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PF aponta como o 'gabinete do ódio' se expandiu além do Palácio do Planalto

Jair Bolsonaro e os filhos Flávio, Carlos e Eduardo - Reprodução/Flickr
Jair Bolsonaro e os filhos Flávio, Carlos e Eduardo Imagem: Reprodução/Flickr

Igor Mello

Do UOL, no Rio

13/06/2021 04h00

O inquérito da Polícia Federal sobre atos antidemocráticos —cujo sigilo foi parcialmente removido neste mês— jogou nova luz sobre a estrutura de páginas e perfis nas redes sociais ligados ao chamado "gabinete do ódio".

Para além do grupo de assessores empregados na Presidência da República, novos elementos confirmam que o grupo tinha grande capilaridade, envolvendo os três filhos do presidente Jair Bolsonaro (sem partido) e políticos aliados.

Os novos elementos reforçam a tese de que o "gabinete do ódio" é coordenado diretamente pela família Bolsonaro e operacionalizado por três assessores presidenciais recrutados pelo vereador do Rio Carlos Bolsonaro (Republicanos) —Tércio Arnaud Tomaz, apontado como chefe do grupo; José Matheus Salles Gomes e Mateus Diniz.

À PF, eles admitiram pela primeira vez atuar na comunicação do governo federal.

"Gabinete do ódio" é o nome dado a esse grupo de assessores que trabalham no Palácio do Planalto com foco nas redes sociais, inclusive na gestão de páginas de apoio à família Bolsonaro que difundem desinformação e atacam adversários políticos do presidente.

As investigações indicam contudo que essa estrutura vai além do governo federal, envolvendo também assessores dos filhos do presidente e de outros políticos aliados.

Uma das hipóteses de crimes contra a segurança nacional investigados pela PF diz respeito a essa rede de contas.

A PF afirma que, entre 2019 e junho de 2020, agentes públicos ligados à Secom (Secretaria Especial de Comunicação) e a políticos aliados ao clã Bolsonaro usavam canais no Twitter, YouTube, Facebook que incitaram "parcela da população à subversão da ordem política ou social e à animosidade das Forças Armadas contra o Supremo Tribunal Federal e o Congresso Nacional".

Organograma do gabinete do odio - Arte/UOL - Arte/UOL
Imagem: Arte/UOL

Filhos do presidente

Informações levantadas pela CPMI das Fake News e pelo DFRLab —organização forense digital que tem parceria com o Facebook— já sugeriam a participação do deputado federal Eduardo Bolsonaro (PSL-SP) no comando do "gabinete do ódio". Dois de seus então assessores parlamentares foram identificados como donos de contas ligadas à estrutura de desinformação e ataques a adversários políticos —informação referendada pela PF.

A novidade trazida pelo inquérito submetido ao STF (Supremo Tribunal Federal) envolve o senador Flávio Bolsonaro (Patriota-RJ).

Investigado pelo MP-RJ (Ministério Público do Rio de Janeiro) no caso das rachadinhas, o assessor parlamentar Fernando Nascimento Pessoa, hoje nomeado no gabinete do filho 01 do presidente no Senado, foi identificado como o dono de seis contas ligadas à rede de desinformação bolsonarista, todas derrubadas pelo Facebook por comportamento inautêntico.

Os funcionários de Eduardo e Flávio Bolsonaro assim como o trio de assessores da Presidência da República compõem o que a PF chama de núcleo de Brasília.

Segundo os investigadores, há indícios de que a exclusão dessas contas pelo Facebook tem como motivo justamente o seu uso coordenado pelo governo do presidente Jair Bolsonaro.

"Ao que tudo indica, as contas objeto desta análise, removidas pelo Facebook de suas redes sociais, se enquadram na tipologia 'Operações executadas por um governo para atingir seus próprios cidadãos. Isso pode ser particularmente preocupante quando combinam técnicas enganosas com o poder de um Estado'", diz o relatório da PF.

Ramificações nos estados

Essa análise trouxe indícios de que há movimentos coordenados entre o núcleo de assessores lotados em Brasília e de outros estados.

Isso foi notado, por exemplo, no caso do Rio de Janeiro, onde um casal de criadores de conteúdo —Vanessa Navarro e Leonardo Rodrigues— mantinha páginas bolsonaristas enquanto estavam nomeados nos gabinetes dos deputados estaduais Anderson Moraes e Alana Passos, ambos do PSL. As páginas foram removidas pelo Facebook em julho do ano passado.

Vanessa continua como funcionária comissionada no gabinete de Anderson, enquanto Leonardo foi exonerado em abril de 2020.

Há também um outro núcleo ligado a políticos bolsonaristas em São Paulo, mas até aqui a PF não obteve tantos elementos quanto no caso dos políticos fluminenses.

Na CPMI das Fake News, a deputada federal Joice Hasselmann (PSL-SP) listou ainda seis deputados federais, dois deputados estaduais, dois deputados estaduais de São Paulo e uma de Santa Catarina como supostos integrantes do que chamou de milícia virtual.

Alguns deles foram ouvidos pela PF no inquérito, mas não constam até o momento elementos sobre sua efetiva participação.

Outro lado

O UOL questionou a Presidência da República, o deputado federal Eduardo Bolsonaro, o senador Flávio Bolsonaro e o vereador Carlos Bolsonaro, mas nenhum deles respondeu os questionamentos enviados pela reportagem até o momento.

Em depoimento à PF, Eduardo afirmou que "nunca orientou, determinou ou estimulou a atuação deles [seus assessores] em redes sociais e que qualquer tipo de atuação não possui vínculo com o gabinete".

Já Carlos Bolsonaro negou aos interrogadores participar da "produção, publicação ou difusão de material falsos ou que veicule informações contra os chefes de poderes ou contra as instituições do Estado Democrático de Direito". Também disse não ter nenhuma participação na elaboração da estratégia de comunicação do governo federal.

A deputada estadual Alana Passos afirmou ao UOL que Leonardo Rodrigues cuidava de suas redes sociais e que "ele tinha bastante trabalho, como todos podem ver pelo volume de publicações". Mas disse não ter como afirmar se ele usava a estrutura do gabinete para administrar as contas citadas pela PF, definidas por ela como "páginas pessoais".

Alana nega uma suposta participação no grupo coordenado pelo "gabinete do ódio". "Tenho muito respeito pela democracia, e nunca iria atacar ou pedir para atacar qualquer instituição."

O deputado estadual Anderson Moraes foi procurado, mas não respondeu às perguntas enviadas até o momento.

Os assessores da Presidência da República Tercio, José Matheus e Mateus Diniz, apontados como integrantes do "gabinete do ódio", negaram em depoimento envolvimento no suposto esquema.