Cracolândia, eleições 2024: o que se sabe sobre CPI que mira padre Júlio
Colaboração para o UOL*
06/01/2024 04h00
Rubinho Nunes (União) abriu um requerimento para criar uma CPI (Comissão Parlamentar de Inquérito) e investigar ONGs que atuam na Cracolândia. Em suas redes sociais, o vereador disse que pretende convocar o padre Júlio Lancellotti, que tem longa atuação social na região de São Paulo, para "prestar esclarecimentos".
O que se sabe sobre a CPI
Padre Júlio corre risco de ser alvo de uma CPI. O religioso foi anunciado como um foco de uma possível investigação por seu trabalho na área da "cracolândia", no centro de São Paulo, e pela relação dele com entidades assistenciais.
CPI investigará a ação de ONGs e deve ter como pano de fundo a eleição para a prefeitura da capital. O motivo seria a proximidade entre padre Júlio e o pré-candidato Guilherme Boulos (PSOL).
O autor da proposta da CPI é o vereador Rubinho Nunes, do União Brasil, partido que apoia a reeleição de Ricardo Nunes (MDB) e ainda tem Kim Kataguiri, filiado à sigla, como pré-candidato.
Arquidiocese se disse "perplexa" com notícias sobre possível CPI. Em nota, a instituição defendeu e reiterou o incentivo ao padre Júlio Lancellotti e as suas "obras de misericórdia junto aos mais pobres e sofredores da sociedade". Já o sacerdote disse não ter ligação com nenhuma ONG, reforçando que sua atuação não depende de convênio com o município de São Paulo.
Vereador busca antagonismo com padre
"Qual o problema de investigar?", pergunta o autor do pedido de CPI. Em vídeo divulgado nas redes sociais, Nunes atribui expansão da cracolândia à ação de ONGs e afirmou que a comissão investigará o trabalho do padre Julio e ONGs que atuam no Centro de São Paulo e recebem recursos públicos.
No entanto, o requerimento oficial feito pelo vereador não tem nome do padre. Diz apenas que pretende investigar "algumas das ONGs" que atuam na região porque elas "recebem financiamento público para realizar suas atividades". Foi justamente nas redes sociais que Nunes afirmou que convocaria o padre Júlio para "prestar esclarecimentos".
Agora, a CPI só depende de ok dos vereadores para começar, disse Nunes. Ele protocolou o pedido de abertura da comissão no começo de dezembro com o apoio de 24 vereadores — seis a mais do que o necessário. Agora, o início dos trabalhos só depende da aprovação em plenário com 28 votos.
Expectativa é instalar a CPI em fevereiro, após o fim do recesso parlamentar. Porém, o requerimento já perdeu o apoio de vereadores. Apesar da perda de apoio, o gabinete de Nunes diz que ainda possui assinaturas suficientes para criação da CPI, mas uma lista com todos os nomes não foi apresentada.
Em entrevista ao UOL News, o padre Júlio afirmou que a Câmara dos Vereadores de São Paulo deveria abrir uma CPI para investigar as condições de atendimento aos dependentes químicos. O religioso disse que a questão da cracolândia é densa e complexa, e que, se ele fosse o problema da região, a questão estaria resolvida quando morresse.
Se é uma CPI para procurar questões de determinadas pessoas, como se diz, 'com foco no padre Júlio', fica parecendo que a 'cracolândia' existe porque ela é patrocinada por mim. Se eu sou a causa da 'cracolândia', então é fácil: quando eu morrer, no dia seguinte ela não existe mais.
Padre Júlio Lancelotti, coordenador da Pastoral do Povo da Rua
O padre afirmou ainda que a questão da "cracolândia" será bastante explorada nas eleições municipais deste ano. Até agora, no entanto, diz ele, o poder público não encontrou uma solução adequada para o tema.
Nas eleições desse ano, essa questão estará presente no discurso de todos que forem candidatos. Já ouvimos muita coisa e vimos várias operações sobre isso, e o problema continua lá. Infelizmente, olhamos para os efeitos e não para as causas. Padre Júlio Lancelotti
Júlio Lancellotti é conhecido por seu trabalho de assistência a pessoas em situação de rua. Nas redes sociais, ele denuncia casos de violência policial e de construções que restringem o uso do espaço público. A lei que proíbe esse tipo de estrutura hostil leva seu nome.
O pároco é coordenador da Pastoral do Povo de Rua, ligada à Arquidiocese de São Paulo. Lancellotti também declara que o seu trabalho com esse público ação não tem vínculo com as atividades que constituem o objetivo do requerimento aprovado para a criação da CPI.
Uma em cada quatro pessoas em situação de rua vive na cidade de SP. A capital paulista tem mais de 54 mil pessoas em situação de rua, segundo levantamento do ano passado do Observatório Nacional dos Direitos Humanos.
*Com Estadão Conteúdo