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Câmara aprova projeto que aumenta pena a militares condenados por tráfico

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Luciana Amaral

Do UOL, em Brasília

17/02/2022 13h12Atualizada em 17/02/2022 14h21

O plenário da Câmara dos Deputados aprovou hoje projeto de lei que promove uma reforma no Código Penal Militar e aumenta para 15 anos a pena máxima a militares condenados por tráfico de drogas.

Atualmente, o Código Penal Militar prevê que a pena para o tráfico de drogas é de até cinco anos de reclusão. Se o militar for farmacêutico, médico, dentista ou veterinário, a pena pode chegar a oito anos de reclusão pela legislação em vigor hoje.

O projeto ainda deixa mais claro que os militares que se apresentarem para o serviço sob o efeito de entorpecentes poderão ser punidos com até cinco anos de reclusão. A medida busca diferenciar o militar que usa entorpecentes dos que traficam as substâncias ilícitas.

Na terça (15), a Justiça Militar condenou o segundo sargento da Aeronáutica Manoel Rodrigues na acusação de transportar cocaína em um avião da comitiva do presidente Jair Bolsonaro (PL). Sua punição foi de 14 anos e meio de reclusão, mais o pagamento de multa. Cabe recurso.

O militar foi preso em 2019 durante escala em Sevilha, na Espanha, onde foi condenado a seis anos de prisão. Ele ficou detido, enquanto a comitiva seguiu viagem para o Japão, onde aconteceu à época reunião do G20. O sargento está preso até hoje em Sevilha.

Embora a lei militar atual preveja reclusão de até cinco anos por narcotráfico, Manoel Rodrigues foi julgado pela Lei de Drogas, em vigor desde 2006, que julga todos os brasileiros. Esta prevê punição de 5 a 15 anos de cadeia e multa para o mesmo delito.

O projeto da reforma do Código Penal Militar, originalmente de 1969, quando na ditadura, altera série de trechos para adequá-lo à Constituição Federal de 1988 e a jurisprudências do STM (Superior Tribunal Militar) e do STF (Supremo Tribunal Federal). O texto inicial da reforma foi apresentado pela Comissão de Relações Exteriores e de Defesa Nacional da Câmara dos Deputados em dezembro de 2017.

Algumas adequações são acabar com a possibilidade de a Justiça Militar julgar menores de 18 anos, embora isso não acontecesse mais na prática, e tornar homicídio qualificado, estupro e latrocínio, por exemplo, em crimes hediondos quando praticados por militares.

Há ainda atualizações de termos, como a pessoa considerada militar e o conceito de superior para fins da aplicação da lei penal militar.

Uso de 'meios violentos'

Um dos pontos mais polêmicos mantidos no projeto é o que afirma não ser crime "compelir os subalternos" a utilização de "meios violentos" de militares diante de perigo iminente ou grave calamidade.

Pelo texto, não será crime quando "o militar na função de comando, na iminência de perigo ou grave calamidade, compele os subalternos, por meios violentos, a executar serviços e manobras urgentes, para salvar a unidade ou vidas, ou evitar o desânimo, o terror, a desordem, a rendição, a revolta ou o saque".

Apesar de o PCdoB ter proposto a supressão do artigo e a ação ter contado com o apoio do PT e do PDT, o trecho foi mantido após a maioria dos deputados se posicionar a favor da manutenção.

O relator do projeto, general Peternelli (PSL-SP), tentou tirar a expressão "por meios violentos" com uma emenda de redação, mas a Mesa avaliou que a mudança atingiria o mérito do texto e não foi aceita. Ele então se comprometeu a tentar um acordo para retirar a expressão no Senado, quando o projeto for analisado naquela Casa, próxima etapa de tramitação do projeto.

'Excludente de ilicitude' retirado de texto

O PT era contra um artigo do parecer do deputado general Peternelli que, na avaliação do partido, permitiria o excludente de ilicitude — hipótese de não haver punição — em parte do texto sobre reação em legítima defesa. Isso constava em versão aprovada do projeto pela CCJ (Comissão de Constituição e Justiça), onde foi analisado em 2019.

Um trecho dizia que seria considerada legítima defesa o militar que, "em enfrentamento armado ou em risco iminente de enfrentamento armado, previne injusta e iminente agressão a direito seu ou de outrem" e o militar que "previne agressão ou risco de agressão a vítima mantida refém durante a prática de crimes". Portanto, essas ações poderiam não ser passíveis de punição.

Antes mesmo de o projeto ser votado no plenário, o relator acabou excluindo essa parte a pedido de partidos de centro e da oposição, como o próprio PT.

Peternelli considerou que os dispositivos se assemelham a texto rejeitado na Câmara quando da análise do chamado Pacote Anticrime e que a legislação atual já contempla hipóteses suficientes para "resguardar a tropa no cumprimento de suas missões constitucionais".

Criminalização de bico também foi retirado

Após pedidos de deputados militares, Peternelli retirou do projeto artigo que previa tornar crime a realização de bicos por policiais militares em atividades de segurança fora o horário de trabalho.

Ele explicou à reportagem que alguns estados permitem que seus policiais militares trabalhem fora da corporação e a criminalização poderia causar inseguranças jurídicas. Defensores do bico afirmam que o trabalho extra serve para complementar a renda mensal.

O projeto foi aprovado pelo plenário da Câmara com forte consenso entre os partidos depois que Peternelli aceitou promover mudanças sugeridas, com exceção do PSOL. No início da sessão, o PSOL pediu que o projeto fosse retirado de pauta, por suposta quebra de acordo de que somente matérias consensuais seriam votadas hoje. No entanto, outros partidos de oposição não contestaram a votação, que então seguiu normalmente.