Mãe recebe filho vindo do exterior e mantém distância, sem beijo nem abraço
"Nada de beijo e abraço, hein?"
Foi essa a recomendação que a professora universitária Flávia Bespalhok, 55, recebeu horas antes de reencontrar seu filho Nicolas, 20, no aeroporto de Curitiba, após três meses separados.
Nicolas voltou na segunda-feira (16) de um intercâmbio nos Estados Unidos. Por conta da pandemia do novo coronavírus, ele deve evitar contato com outras pessoas por pelo menos sete dias.
A restrição inclui sua mãe, que resolveu demonstrar o carinho pelo filho com um cartaz ao recepcioná-lo em sua volta ao Brasil. "Não podemos abraçar você, mas receba todo nosso amor! Bem-vindo!", escreveu.
"É muito difícil você não poder abraçar seu filho, né?", reclamou ela, em conversa com o UOL. "Mas agora estou vendo ele todo dia. Queria ele aqui do meu lado neste momento. Ao menos sei que está bem."
Nicolas é estudante de Educação Física e foi para Califórnia em dezembro para trabalhar numa estação de esqui. Quando ele deixou o Brasil, não havia sinais de que o coronavírus viria a se tornar um problema de saúde mundial.
"Trabalhei até março sem nenhum problema", contou ele. "Aí surgiram as primeiras notícias de que a doença estava se espalhando. Foi então que vi que o melhor era voltar para casa."
Nicolas antecipou o fim de seu contrato de trabalho. Ele e sua mãe passaram dias tentando remarcar seu voo. Sem sucesso, o jovem contou com a ajuda de funcionários da United Airlines para deixar o território americano.
Cheguei no balcão e expliquei a situação. Acho que me deixaram embarcar porque sabiam que, em alguns dias, todos os voos poderiam ser cancelados. Eu iria ficar preso lá.
Nicolas Bespalhok, brasileiro em observação após voltar dos EUA
Brasileiros em fuga
Na sua viagem de volta, Nicolas embarcou em São Francisco rumo a Nova York num voo praticamente vazio. "Acho que os americanos já entenderam que não devem sair de casa", afirmou. "Estão mais conscientes."
Depois, voou para São Paulo. "Aí o avião estava lotado. Muitos brasileiros antecipando a volta das férias. Todo mundo com medo não ter voo para voltar."
Ao chegar a Brasil, Nicolas tomou outro avião rumo a Curitiba, onde mora. Foi aí que reencontrou sua mãe. Mas sem poder abraçá-la nem beijá-la.
"É complicado. Você quer abraçar e beijar seus pais depois de três meses, né?", reconheceu. "A gente quer a esse contato. É natural para gente."
No aeroporto, recomendações foram ignoradas
"Eu falo com muita gente, moro num prédio com idosos? Tenho que ser responsável nesta hora", justificou Flávia, que dá aulas na UFPR (Universidade Federal do Paraná) e dirige um setor na universidade. "Se eu tenho contato com meu filho, quem tem que ficar isolada sou eu."
A UFPR suspendeu suas aulas por conta do coronavírus. Também criou uma comissão para discutir ações relacionadas a pandemia.
O professor Emanuel Maltempi de Souza, do departamento de Bioquímica e Biologia Molecular, preside o grupo. Ele é amigo de Flávia. Foi ele quem recomendou que ela não tivesse contato com Nicolas.
"Dei sorte porque tenho um amigo que é especialista", contou. "Mas encontrei no aeroporto gente esperando quem chegava de fora. Ninguém tomou cuidado. Não estamos cientes da gravidade do problema."
Churrasco cancelado
Já em casa, Nicolas disse que têm seguido as recomendações de isolamento. Não compartilha toalhas com seus familiares e mantém uma certa distância deles. O talher com que ele come ninguém usa.
Nicolas não tem sintomas infecção pelo coronavírus. Apesar disso, já cancelou o churrasco marcado com amigos para comemorar a volta ao Brasil. "Quarentena é isso aí. Ainda bem que está todo mundo sendo compreensivo."
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