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Lava Jato aponta telefonemas entre amigo de Lula e dono de apartamento no final de 2015

7.out.2017 - O ex-presidente Lula participa do encontro "Mulheres do PT", em Brasília - Mateus Bonomi/Folhapress
7.out.2017 - O ex-presidente Lula participa do encontro "Mulheres do PT", em Brasília Imagem: Mateus Bonomi/Folhapress

Do UOL, em São Paulo

19/10/2017 20h52

Os procuradores que integram a força-tarefa da Lava Jato em Curitiba apresentaram nesta quinta-feira (19) ao juiz Sergio Moro uma relação de 12 ligações telefônicas entre o empresário Glaucos da Costamarques, o advogado Roberto Teixeira, amigo do ex-presidente Luiz Inácio Lula da Silva, e o escritório de advocacia Teixeira, Martins.

No entendimento dos procuradores, as ligações entre os réus corroboram a narrativa do empresário sobre a assinatura dos recibos de aluguéis do apartamento vizinho ao de Lula, em São Bernardo do Campo, durante o período em que Costamarques esteve internado no hospital Sírio-Libanês, entre 23 de novembro e 29 de dezembro de 2015.

Em depoimento a Moro, Roberto Teixeira negou que esteve no hospital no período de internação de Glaucos para solicitar que ele assinasse os recibos de aluguel e disse que os dois se encontraram no Sírio Libanês em 2016, de maneira casual.

Já o empresário afirma que Teixeira o visitou naquela ocasião, em 2015, e que assinou os recibos por solicitação do advogado. O contador João Muniz Leite foi quem levou os documentos para serem assinados por Glaucos da Costamarques.

Segundo a denúncia do MPF (Ministério Público Federal), o dono real do apartamento seria o ex-presidente Luiz Inácio Lula da Silva. O imóvel teria sido adquirido com dinheiro de propina da Odebrecht, em troca de contratos com a Petrobras. Glaucos da Costamarques, que é primo do pecuarista José Carlos Bumlai, amigo de Lula, teria servido de laranja para a aquisição do apartamento.

O MPF questiona a autenticidade dos recibos entregues pela defesa de Lula por meio de um incidente de falsidade. A defesa do ex-presidente afirmou ter os recibos originais e que vai apresentá-los e nega que o imóvel pertença ao ex-presidente.

Ligações

De acordo com os procuradores, entre 25 de novembro e 17 de dezembro, foram registradas dez ligações de Roberto Teixeira e do escritório de advocacia Teixeira, Martins para Costamarques, enquanto o empresário fez outras duas ligações para o advogado. “Essa frequência de contatos se apresenta atípica para aquele ano, já que, em 2015, só foram identificados sete contatos telefônicos em fevereiro [em um único dia] e mais um em outubro”, diz o MPF.

Segundo a força-tarefa, no dia seguinte à prisão de Bumlai no âmbito da Lava Jato, em 24 de novembro de 2015, foram registradas duas ligações do escritório do advogado, cada uma com duração de pouco menos de um minuto. Costamarques recebeu nova ligação de Roberto Teixeira um dia após a visita do contador a ele no hospital, em 5 de dezembro de 2015, com duração de cinco minutos.

“Em 6 de dezembro de 2015, verifica-se que houve mais quatro contatos telefônicos feitos por Roberto Teixeira com Glaucos da Costamarques. Em 14 de dezembro, foram mais duas ligações, a primeira feita pelo advogado, com duração de pouco mais de um minuto, e a segunda feita por Costamarques a Roberto Teixeira, com duração de pouco menos de um minuto”, apontou o MPF.

6.set.2017 - Glaucos da Costamarques, réu na Lava Jato em processo com o ex-presidente Lula, em depoimento ao juiz Sergio Moro - Reprodução - 6.set.2017 - Reprodução - 6.set.2017
Glaucos da Costamarques durante interrogatório pelo juiz Moro
Imagem: Reprodução - 6.set.2017

Os procuradores afirmam que em 17 de dezembro de 2015 foram feitos mais três contatos, sendo os dois primeiros por Roberto Teixeira a Glaucos da Costamarques, cada um com cerca de 40 segundos de duração, e o terceiro feito pelo empresário ao advogado, com duração de 30 segundos.

“Posteriormente, Glaucos da Costamarques e Roberto Teixeira vieram a se falar por telefone em 3 de março de 2016, em ligação que durou mais de dois minutos, data esta que antecedeu as diligências de busca e apreensão na residência de Luiz Inácio Lula da Silva, feita em 4 de março de 2016. Pouco depois, mantiveram mais dois contatos telefônicos, em 8 de março de 2016, cada uma com duração de 90 segundos”, dizem os procuradores.

Outro lado

Em nota, o advogado Cristiano Zanin Martins afirmou que “os procuradores da Lava Jato criam nova versão fantasiosa depois de a narrativa do empresário Glaucos da Costamarques ter sido desmentida pelos ofícios do hospital Sírio-Libanês, que apontam que ele não foi visitado na unidade pelo advogado Roberto Teixeira enquanto esteve internado.”

Segundo a nota, a defesa já comprovou que o proprietário do apartamento recebeu os valores da locação e que a aquisição do imóvel foi feita de forma legal, o que “desmonta a acusação do MPF”.

O advogado afirmou que a força-tarefa da Lava Jato “age de modo desleal ao anexar no processo um relatório unilateral, com base em dados telefônicos que dispunha desde janeiro de 2017, e que a defesa não tem acesso”. “Mais uma vez, faz-se uso de elementos ‘secretos’ na ação, estranhos à acusação contida na denúncia, violentando a garantia constitucional da ampla defesa”, diz a nota.

Entenda a acusação a Lula

Segundo o MPF, o apartamento usado pela família de Lula em São Bernardo do Campo seria parte de propina da Odebrecht em troca da atuação do ex-presidente para beneficiar a empresa em oito contratos com a Petrobras. Um terreno em São Paulo para o Instituto Lula --que nunca foi usado pela entidade-- também faria parte da vantagem indevida.

A defesa do ex-presidente nega que tenha recebido a posse ou propriedade dos imóveis, muito menos em contrapartida a uma atuação em contratos com a Petrobras. Segundo os advogados de Lula, “nenhuma prova foi apresentada sobre essa alegação, que se mostrou, em verdade, ser manifestamente improcedente”.

“Essa situação, além de levar ao reconhecimento da inocência de Lula, mostra que o processo jamais poderia estar sendo conduzido pelo juiz Sergio Moro, pois não há qualquer relação efetiva e real com a Petrobras, como sempre foi afirmado pela defesa”, diz a defesa.

Pecuarista José Carlos Bumlai chega para prestar depoimento ao juiz federal Sérgio Moro por videoconferência, em São Paulo  - Renato S. Cerqueira - 9.mai.2017/Futura Press/Estadão Conteúdo - Renato S. Cerqueira - 9.mai.2017/Futura Press/Estadão Conteúdo
O pecuarista José Carlos Bumlai
Imagem: Renato S. Cerqueira - 9.mai.2017/Futura Press/Estadão Conteúdo

Costamarques afirmou ter comprado o apartamento a pedido de seu primo e amigo de Lula, o pecuarista José Carlos Bumlai --que foi condenado em outro processo da Lava Jato. Este, no relato de Costamarques, atendia a pedido de Marisa Letícia, que estava preocupada com a possível compra do imóvel por alguém desconhecido da família.

A defesa do engenheiro disse em petição entregue a Moro no dia 28 de setembro que Costamarques comprou e alugou o apartamento para a ex-primeira-dama "única e exclusivamente em razão do pedido feito pelo seu primo".

Os advogados de Lula apresentaram um contrato de aluguel com início em fevereiro de 2011 assinado pela ex-primeira-dama Marisa Letícia, falecida em fevereiro deste ano, e por Costamarques. Também entregaram à Justiça recibos assinados por Costamarques que comprovariam a quitação dos aluguéis.

No entanto, segundo o MPF, não há transações bancárias que comprovem o pagamento dos aluguéis até o fim de 2015. Costamarques disse à Justiça que, neste período, não recebeu nada --apesar de ter declarado isso no imposto de renda.

Segundo a defesa de Costamarques, "o fato de os recibos terem sido declarados à Receita Federal no Imposto de Renda deu-se em razão da própria existência do contrato de locação, da promessa de pagamento de todas as parcelas pelo seu primo e da orientação de que deveria, sim, declarar tais valores e sobre eles pagar o respectivo imposto."

Ainda de acordo com os advogados de Costamarques, "os recibos referentes à locação em causa foram exigidos do defendente, em razão da existência do contrato de locação, e corresponderam à confiança, amizade e grande estima que devotava ao primo, José Carlos Costa Marques Bumlai."