PF pune delegado que fez críticas à corporação na gestão Bolsonaro

A Polícia Federal puniu o ex-chefe da superintendência no Amazonas por ter sido "desleal com a corporação" ao criticar o então chefe da PF durante o governo de Jair Bolsonaro.

O que aconteceu

Pena ao delegado Alexandre Saraiva foi por "transgressão disciplinar". A PF concluiu apuração contra Saraiva. A punição foi publicada no boletim interno da corporação ontem e impõe ao delegado a pena de 31 dias de suspensão. Neste período, ele fica sem poder trabalhar e sem salário.

Delegado disse que vai recorrer da decisão. Ele vai pedir reavaliação ao ministro da Justiça, Ricardo Lewandowski, a quem cabe essa tarefa (leia mais abaixo).

Delegado fez reiteradas críticas à PF em entrevistas. No despacho em que determinou a punição, o atual diretor da PF, Andrei Rodrigues Passos, segue o entendimento da comissão do Processo Administrativo Disciplinar e afirma que Saraiva teria sido "desleal" com a instituição, tentando destruir a reputação do então diretor-geral, Paulo Maiurino.

Processo foi instaurado em 2022, durante o governo Bolsonaro. Mesmo com a mudança na chefia da corporação, a comissão nomeada para conduzir o processo disciplinar se mantém.

Aplicar a pena disciplinar de 31 dias de suspensão por ter enviado representação diretamente à COGER/PF sem o conhecimento de seus superiores, ao arrepio dos princípios da hierarquia e disciplina que regem a instituição policial federal, descumprindo ainda norma geral do regime jurídico dos servidores públicos federais, bem como por ter sido desleal com a instituição ao tentar destruir a reputação do diretor-geral da Polícia Federal, de questionar atos praticados pela administração, condutas que configuram a prática da transgressão disciplinar.
Despacho do diretor-geral da PF, Andrei Rodrigues Passos

Exonerado após denúncia

Delegado pediu investigação contra Ricardo Salles. Alexandre Saraiva foi exonerado da chefia da unidade da PF no Amazonas após pedir ao STF (Supremo Tribunal Federal) que abrisse investigação contra o então ministro do Meio Ambiente, Ricardo Salles. Delegado deixou o posto em 2021 e foi alocado na delegacia da PF em Volta Redonda (RJ). Atualmente ele está lotado em Petrópolis (RJ).

Em entrevistas após sua saída, ele fez críticas à gestão da corporação. Apuração interna constatou que ele falou com a imprensa sem avisar o setor de comunicação do órgão. Alexandre Saraiva também encaminhou denúncias à Corregedoria da PF contra Maiurino sem avisar seus superiores diretos, o que configura transgressão disciplinar.

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Ele chegou a encaminhar à Corregedoria da PF uma representação contra o então diretor-geral pelo fato de ele ter comprado um imóvel de luxo em Miami. Além disso, Saraiva também encaminhou ao órgão uma representação por suposto acúmulo de cargos públicos pelo então diretor-geral da corporação.

Em uma das entrevistas que deu à imprensa na época, Saraiva insinuou que a corporação estaria cedendo a interesses políticos. "Antes, existia uma política velada na PF: mesmo alguém pedindo para sair de um posto, se tivesse qualquer tentativa de interferência política por fora, essa pessoa não era trocada, para sinalizar que não havia possibilidade de intervenção. Parece que isso mudou e minha substituição foi inoportuna", afirmou o delegado, em setembro de 2021.

Delegado classifica procedimento como "absurdo e ilegal". À reportagem do UOL, o delegado afirmou que não há precedentes de um servidor da corporação lotado em outro estado ser punido em um procedimento disciplinar realizado em Brasília. Disse ainda que os fatos investigados no PAD já haviam sido arquivados na superintendência da PF no Rio de Janeiro.

Trata-se de um procedimento completamente ilegal e absurdo, porque eu denunciei práticas criminosas [envolvendo Maiurino] que, até onde eu sei, não foram objeto de inquérito e investigação. Quem denuncia é desleal e recebe punição, e aquele que deveria ser investigado, aliás hoje não está nem mais na PF, pois pediu licença, sai impune? Isso é um completo absurdo.
Alexandre Saraiva, delegado da Polícia Federal

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