Topo

Temer usa declaração de Cunha para se defender de delação de Funaro em carta a parlamentares

Ueslei Marcelino/Reuters
Imagem: Ueslei Marcelino/Reuters

Luciana Amaral

Do UOL, em Brasília

16/10/2017 13h10Atualizada em 16/10/2017 18h40

O presidente da República, Michel Temer (PMDB), usou uma declaração do ex-presidente da Câmara e deputado cassado Eduardo Cunha (PMDB), preso pela Operação Lava Jato, para se defender da delação premiada do operador financeiro Lúcio Funaro ao Ministério Público Federal. No texto, Temer ressalta que Funaro não o conhecia e diz ser alvo de uma conspiração.

Em carta escrita pelo próprio Temer a deputados e senadores e a ser distribuída em mãos, o presidente afirma que, em entrevista à revista Época, Cunha “disse que a sua delação não foi aceita porque o procurador-geral [Rodrigo Janot, que já deixou o cargo] exigia que ele incriminasse o presidente da República” e teve de mentir para cumprir com o que chama de determinações da PGR (Procuradoria-Geral da República). Para Temer, a negativa levou Janot a “buscar alguém disposto a incriminar o presidente”.

Segundo um auxiliar de Temer, a carta tem como objetivos ser um “desabafo” e servir de “atenção ao Parlamento”. No texto, o presidente relata ser a “indignação” o motivo do documento embora sejam “muitos os que me aconselham a nada dizer a respeito dos episódios que atingiram diretamente a minha honra”.

Na mesma linha que seu advogado Eduardo Carnelós em declaração na entrega da defesa na CCJ (Comissão de Constituição e Justiça) da Câmara, o presidente considera haver uma conspiração para tirá-lo da Presidência.

Jamais poderia acreditar que houvesse uma conspiração para me derrubar da Presidência da República. Mas os fatos me convenceram. E são incontestáveis.

Michel Temer (PMDB), presidente da República

O envio da carta ocorre na mesma semana em que a CCJ deve votar o parecer elaborado pelo deputado Bonifácio de Andrada (PSDB-MG) pela rejeição da denúncia oferecida por Janot contra Temer e os ministros Eliseu Padilha (Casa Civil) e Moreira Franco (Secretaria-Geral da Presidência). Até a votação da denúncia em plenário, o Planalto busca reforçar o maior número de votos possíveis a favor dos três acusados.

Temer foi acusado de obstrução de Justiça e formação de organização criminosa. A delação de Funaro foi usada por Janot para embasar a denúncia, e a divulgação de vídeos dos depoimentos do operador provocou uma crise entre Temer e o presidente da Câmara, Rodrigo Maia (DEM-RJ).

Na carta, Temer também relembra que Cunha negou que o executivo da JBS Joesley Batista tenha comprado o seu silêncio, como este teria dito em uma das gravações entregues à PGR.

Em delação, Funaro diz ter certeza que Temer recebeu propina

redetv

Delatores da JBS são "marginais"

Temer começa a carta criticando o áudio da conversa entre Batista e o ex-diretor de relações institucionais do Grupo J&F, que controla a JBS, Ricardo Saud. Ele chama o diálogo de “sujo, imoral, indecente, capaz de fazer envergonhar aqueles que o ouvem” por causa da revelação de como teriam agido para escapar da prisão, além do “vocabulário chulo”, ao seu ver.

Ainda para Temer, a conversa mostra como o ex-procurador-geral da República Marcello Miller, um dos principais assessores de Janot na PGR que pediu exoneração do órgão para atuar no escritório de advocacia da defesa da JBS, estava envolvido nos atos.

Em seguida, o presidente cita entrevista do procurador Ângelo Goulart Vilela ao jornal “Folha de S. Paulo”, em que diz que Janot tinha “pressa e precisava derrubar o presidente”, critica a prisão dele por 76 dias sem que fosse ouvido e chama a ação de “trama”.

Vilela também trabalha na PGR e integrava a força-tarefa da operação Greenfield, que investiga supostas irregularidades em fundos de pensão. Ele foi denunciado por corrupção passiva, violação de sigilo funcional e obstrução de Justiça sob a suspeita de vazar informações confidenciais da PGR aos delatores da JBS em troca de R$ 50 mil em propina por mês. O caso foi relatado por Joesley em sua delação premiada.

O intermediário entre Batista e Vilela seria o advogado Willer Tomaz. Um encontro de Thomaz com o advogado e também delator da JBS, Francisco Assis e Silva, chegou a ser gravado pela Polícia Federal. Para Temer, as falas de Tomaz desfavoráveis à conduta de Janot demonstram a ânsia do ex-procurador-geral da República em derrubá-lo.

“Tudo combinado, tudo ajustado, tudo acertado, com o objetivo de: livrar-se de qualquer penalidade e derrubar o presidente da República. E agora, trazem de volta um delinquente conhecido de várias delações premiadas não cumpridas para mentir, investindo contra o presidente, contra o Congresso Nacional, contra os parlamentares e partidos políticos”, escreve Temer, ao se referir também a Funaro.

Na avaliação de Temer, todos os episódios estão sendo esclarecidos e corroboram sua fala no segundo pronunciamento sobre o caso, em junho deste ano.

Compra de votos no impeachment, Cunha e Temer; o que disse Funaro

UOL Notícias

“Pena que nesse largo período o noticiário deu publicidade ao que diziam esses marginais. Deixaram marcas que a partir de agora procurarei eliminar, como estou buscando fazer nesta carta. É um desabafo. É uma explicação para aqueles que me conhecem e sabem de mim”, ao acrescentar dados econômicos que mostram uma melhora na indústria e geração de empregos, entre outros pontos.

O peemedebista então defende o trabalho do governo na área social, como a readequação do valor do Bolsa Família e o lançamento do programa Progredir, e diz que o Brasil não parou.

“O Brasil cresceu e vem crescendo. Basta verificar os investimentos estrangeiros e o interesse acentuado pelas concessões e privatizações que estamos corajosamente a realizar. E a agenda de modernização reformista do País avança com o teto de gastos públicos, lei das estatais, modernização trabalhista, reforma do ensino médio, proposta de revisão da Previdência, simplificação tributária”, afirma.

Após a tramitação da segunda denúncia na Câmara, o Planalto pretende ressuscitar a reforma da Previdência, parada desde maio por falta de apoio majoritário, e tocar a simplificação trabalhista.

“Em toda a minha trajetória política a minha pregação foi a de juntar os brasileiros, de promover a pacificação, de conversar, de dialogar. Não acredito na tese do ‘nós contra eles’. Acredito na união dos brasileiros. O que devemos fazer agora é continuar a construir, juntos, o Brasil. Com serenidade, moderação, equilíbrio e solidariedade. Na certeza de que a verdade dos fatos será reposta, agradeço a sua atenção”, conclui a carta.