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O polêmico canal do YouTube em que apresentadores usam drogas para informar sobre efeitos e danos

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26/01/2017 13h41

Cada episódio é dedicado a uma droga. Os apresentadores falam sobre sua história, como é feita, se tem aplicações medicinais, os efeitos e prejuízos causados por ela e como consumi-la com segurança.

"Não havia na internet um programa que desse essas informações de forma precisa para os jovens. Não há um jeito melhor de fazer isso do que usá-las em frente à câmera", diz Jelle Klumpenaar, criador e produtor do Drugslab, à BBC Brasil.

Em seu relatório mais recente sobre o tema, divulgado no ano passado, a Organização das Nações Unidas aponta que 250 milhões de pessoas - cerca de 5% da população mundial entre 15 e 64 anos - usou drogas ao menos uma vez em 2014.

Ao mesmo tempo, 29 milhões de pessoas sofriam com problemas relacionados a drogas, o primeiro aumento registrado nos últimos seis anos - eram 27 milhões em 2013. O consumo abusivo levou 207 mil pessoas à morte no mundo naquele ano.

A ONU diz que, "de forma geral, o impacto do uso de drogas para a saúde continua a ser devastador".

Klumpenaar afirma que o Drugslab busca prestar um serviço e reduzir os danos gerados pelo uso dessas substâncias, em sintonia com uma mudança na forma como jovens consomem informação.

"Educar jovens sobre drogas é uma boa forma de evitar acidentes. E eles preferem pessoas reais contando histórias reais em vez de apresentadores lendo roteiros", diz o produtor.

"Há quem ache nosso conteúdo controverso, e respeitamos isso. Falar sobre o tema ainda é um grande tabu em muitos países. Queremos quebrar esse tabu."

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Efeitos e perigos

À frente do canal estão o cantor Rens Polman, de 25 anos, o estudante universitário Bastiaan Rosman, de 23, e a atriz Nellie Benner, de 30.

No episódio de estreia, cabe à Rens testar ecstasy, uma pílula muito popular em festas de música eletrônica cujo princípio ativo é conhecido como MDMA.

Logo no início, o rapaz se vira para a câmera e destaca a importância de testar o comprimido para saber sua composição - um serviço oferecido desde 1992 por laboratórios autorizados pelo Ministério da Saúde holandês.

"Sempre faça o teste, porque às vezes as pílulas parecem iguais (às de ecstasy), mas são imitações", diz Rens antes de engolir um comprimido rosa.

Depois de alguma espera, ele começa a relatar as sensações geradas pela droga - ele sente calor, sua boca resseca, suas mãos ficam frias e suadas, sua sensibilidade se aguça.

Sóbria ao seu lado, Nellie questiona Rens sobre o que ele sente enquanto monitora seus batimentos cardíacos e temperatura e faz uma série de testes para avaliar como as habilidades cognitivas, motoras e o comportamento do colega são afetados.

Na tela, surgem alertas como: "Os acidentes mais comuns envolvendo o uso de ecstasy são superaquecimento (do corpo) e intoxicação por água".

Cada programa, de dez minutos, é acompanhado por um clipe curto que resume o que é a droga testada e traz recomendações do que fazer e evitar ao consumi-la.

Entre alguns dos conselhos dados aos espectadores, estão: avisar amigos da dose usada; evitar beber álcool com drogas que afetam o sistema nervoso; e ter em mente que drogas feitas a partir de ingredientes naturais não são uma opção mais saudável do que as sintéticas.
Informação

O criador do canal rejeita a ideia de que, ao mostrar jovens experimentando drogas, esteja de alguma forma incentivando outros jovens a fazer o mesmo ou glorificando seu uso.

"Adolescentes e jovens experimentam drogas, é normal. Se eles não obtêm essas informações com nosso programa, vão buscar por isso na internet", afirma Klupenaar.

"Não é nosso papel dizer que isso é errado. Mostramos os efeitos e oferecemos as informações para minimizar os possíveis perigos."

O produtor destaca ainda que os vídeos do canal só podem ser vistos por usuários do YouTube cadastrados como maiores de 18 anos.

"Checamos as regras do site com cuidado e mostramos a ideia para a equipe do YouTube na Holanda. Eles adoraram."

O YouTube respondeu a um pedido de entrevista da BBC Brasil dizendo que "não comenta casos específicos", mas que, se o Drugslab está no ar, é porque "está de acordo" com suas diretrizes.

O psiquiatra Dartiu Xavier, que coordena há 28 anos o Programa de Orientação e Atendimento a Dependentes da Universidade Federal de São Paulo (Unifesp) diz que o Drugaslab "é algo novo e importante".

"Um canal assim presta um serviço de utilidade pública. Diversos estudos mostram que a forma como combatemos o uso de drogas desde os anos 1970 não está funcionando", afirma Xavier. Ele explica que, desde os anos 1990, uma nova estratégia baseada na redução de danos vem ganhando força.

"Há iniciativas bem-sucedidas na Europa e outros países, como, por exemplo, oferecer teste da composição de drogas em boates. A pessoa vai usar de qualquer maneira. É mais seguro que saiba o que está usando. Mas, no Brasil, ainda existe muita resistência a essa abordagem, e vários técnicos da área acreditam que isso incentiva o consumo."

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Mesmo na Holanda, o Drugslab não é aprovado por todos. Ferry Goossens, que lidera o programa para álcool e drogas do Trimbos Instituut, referência no país para tratamento e prevenção de doenças mentais e vícios, avalia que o canal "não é uma boa ideia".

Ele argumenta que, ao usar uma abordagem como a redução de danos, a mensagem deve ser dirigida a quem já usa drogas.

"O Drugslab pode ser visto por qualquer um e mostra como usá-las (as substâncias). A maioria das pessoas - e dos jovens - não usa drogas. E quem não consome pode ficar interessado em testar ou quem usa um tipo pode querer experimentar outros", diz Goossens.

"A maioria das pessoas não tem problemas ao usar drogas, mas há muitas que têm e vão parar no hospital depois de uma única dose. O efeito é imprevisível, e fazer isso uma única vez pode ser perigoso ou até mesmo fatal."

Testes

Desde a estreia, em setembro, os apresentadores do Drugslab já experimentaram algumas das drogas mais comuns, como cocaína, LSD, cogumelos e bolo com maconha, outras menos conhecidas - o composto sintético 2C-B e ecstasy feito com ervas, por exemplo - e algumas que muitos não considerariam uma droga, como cafeína concentrada, álcool e óxido nítrico (o gás hilariante).

A ideia é que os espectadores sugiram quais devem ser testadas. O canal, no entanto, ainda não se aventurou a atender a pedidos por drogas como heroína, a que mais mata no mundo, segundo a ONU.

Qual foi a mais difícil de testar até agora? "Álcool", diz Klumpenaar. "Bastiaan ficou tão tonto que foi difícil para ele responder às perguntas de Rens."

Por sua vez, Rens diz ter ficado surpreso com o ecstasy de ervas. "Nunca pensei que funcionaria, mas senti coisas que nunca experimentei com esctasy comum. Por isso, não acredito que seja feito só com ervas. Mas aí é que está: você nunca sabe exatamente o que tem em uma droga."

Ele conta que, ao ser convidado para apresentar o programa, não sabia a princípio se aceitaria, porque as pessoas não só saberiam que ele estava usando drogas, mas o veriam fazendo isso.

"No fim das contas, aceitei porque achei bom poder falar desse tema e educar as pessoas. Muitas nos agradecem por isso."

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Segurança

A Holanda permite há quatro décadas o consumo, em cafés especializados, de maconha e outras substâncias consideradas "leves" em sua política nacional de drogas, como trufas e cogumelos alucinógenos. As classificadas como "pesadas", como cocaína ou morfina, são proibidas.

Questionada sobre a origem de drogas ilegais testadas no programa, a produção do canal diz que "prefere não revelar suas fontes".

Segundo o Centro Europeu de Monitoramento para Drogas e Vício, a taxa de mortes relacionadas a drogas entre pessoas com 15 a 64 anos na Holanda foi de 10,8 por 1 milhão em 2014, quase 50% abaixo da média europeia, de 19,2 por 1 milhão.

"Apesar de haver alguma variação anual, esse índice se mantém relativamente baixo, o que pode ser explicado pelo número reduzido de usuários de alto risco que são marginalizados socialmente, a ampla disponibilidade de medidas de tratamento e prevenção e o baixo uso de drogas injetáveis", diz o centro em seu site.

Klumpenaar explica que fazer um programa sobre drogas não é algo novo para a rede holandesa, que integra uma associação de emissoras públicas do país regulada por uma fundação financiada por meio de impostos.

A BNN já produz o Spuiten en Slikken (Injete e Engula, em holandês), que trata das histórias por trás de uma droga e seus usuários.

O Drugslab, por sua vez, se concentra nos efeitos de curto prazo de uma droga. No entanto, ressalta o produtor, o canal não é feito com recursos repassados pelo governo.

Klumpenaar diz que um dos principais desafios da produção é garantir a segurança dos apresentadores, já que a reação de uma pessoa a uma droga "é imprevisível" e "há sempre riscos envolvidos". Por isso, um médico acompanha as filmagens.

O produtor conta que ele e sua equipe esperavam receber reações negativas por se tratar de um tema polêmico, mas afirma que isso não se concretizou. "As mensagens que recebemos são muito positivas. Não poderíamos ter desejado um começo melhor", diz.

"Mas é bom ter cuidado, porque é cedo para falar. Nossos vídeos não foram vistos nem por 1% do público do YouTube... ainda."