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Por dividir casa com doente, EUA já me consideram infectado, diz brasileiro

Alex Tajra

Do UOL, em São Paulo

18/04/2020 04h00

Resumo da notícia

  • Advogado Paulo Freitas vive no estado de Nova Jersey, que já registrou 3.840 mortes em decorrência da covid-19 e 78.467 casos
  • Ele mora com outras três pessoas. Sua prima foi diagnosticada com o coronavírus no início de abril, após realizar o teste
  • O departamento de Saúde local informou que todos da casa entrariam para as estatísticas da doença, pois estão confinados juntos
  • O governo de Nova Jersey instruiu as empresas de saúde a não cobrar dos consumidores os "testes clinicamente necessários"

O advogado Paulo Freitas, 40, deixou o Brasil há seis meses para conhecer os Estados Unidos e, posteriormente, começar a estudar naquele país. No percurso, no entanto, está enfrentando a pandemia do novo coronavírus. Pior, ele acabou se instalando em Nova Jersey, que registrava até ontem 3.840 mortes em decorrência da covid-19 e 78.467 casos, segundo o governo do estado.

Asmática, a prima de Paulo, Mara Brasil Giacobbe, que trabalha em um banco com sede em Nova York, foi diagnosticada com o vírus na primeira semana de abril, após aguardar uma semana para o resultado do teste.

Dois dias depois, o departamento de Saúde ligou na residência para verificar como ela estava e informou que todos que vivem lá entrariam para as estatísticas, já que estão confinados juntos. Como no Brasil, os testes para verificar a presença do vírus são escassos, preservados para os pacientes graves.

Dessa forma, Paulo, Mara, Roberto Demello (também primo de Paulo) e o policial John Giaccobe foram contabilizados entre os quase 80 mil casos confirmados da covid-19 em Nova Jersey, até o fechamento desta reportagem.

O advogado brasileiro vive com os três colegas na cidade de Belleville, no condado de Essex. Nessa região do estado, 642 pessoas morreram por conta do novo coronavírus. Na área metropolitana de Nova York, que engloba cidades dos estados de Nova York e de Nova Jersey, são mais de 13 mil vítimas da doença.

Da esquerda para direita: Roberto Demello, Paulo Freitas, Mara Brasil Giacobbe e John Giacobbe em Nova Jersey - Arquivo pessoal - Arquivo pessoal
Da esquerda para direita: Roberto Demello, Paulo Freitas, Mara Brasil Giacobbe e John Giacobbe em Nova Jersey
Imagem: Arquivo pessoal

Os EUA alcançaram o topo em relação ao número de casos e mortes da doença. São 666.573 contaminados e 30.449 vítimas (de acordo com o governo do estado de NJ), números que aumentam a cada minuto. Nos cálculos, Nova Jersey responde por mais de 10% das mortes no país. Já balanço divulgado ontem pela Johns Hopkins University informa que os EUA somam 679.374 infectados, com 34.180 mortos.

"Todo mundo teve um tipo de sintoma. Meu outro primo teve um problema de falta de olfato, eu um dia fiquei muito cansado, dormi 16 horas, mas nada que fosse algo grave. Como era leve, quase assintomático, eles [governo de NJ] pediram para gente ficar monitorando qualquer quadro [de sintomas]", conta Paulo.

"Não chegou a ser uma dor absurda, foi meio que um cansaço", completa o advogado, citando ainda uma bronquite nos últimos dias.

Governo mandou hospitais não cobrarem

O governo de Nova Jersey instruiu as empresas de saúde do estado a não cobrar dos consumidores os "testes clinicamente necessários" da covid-19. Em outros estados, o pagamento pelo teste passa por regulamentações e depende de cada plano de saúde privado.

"Além disso, para garantir que os indivíduos não segurados tenham acesso aos testes para a covid-19, a Administração Murphy exigiu que os hospitais e os Centros de Saúde Federal Qualificados (FQHCs) renunciassem às taxas dos pacientes pelos testes e serviços de diagnóstico, para aqueles que não possuem seguro de saúde", diz um comunicado do governo de Nova Jersey, comandado por Phil Murphy.

Esse é exatamente o caso de Paulo, que está tentando alterar seu status migratório e não possui plano de saúde. O advogado brasileiro menciona que a medida adotada pelo governo de Nova Jersey não é uma regra e que muitos imigrantes ilegais estão em um "vácuo".

"Não estão tendo uma assistência do governo [federal], isso é uma característica do governo Trump, ele não está se importando com isso. O que eu vi é que muitas pessoas estão recebendo ajuda da comunidade, de igrejas, e procurando auxílio. As pessoas estão passando por necessidades."

Mudança na postura de Trump

Paulo Freitas citou uma mudança drástica na postura do presidente norte-americano Donald Trump, após a intensificação da doença nos EUA. O republicano fazia coro com outros líderes, incluindo o presidente Jair Bolsonaro (sem partido), contra o isolamento social amplo e as medidas restritivas. Segundo o advogado, até a forma de Trump se expressar em relação ao coronavírus mudou, após o aumento de casos e mortes no país.

"De um dia para o outro ele mudou o discurso radicalmente. Ele entendeu o tamanho da gravidade do negócio e recuou daquilo que estava fazendo. Foi perceptível. Trump fazia discursos diários sobre a pandemia, de um dia para o outro foi pontual a mudança. Ele chamava o vírus de chinese virus [vírus chinês, em inglês], e, de um dia para o outro, passou a chamar só de vírus e ainda elogiou os chineses."

Desde o início da pandemia, Trump se posicionou ao lado de negacionistas em relação ao potencial do vírus, mesma postura adotada por Bolsonaro em março. Mas, com a escalada de mortes causadas pela covid-19 nos EUA, ele teve de mudar seu posicionamento. Ontem, Trump deu mais uma mostra de que mudou de posição e afirmou que a retomada das atividades econômicas será de responsabilidade dos governadores.