Brasileiro cria alternativa a cirurgia que deixa homem sem ejacular
Imagine a cena: você sai de uma reunião para ir rápido ao banheiro e não perder nada. Mas chegando lá, o xixi demora e quando finalmente vem é um jato fininho e fraco. Você sabe que tem mais na bexiga, mas nada acontece, nem uma gotinha. Desistindo, você sai do banheiro, volta para reunião e assim que senta na cadeira sente que está apertado de novo.
Esse é um dos sintomas do aumento benigno da próstata. De acordo com a Sociedade Brasileira de Urologia, cerca de 50% dos homens acima dos 50 anos apresentam algum grau da doença, que pode ser hereditária ou reflexo da variação nos níveis de testosterona que ocorrem com a idade.
Existe uma cirurgia para reverter esse aumento, mas, como efeito colateral, ela geralmente faz com que os homens não consigam mais ejacular. Ou seja, um problema substitui o outro. Para tentar resolver a questão, o médico Francisco Carnevale do Hospital das Clínicas da USP, em São Paulo, desenvolveu uma técnica para desinchar a próstata e "liberar" o canal que leva a urina, sem afetar a ejaculação do paciente.
O que o xixi, a próstata e o sêmen têm a ver?
Em quem tem a doença, chamada de HPB (Hiperplasia Prostática Benigna), a próstata incha e aperta a uretra, que é como um cano fininho que transporta o xixi da bexiga até o pênis, passando pelo centro da próstata. O resultado é uma série de sintomas no sistema urinário como infecções, incontinência e sensação de não esvaziamento na bexiga. Os sintomas não são agradáveis e pioram a qualidade de vida do paciente, que precisa sempre ter um banheiro em vista.
Levantava 4 vezes por noite para ir ao banheiro, nem dormia. Ao dirigir, tinha que levar uma garrafa no carro em caso de emergência. Era terrível" Paciente que sofria da doença
O tratamento comum para a doença é a ressecção transuretral, que retira a parte inchada da próstata, garantindo espaço para uretra e facilitando a saída da urina. Tudo ótimo, se não fosse por um problema que acontece muitas vezes: a cirurgia pode prejudicar o mecanismo da ejaculação, que também passa pela uretra. Com o procedimento, o sêmen não chega à uretra, vai para a bexiga e não sai pelo pênis. O homem tem ereção e orgasmos, mas deixa de ejacular --o esperma sai na urina. Além de poder afetar psicologicamente o paciente, que terá sua vida sexual alterada, a cirurgia ainda dificulta tentativas de gravidez.
Alternativa brasileira elimina sintomas e mantém ejaculação
Carnevale estuda o HPB há cerca de dez anos e criou um método para tratar a doença sem cirurgia e sem esse efeito colateral: a embolização da próstata.
O nome soa complicado, mas a ideia é simplificar. O procedimento é feito em uma sala de intervenção, não no centro cirúrgico, e, diferente da cirurgia, dispensa anestesia geral e internação. O paciente fica acordado, usa anestesia como a de dentista e, em cerca de quatro horas após o procedimento, volta para casa.
"Inserimos um cateter bem fino pela virilha e caminhamos com ele pela artéria até chegar à próstata. Uma vez lá, são injetadas microesferas do tamanho de grãos de areia nos nódulos responsáveis pelo aumento benigno da próstata. Com as microesferas, os nódulos entopem, não recebem sangue, e aí eles não conseguem mais crescer e acabam murchando", explica o médico de radiologia intervencionista.
Para testar a ideia, Carnevale foi para universidade de Harvard, nos Estados Unidos, e trabalhou com um grupo de cachorros vira-lata. "Os animais tinham próstata grande e com a técnica notei redução de 40% no tamanho da glândula". Com o bom resultado e um artigo publicado, ele voltou ao Brasil para começar a fase de testes em humanos. "De lá para cá já tratamos 250 homens, e o resultado é sucesso em 90% dos pacientes. A melhora dos sintomas aparece a partir de 15 dias e não afeta a ejaculação", diz. Então, novos estudos foram publicados em revistas científicas para atestar a técnica.
Não doeu nada, foi uma coisa maravilhosa, uma sensação de alivio, conforto, voltei a ter paz. Hoje tenho uma vida normal, em matéria se saúde foi a coisa mais feliz que já fiz" Paciente de 76 anos que passou pela operação ano passado
No Brasil, a técnica foi aprovada pelo CFM (Conselho Federal de Medicina) e agora será ensinada para outros médicos. "O Hospital das Clínicas vai treinar, ainda em agosto, alguns médicos que tiverem interesse no procedimento. Será preciso passar por dez procedimentos comigo para conseguir um certificado". Depois disso, os treinados voltarão para os hospitais de origem e enviarão protocolos sobre os pacientes tratados para que exista acompanhamento do CFM.
Apesar do entusiasmo é importante ter cautela: é preciso acompanhar os pacientes por mais anos para garantir a eficácia e durabilidade. "Por ser um método novo não sabemos quais são os resultados a longo prazo. Mas com certeza em curto prazo é bom, ainda mais para os homens que valorizam a ejaculação", diz Alberto Antunes, coordenador do setor de próstata da USP e membro do departamento de HPB da Sociedade Brasileira de Urologia.
Por enquanto, em curto prazo, o procedimento faz sucesso: "Eu fiz e meus quatro irmãos também. Já faz anos [cerca de dois] e ainda me sinto ótimo, consigo beber três latas de refrigerante, antes só de tomar uma já tinha que correr para o banheiro", afirma E.P, 68 anos.
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