Família faz campanha para tratar filha com doença rara em Teresina
A família da menina Gabriela Pallin, 6 anos, que mora em Teresina, está realizando uma campanha para arrecadar R$ 130 mil para custear a quinta fase do tratamento da criança em um hospital no Peru. Ela sobre da doença de Sandhoff, um problema raro que afeta o sistema neurológico de forma severa e fatal e para a qual não há cura.
Desde 2011, a menina vem sendo submetida a tratamentos experimentais com células-tronco embrionárias no hospital Clinica San Felipe, em Lima. A médica Lorena Mesquita, que cuida de Gabriela há dois anos, diz que a terapia está proporcionando uma melhora na qualidade de vida da menina. A profissional também credita ao tratamento o fato de Gabriela ter superado sua expectativa de vida - pessoas com a doença de Sandhoff vivem, no máximo, três anos.
"Vejo que a Gabi tem uma melhora toda vez que se submete a esse tratamento de célula- tronco, pois ela usa muito pouco oxigênio e está com reflexos nas pernas e braços. Prova disso é a idade dela, pois essa doença é degenerativa e as crianças morrem antes dos três anos de idade", dz a pediatra.
Segundo a médica, a doença de Sandhoff é extremamente agressiva e a pessoa que tem a doença piora a cada dia, o que não vem ocorrendo com Gabi. "Cuido há dois anos dela e só prescrevi antibiótico uma vez. Gabi não adoece muito, não tem gripe, não tem pneumonia de repetição, como tinha antes do tratamento com células-tronco, e isso é raro para uma criança que tem a saúde fragilizada em uma cidade em que o clima é seco e quente", explicou Mesquita.
O tratamento a que Gabriela deverá se submeter em Lima dura cerca de dez dias e é feito com duas injeções de células-tronco na medula. Por ser um tratamento experimental, não pode ser custeado pelo plano de saúde e a família tem de arcar com a despesa do hospital e de medicamentos, além de passagens aéreas e hospedagem para quatro pessoas – a mãe, duas auxiliares e uma enfermeira especializada em UTI.
“Somente o tratamento no hospital custa R$ 98 mil e, como Gabriela precisa de um aparato especial para viajar, o valor chega a R$ 130 mil”, afirma a mãe de Gabi, Luciana Pallin.
Movimentos
A fisioterapeuta Clara Duailibe, que cuida de Gabriela desde o ano passado, também atesta a evolução proporcionada pelo tratamento experimental, que está sendo feito em paralelo às condutas convencionais: "A Gabi respira espontaneamente (sem necessidade de aparelhos), não necessita de oxigênio contínuo, começou a apresentar alguns movimentos como puxar a perninha e o bracinho durante algum estímulo", conta a fisioterapeuta.
"Não sabemos se existe uma cura para a Sandhoff e para doenças semelhantes, mas o tratamento com células-tronco só trouxe benefícios e é muito necessário que tenha continuidade para que, a cada dia, a Gabi tenha outros ganhos", enfatizou Duailibe.
Caso consiga arrecadar o valor a tempo da chegada do verão, a família pretende embarcar em setembro de Teresina para São Paulo, onde a menina ficará por um mês até seguir viagem em outubro para Lima.
“O clima do inverno poderá comprometer a saúde de Gabi, que já teve inúmeras pneumonias e chegou até a ser desenganada pelos médicos. Como a viagem de Teresina para São Paulo dura três horas de avião, fora o tempo de espera no aeroporto, Gabi se desgasta muito, por isso paramos em São Paulo até ela se restabelecer e seguimos para o Peru”, explica Pallin.
Diagnóstico
Gabriela nasceu em 17 de março de 2008. Com poucos meses de vida a família passou a observar que a menina não se desenvolvia como os demais bebês de sua idade. Com seis meses, ela foi encaminhada ao neurologista, ainda em Teresina, que não conseguiu fazer um diagnóstico, apesar de Gabi perder progressivamente os movimentos do corpo.
Segundo Pallin, o diagnóstico da doença de Sandhoff veio quando a menina tinha 1 ano e 6 meses, depois que a família buscou ajuda em São Paulo. Com o diagnóstico veio a notícia de que Gabi não sobreviveria até os cinco anos de idade. Foi quando a família iniciou uma busca incessante por tratamentos paliativos para manter a vida da criança. “Perdemos o chão. Comecei a buscar na internet junto com uma amiga um tratamento que pudesse ajudar Gabi e achamos esse tratamento em Lima”, lembra a mãe.
A doença de Sandhoff é uma doença genética que destrói progressivamente os neurônios. Ela é caracterizada pela ausência de duas enzimas vitais, o que provoca o acúmulo de certas células de gordura que danificam o sistema nervoso. Ela recebeu esse nome graças a um químico alemão, Konrad Sandhoff, um dos responsáveis pela descoberta do mal em 1965.
A doença é extremamente agressiva ao sistema nervoso central, causando fraqueza muscular, deterioração mental e motora progressiva, incluindo espasmos, convulsões, ausência, pneumonias frequentes, aumento de fígado e baço. Os sintomas se assemelham aos da doença de Tay-Sachs, que é igualmente rara.
“Quando a Gabi era bebê, ela teve atraso no desenvolvimento, foi perdendo as habilidades uma por uma, como virar, sentar, andar, enxergar e engolir, e passou a ter dificuldade de respirar”, relata Pallin. Atualmente Gabriela se alimenta por meio de sonda. A alimentação é custeada pela prefeitura de Teresina e a medicação, que é de alto custo, vem do Estado.
"O que busco não é qualidade de vida, e sim manter a vida da minha filha”, declara Pallin, que mantém um site sobre a filha (www.unidaspelavida.com).
Alerta
A geneticista Mayana Zatz, professora do Instituto de Biociências da Universidade de São Paulo (USP) alerta que, embora as pesquisas com células-tronco pareçam promissoras, tratamentos clínicos com essas células estão ainda na fase experimental. "Mesmo assim, algumas clínicas aproveitam-se do desespero de pacientes e oferecem tratamentos não comprovados e cobram, às vezes muito, por isso", alerta.
"Antes de submeter-se a um tratamento experimental", avisa a especialista, "é muito importante que os pacientes saibam que tentativas terapêuticas experimentais não podem ser cobradas". Ela também recomenda que os pacientes pesquisem bem o currículo do médico responsável, para avaliar qual sua experiência prévia no assuntos e quais trabalhos científicos publicou.
A reportagem do UOL entrou em contato com o médico responsável pelo tratamento de Gabriela, mas não obteve resposta às perguntas enviadas.
(*Colaborou Tatiana Pronin)
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