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Potenciais "laranjas" receberam R$ 62 milhões nas eleições de 2018

Gustavo Bebianno foi exonerado após denúncias de casos de "candidaturas laranjas" no PSL, partido do qual era presidente - Pedro Ladeira/Folhapress
Gustavo Bebianno foi exonerado após denúncias de casos de "candidaturas laranjas" no PSL, partido do qual era presidente Imagem: Pedro Ladeira/Folhapress

Leandro Prazeres

Do UOL, em Brasília

09/03/2019 04h00Atualizada em 09/03/2019 15h11

Resumo da notícia

  • Candidaturas de potenciais "laranjas" movimentaram R$ 62 milhões em 2018
  • Essas candidaturas são aquelas que receberam mais de R$ 100 mil em repasses e tiveram menos de mil votos
  • Predominância de mulheres entre os casos analisados indica estratégia dos partidos para burlar cota de mulheres
  • PRB e PROS lideram ranking de casos suspeitos
  • PRB disse que, "culturalmente", homens participam mais da política do que as mulheres;
  • PROS afirmou repassou recursos apenas às candidaturas registradas e aptas a receber o dinheiro

Um cruzamento de dados feito pelo UOL com base em informações divulgadas pelo TSE (Tribunal Superior Eleitoral) identificou 284 pessoas com indícios de que tenham sido "candidatos laranjas" nas eleições de 2018. São candidaturas em todo o Brasil e de um total de 24 partidos. Entre recursos públicos e privados, essas candidaturas movimentaram R$ 62 milhões. PRB e o PROS lideram esse ranking.

Procurado, o PROS informou que as pessoas que receberam recursos do partido estavam com as candidaturas devidamente registradas e aptas a receber o dinheiro. A sigla diz ainda que as doações eleitorais realizadas obedeceram aos critérios estabelecidos pelo TSE.

O PRB disse que a responsabilidade por aplicação de recursos eleitorais é dos candidatos e criticou a cota de 30% para candidaturas de mulheres, dizendo que, os homens, "culturalmente", participam mais de atividades políticas que as mulheres.

Uma "candidatura laranja" é aquela que tem pouca chance real de vencer a disputa, mas que é lançada mesmo assim para cumprir a cota mínima de 30% de mulheres nas eleições ou para redirecionar recursos de forma artificial. 

Quando a intenção é a transferência de verba, o que normalmente ocorre é que um nome inexpressivo recebe um grande volume de dinheiro que depois é repassado, em forma de doação ou em material de campanha, para candidaturas consideradas mais viáveis.

Para identificar esses casos, o UOL utilizou o mesmo critério adotado pelo jornal Folha de S. Paulo. Foram selecionados aqueles que receberam mais de R$ 100 mil em repasses, mas que, ao fim das eleições, obtiveram menos de mil votos. 

Bebianno - Reprodução/TV Globo - Reprodução/TV Globo
Maria de Lourdes Paixão, candidata com indícios de ter sido "laranja"
Imagem: Reprodução/TV Globo

O PROS teve o maior número de candidaturas com indícios de terem sido "laranjas". Ao todo, foram 44 nomes identificados. O PRB, por sua vez, teve 31. O PSL, partido do presidente Jair Bolsonaro, teve apenas um nome: Maria de Lourdes Paixão (PSL-PE). 

A candidatura dela, que recebeu R$ 400 mil em verbas públicas, está sendo investigada pela Polícia Federal. Aproximadamente 95% da verba, segundo a prestação de contas da candidata, foi gasta em uma gráfica cujo endereço registrado junto à Receita Federal pertence a um café e uma papelaria no Recife.

O caso marcou o início da crise que resultou na queda do ex-ministro da Secretaria-Geral da Presidência Gustavo Bebianno, que presidiu o PSL durante as eleições de 2018. Ele nega responsabilidade pelos repasses.

Predominância de mulheres

A lista de potenciais "candidaturas laranjas" é composta, majoritariamente, por mulheres, outro indício de que os partidos podem ter usado esses nomes apenas para cumprir a lei eleitoral, que determina um mínimo de 30% de candidaturas legislativas femininas por partido.

Dos 284 nomes identificados, 84% (241) são mulheres e 16% (43) são homens. 

Geograficamente, essas candidaturas estão distribuídas por todas as 27 unidades da federação. O Distrito Federal é o que tem o maior número de candidatos com essas características: 46. O Rio de Janeiro está em segundo lugar, com 29. 

O que diz o PRB

O UOL enviou questionamentos ao PRB e ao PROS, que lideram o ranking das candidaturas potencialmente "laranjas".

Em nota, o PRB, presidido pelo deputado federal e vice-presidente da Câmara dos Deputados, Marcos Pereira (SP), começa dizendo que as baixas votações de alguns candidatos não indicam, necessariamente, que elas fossem "candidaturas laranjas". "Candidaturas com resultados inexpressivos podem simplesmente ser candidaturas fracas, não laranjas", disse.

Seria humanamente impossível administrar cada candidatura

Nota do PRB sobre as possíveis candidaturas laranjas do partido

 "A Executiva Nacional repassou os recursos às executivas estaduais e estas ficaram responsáveis por repassar os recursos aos candidatos, de acordo com a estratégia de cada estado. Seria humanamente impossível administrar cada candidatura em cada um dos 26 estados e o Distrito Federal", disse a nota. 

O partido criticou ainda a obrigatoriedade de que 30% das candidaturas sejam preenchidas por mulheres. A legenda diz que "culturalmente", os homens "participam mais da vida pública e das disputas eleitorais". "Fatos são fatos e são inegáveis", diz um trecho da nota. 

A nota termina classificando as investigações relacionadas às "candidaturas laranjas" como uma caçada. "Essa caçada indiscriminada não ajudará em nada na atração de mais mulheres para a política. Pelo contrário: desestimulará aquelas que iniciaram (ou que querem iniciar) na política a seguir com o seu projeto", disse. 

O que diz o PROS

Também em nota, o PROS declarou que "os partidos políticos só tomam conhecimento da real votação de seus candidatos após as eleições, sendo necessária a realização das doações de recursos com base em prospecções, informações remetidas pelos órgãos de direção partidária nos estados e afins".

A sigla diz ainda que não há como estabelecer parâmetros seguros de avaliação prévia para destinar recursos às campanhas, especialmente para candidaturas estreantes.

O texto termina dizendo que "o PROS apresentou mais de mil candidaturas no país, com isso, o partido fez as orientações quanto a lisura no processo eleitoral, mas não é possível ser responsabilizado pela gestão financeira da campanha de cada candidatura."

"Além disso, mecanismos da própria Justiça eleitoral são disponibilizados para analisar individualmente os gastos eleitorais de cada uma dessas candidaturas. Um procedimento feito direto pelo candidato, em sua prestação de contas, não tendo de passar pela validação do partido", finaliza o texto.

O que diz o TSE

O TSE, por meio de nota, que em caso de indícios de irregularidade no financiamento das campanhas, "a Justiça Eleitoral os encaminha para a Polícia Federal ou para o Ministério Público [...] para apurar os fatos e propor uma eventual ação de investigação por meio das ações judiciais eleitorais pertinentes".