia a atuação do magistrado, de quem é amigo há cerca de 20 anos. “Eu o considero um colega admirável. Eu admiro muito o trabalho dele, não só pela Lava Jato”. O magistrado, porém, preferiu não comentar sobre acertos e erros de Moro na Lava Jato.

O diretor, porém, vê com normalidade as críticas que ele vem sofrendo das defesas dos réus da Lava Jato, principalmente da do ex-presidente Lula. “Como juízes, nós estamos acostumados. Qualquer decisão, você tem 50% das partes fazendo elogio, 50% falando mal”.

13.set.2017 - Manifestantes inflam boneco gigante representando o juiz Sergio Moro em roupa de super-herói em ato em apoio à Operação Lava Jato em frente ao museu Oscar Niemeyer, em Curitiba, no dia do segundo depoimento do ex-presidente Luiz Inácio Lula da Silva Lula - Thoe Marques/Framephoto/Estadão Conteúdo - Thoe Marques/Framephoto/Estadão Conteúdo
Em Curitiba, manifestantes inflam boneco gigante representando o juiz Sergio Moro como super-herói
Imagem: Thoe Marques/Framephoto/Estadão Conteúdo

Malucelli lembra que, no início da carreira, ele deu uma sentença e um advogado o criticou. Um colega mais velho, então, lhe disse: “meu filho, quando acontecer isso, tem um remédio: leia a resposta a esse recurso. Vão lhe dizer que a sua decisão foi maravilhosa, sensacional. Leia a resposta da outra parte”, recorda. “A função do juiz é bem simples: tem uma parte que disse que é aquilo, tem outro que diz que não é aquilo e eles chamam uma terceira pessoa para dizer o que é aquilo”.

A segurança dos quase 2,4 mil servidores e funcionários que trabalham sob seu comando também está no foco. Em sua primeira gestão, em 2007, ele criou um grupo que “acompanha os magistrados em situação que demande risco”. “O doutor Moro é um deles”, diz sem entrar em detalhes a respeito por questões estratégicas. “Obviamente, mudaram as demandas [atuais em relação a 2007]. Estão muito maiores hoje”.

No início do grupo de segurança, lembra Malucelli, houve críticas de que não se podia criar uma “polícia dentro da Justiça”. “Depois, se viu que não se trata disso, que é um grupo de segurança que presta o trabalho mais imediato. É claro que em situações mais críticas não vamos fazer o trabalho que cabe à Polícia Federal”.

Confira momentos de tensão no segundo interrogatório de Lula

UOL Notícias

Segurança para depoimento de Lula

Um esquema de segurança diferenciado para os interrogatórios do ex-presidente Luiz Inácio Lula da Silva (PT) é defendido por Malucelli. O magistrado diz que prefere “que se gaste com isso do que, depois, gastar seja com danos, seja com algo impagável, que pode ser um dano pessoal, alguma agressão a um ser humano”.

Na última quarta-feira (13), o petista foi ouvido no processo em que é réu por corrupção passiva e lavagem de dinheiro, crimes ligados a oito contratos entre a empreiteira Odebrecht e a Petrobras.

A decisão sobre isolar o prédio não coube à Justiça Federal, mas sim às autoridades locais. Segundo o governo do Paraná, responsável pelo esquema de segurança, foram utilizados 1,2 mil policiais para isolar a região do prédio da Justiça Federal para a audiência. O efetivo destacado foi menos da metade do utilizado em 10 de maio, no primeiro interrogatório de Lula, em uma ação que custou R$ 150 mil aos cofres públicos. O governo paranaense ainda não divulgou o valor gasto com o esquema em setembro.

Segundo Malucelli, o isolamento do prédio nos interrogatórios de Lula se deve aos ânimos exaltados que envolvem os depoimentos. Ele cita como exemplo um fato ocorrido na semana anterior ao interrogatório do último dia 13, em que “um integrante de um importante movimento social se dirigiu ao juiz Moro de forma até pouco republicana”. Malucelli se referia a José Pedro Stédile, do MST (Movimento dos Sem Terra), que chamou o juiz de “merdinha”.

“Me parece que [o esquema de segurança] se justifica plenamente”, opina o diretor. Integrantes do movimento eram maioria na espera pela chegada de Lula à Justiça Federal. Desde as 10h30, eles formaram um corredor para recepcionar o ex-presidente, que apareceu por volta de 13h40 ao local.

Veja a chegada de Lula à área da Justiça isolada pela polícia

UOL Notícias

Malucelli ressalta que Lula “é um réu como qualquer outro, mas é um ex-chefe de estado, um líder popular reconhecido”. “Tem todo esse universo próprio no entorno. E segurança é agir preventivamente”, disse ao UOL um dia após o interrogatório.

O diretor avalia que o esquema de funcionamento da Justiça Federal pode ser readequado para o terceiro interrogatório, na ação que envolve o sítio de Atibaia (SP). “Da primeira vez [em maio], o foro sequer abriu”, lembra. Na época, o magistrado ainda não comandava a Justiça Federal no Paraná. Ele só assumiu a direção em julho deste ano. Malucelli já era favorável a que o foro tivesse funcionamento normal naquela época, o que aconteceu apenas na última quarta. O diretor só tomou essa decisão na segunda-feira (11), após a Secretaria de Segurança do Paraná explicar como seria o esquema de isolamento.

Uma outra medida, o arame farpado instalado nas grades do prédio, colocado para o primeiro interrogatório, será reavaliada em função do clima mais apaziguado. “Na quarta, foi bem mais tranquilo. Tanto que a Justiça funcionou normalmente. O expediente aqui, interno, foi normal”.