Casos de covid-19 são 10 vezes o notificado e somam 7 milhões, diz estudo
Resumo da notícia
- Estudo publicado em revista científica estima em até 7 milhões os infectados no Brasil
- O levantamento utilizou um modelo computacional que impressionou a Abin
- O estudo corrobora outros levantamentos que apontam para a subnotificação no país
- Principal razão é o baixo número de testes aplicados em todo o Brasil
Uma pesquisa brasileira adotada pela Abin (Agência Brasileira de Inteligência) como referência de estudo científico indica que o número real de casos de covid-19 no Brasil é entre oito e dez vezes maior do que a quantidade de diagnósticos divulgada oficialmente pelo Ministério da Saúde. Como o país atingiu ontem 707.412 casos segundo levantamento do consórcio de imprensa, o número estaria entre 5,6 milhões e 7 milhões — incluindo os assintomáticos.
A estimativa foi feita por uma equipe de pesquisadores do programa de pós-graduação em modelagem computacional da UFJF (Universidade Federal de Juiz de Fora) e do Cefet (Centro Federal de Educação Tecnológica) de Minas Gerais.
Para chegar ao número aproximado de doentes, os pesquisadores usaram um modelo computacional que relaciona o número oficial de óbitos com a taxa de letalidade da doença no Brasil, hoje em 5,5%. O estudo compara essa taxa com a de países e locais que fizeram testagem em massa, como Coreia do Sul, Alemanha e a cidade de Nova York, nos Estados Unidos. Justamente em razão da notificação mais acurada, a letalidade por lá, que gira em torno de 1%, é mais fiel à realidade.
"Quando publicamos nossa primeira nota técnica, em 30 de março, as estimativas eram de que a subnotificação era de 12 vezes", explica um dos autores do estudo, o professor da UFJF Rodrigo Weber do Santos. "De lá para cá o Brasil tem feito mais testes. Por isso que a previsão é de que o número oficial de infectados estaria subnotificado entre oito e dez vezes neste momento."
Se por exemplo a notificação é de apenas 10%, como estimado pelos modelos computacionais, então em vez de mais de 700 mil casos de covid, o Brasil já tem mais 7 milhões de casos
Rodrigo Weber do Santos, pesquisador
Abin aprova modelo
A metodologia foi reconhecida pela revista "Chaos, Solitons & Fractals", da editora Elsevier, que publicou um artigo com o estudo. O mesmo grupo já tem um segundo estudo sendo avaliado em outra revista científica internacional, segundo Santos.
As notas técnicas e o artigo chamaram a atenção da Abin, que havia formado um grupo de trabalho interdisciplinar para avaliar diferentes ferramentas de simulação da evolução da pandemia. "Por solicitação, os cientistas da UFJF têm enviado a eles seus relatórios e artigos sobre covid-19", diz o professor.
O resultado da estimativa é parecido com outro estudo feito pela Covid-19 Brasil, encabeçado por pesquisadores de diversas universidades brasileiras. De acordo com essa metodologia, há no país 5.926.258 de infectados.
Para chegar a esse número, o grupo também usou como base a curva epidemiológica da Coreia do Sul. Com base no número de óbitos confirmados em cada faixa etária no Brasil, os pesquisadores usam um modelo matemático para aplicar as taxas de mortalidade registradas no país asiático à pirâmide etária brasileira, chegando a um número estimado de casos.
"São metodologias distintas, mas que apontam para um mesmo cenário de alta subnotificação", pontua o professor Santos.
Assim como Santos, um dos coordenadores da Covid-19 Brasil, o professor de medicina da USP de Ribeirão Preto, Domingos Alves, atribui as mesmas razões para a alta subnotificação brasileira: "O motivo é a baixa testagem por aqui", diz.
Isolamento social deficiente
O modelo computacional também detectou uma política de isolamento deficiente no Brasil, com uma redução de contato em torno de 40% em abril, enquanto a Itália e a Coreia do Sul reduziram 75% e 90%, respectivamente, o contato social no mesmo período.
Esse cenário pode se agravar no Brasil nas próximas semanas, após decisão de estados e municípios de afrouxar a quarentena, embora a pandemia ainda não tenha enfraquecido.
"Essa caracterização da covid-19 nesses diferentes países, cenários e fases da pandemia apoia a importância de políticas de mitigação, como o distanciamento social", reforça o artigo dos pesquisadores da UFJF.
Sete vezes mais casos em centros urbanos
Uma outra pesquisa publicada na semana passada indica que, para cada caso oficial de covid-19, existem sete casos reais na população dos principais centros urbanos brasileiros.
O levantamento, coordenado pelo Centro de Pesquisas Epidemiológicas da UFPel (Universidade Federal de Pelotas), foi realizado em 90 cidades brasileiras.
A pesquisa testou se as pessoas tinham anticorpos para a doença, o que significa que já foram ou estão infectadas pelo novo coronavírus, mesmo que assintomáticas. Já as estatísticas oficiais incluem apenas quem foi testado a partir dos sintomas.
No dia 13 de maio, véspera do início da pesquisa, essas 90 cidades somadas contabilizavam 104.782 casos oficiais. A estimativa do estudo, realizado entre os dias 14 e 21 de maio, no entanto, apontou para 760 mil infectados pelo novo coronavírus nessas cidades.
"Os casos confirmados, que aparecem nas estatísticas oficiais, representam apenas a ponta visível de um iceberg cuja maior parte está submersa", pondera Pedro Hallal, coordenador geral do estudo e reitor da UFPel.
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