PF encontra na sede do PL documento que anuncia estado de sítio
Do UOL, em Brasília
08/02/2024 17h35Atualizada em 08/02/2024 22h54
A Polícia Federal encontrou na tarde de hoje (8) um documento que anuncia a decretação de um estado de sítio no país. Apócrifo e sem assinatura, o documento estava na sede do PL, partido do ex-presidente Jair Bolsonaro, em Brasília. A descoberta foi revelada pelo G1 e confirmada pelo UOL.
O que aconteceu
O teor do documento se assemelha ao de um discurso. Ele diz que, para "assegurar a necessária restauração do Estado Democrático de Direito" e "jogando de forma incondicional dentro das quatro linhas", seria decretado um estado de sítio. A expressão "dentro das quatro linhas da Constituição" era usada frequentemente por Bolsonaro em seus discursos, para atacar o STF.
Também seria anunciada uma operação de Garantia de Lei e da Ordem. A GLO é o uso das Forças Armadas, de forma excepcional e com tempo determinado, para restaurar a normalidade.
A autoria do documento ainda é desconhecida. Ele foi encontrado durante buscas na sede do PL em meio à operação Tempus Veritatis, que mira suposta organização criminosa que tentou dar um golpe de Estado para manter Bolsonaro na Presidência.
Procurado pelo UOL, o advogado Paulo Cunha Bueno, que defende Bolsonaro, afirmou que o ex-presidente "desconhece" o documento. "PR desconhece esse documento sobre estado de sítio, merecendo observar que o estado de sítio, para ser decretado, demanda a convocação e aprovação prévia do Conselho da República e do Conselho de Segurança. Depois disso, precisa ser aprovado no Congresso. Portanto, não existe estado de sítio como ato unilateral de um presidente, o que o torna incompatível com um golpe de Estado nos moldes como está sendo narrado hoje", disse.
Mais tarde, em nota, os advogados do ex-presidente declararam "indignação" e "inconformismo" com as medidas cautelares deflagradas hoje. Eles classificaram a apreensão do passaporte de Bolsonaro como "absolutamente desnecessária" e alegaram que o ex-presidente não compactuou "com qualquer movimento que visasse a desconstrução do Estado Democrático de Direito ou as instituições que o pavimentam".
Operação atinge aliados e ex-ministros de Bolsonaro
Jair Bolsonaro é um dos alvos da operação de hoje (8). Os agentes foram à casa do ex-presidente em Angra dos Reis (RJ) para recolher o passaporte. Como o documento não estava no local, foi dado o prazo de 24 horas para a entrega. Depois, o passaporte foi encontrado na sede do PL e apreendido. O celular de Tércio Arnaud Thomaz, ex-assessor de Bolsonaro, também foi apreendido.
O coronel Marcelo Costa Câmara e Filipe Martins, ex-assessores de Bolsonaro, foram presos. A PF também prendeu Rafael Martins de Oliveira, major do Exército.
Ex-ministros de Bolsonaro são alvos de busca e apreensão. Entre os nomes estão Braga Netto, Augusto Heleno, Anderson Torres e Paulo Sérgio Nogueira. O presidente do PL, Valdemar Costa Neto, também é alvo da PF. Ele foi preso por posse ilegal de arma de fogo.
Bolsonaro pediu e aprovou alterações em minuta golpista
Bolsonaro recebeu cópia da minuta. De acordo com a PF, as provas colhidas até o momento apontam que Bolsonaro recebeu o material de Filipe Martins, então assessor, e Amauri Saad, advogado apontado como autor do texto.
As informações estão na decisão do ministro Alexandre de Moraes, do STF (Supremo Tribunal Federal), que autorizou prisões e buscas contra ex-ministros e integrantes do núcleo duro do ex-mandatário.
Segundo a PF, a minuta detalhava supostas interferências do Judiciário e decretava a prisão de diversas autoridades, como os ministros Alexandre de Moraes e Gilmar Mendes, além do presidente do Senado, Rodrigo Pacheco (PSD-MG). No fim, seriam determinadas novas eleições.
Com o documento refeito em mãos, Bolsonaro aprovou as mudanças. Depois disso, o ex-presidente convocou uma reunião com representantes das Forças Armadas: almirante Almir Garnier Santos, então comandante da Marinha, general Freire Gomes, do Exército, e o brigadeiro Batista Júnior, da Aeronáutica.
Posteriormente foram realizadas alterações a pedido do então presidente, permanecendo a determinação de prisão do Ministro ALEXANDRE DE MORAES e a realização de novas eleições. Nesse sentido, era relevante para os investigados monitorarem o ministro ALEXANDRE DE MORAES para executarem a pretendida ordem de prisão, em caso de consumação do golpe de Estado.
Trecho da representação da PF citada na decisão de Moraes
Os encontros teriam ocorrido em novembro de 2022, após as eleições daquele ano, na sede de campanha do PL. De acordo com a PF, Martins teria feito as alterações pedidas por Bolsonaro e retornou com o documento dias depois ao Palácio do Alvorada.
Após a apresentação da nova minuta modificada, JAIR BOLSONARO teria concordado com os termos ajustados e convocado uma reunião com os Comandantes das Forças Militares para apresentar a minuta e pressioná-los a aderirem ao golpe de Estado.
Trecho da representação da PF citada na decisão de Moraes
UOL revelou que Bolsonaro recebeu minuta, segundo Cid
Em setembro de 2023, UOL revelou que Mauro Cid contou, em sua delação premiada, que Bolsonaro recebeu uma minuta de golpe preparada pelo então assessor internacional Filipe Martins, logo após perder as eleições para Lula.
Segundo a reportagem do colunista Aguirre Talento, na ocasião Cid também revelou aos investigadores que Bolsonaro consultou os comandantes das Forças Armadas sobre plano de golpe de Estado. A trama teve apoio do comandante da Marinha, almirante Almir Garnier, e encontrou resistência dos comandantes da Aeronáutica e do Exército.