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Médicos criticam liberar uso de máscara já e temem que vírus ganhe força

O prefeito do Rio, Eduardo Paes (PSD), indicou que a obrigatoriedade do uso de máscara deve ser liberada este mês na capital fluminense - 13 ago.2021 - Andre Melo Andrade/Immagini/Estadão Conteúdo
O prefeito do Rio, Eduardo Paes (PSD), indicou que a obrigatoriedade do uso de máscara deve ser liberada este mês na capital fluminense Imagem: 13 ago.2021 - Andre Melo Andrade/Immagini/Estadão Conteúdo

Nathan Lopes

Do UOL, em São Paulo

05/10/2021 13h00

Resumo da notícia

  • Prefeito do Rio fala em desobrigação do uso com 65% da população vacinada
  • Médicos recomendam cautela e dizem que ser melhor esperar que se chegue a 80%
  • Outros fatores também precisam ser considerados, como números de mortes e casos
  • Em São Paulo, prefeitura deve esperar que idosos recebam a dose de reforço

A projeção da Prefeitura do Rio de desobrigar o uso de máscaras em ambientes abertos a partir de 15 de outubro é criticada por especialistas da área da saúde ouvidos pelo UOL. A indicação foi feita ontem pelo prefeito carioca, Eduardo Paes (PSD), em mensagem publicada em sua conta no Twitter.

Na cidade de São Paulo, a prefeitura estuda uma data para adotar a mesma medida, mas não crava uma data, embora indique que a partir de novembro a cidade já deva ter toda sua população adulta com esquema vacinal completo (duas doses ou dose única).

Na capital fluminense, segundo dados do site da prefeitura na manhã de hoje, 56,5% da população já está com esquema vacinal completo. Para que a flexibilização aconteça, Paes indicou que a marca precisaria chegar a 65%, o que ele estima que aconteça em meados deste mês.

paes - Reprodução/Twitter - Reprodução/Twitter
Em maio, em um dos piores momentos da pandemia no país, Paes foi flagrado sem máscara em roda de samba no Rio
Imagem: Reprodução/Twitter

"Esse é um vírus que surfa nas oportunidades. E o que a gente tem que fazer é não dar oportunidade", diz Flávio Guimarães da Fonseca, presidente da SBV (Sociedade Brasileira de Virologia) e virologista da UFMG (Universidade Federal de Minais Gerais).

Fonseca salienta que, no país como um todo, não temos metade da população com o esquema completo. Atualmente, 94,2 milhões de pessoas já estão imunizadas, aproximadamente 44% da população.

Mesmo que o Rio atinja 65% em dez dias, ainda seriam necessárias mais duas semanas após a aplicação da dose para que a pessoa tenha a imunização.

São Paulo ainda avalia

Na cidade de São Paulo, o UOL apurou que estudos são feitos sobre a flexibilização do uso da máscara. Atualmente, os parâmetros estimados para se chegar nesse cenário incluem que 100% dos idosos já estejam com dose de reforço e 90% da população adulta com esquema vacinal completo. A gestão de Ricardo Nunes (MDB) tem usado como exemplo o que tem sido feito em Portugal.

"Até final de outubro, seguramente chegaremos a 100% da população com a segunda dose. Até meados de outubro, já teremos dado a dose de reforço a toda a população com mais de 60 anos", disse hoje o secretário municipal de Saúde, Edson Aparecido.

"Hoje nós temos uma média na cidade de 15 óbitos em sete dias, ou seja, algo entorno de dois óbitos por dia. A cidade está muito próximo de, com o controle da pandeia, chagar ao momento de zero obtido, mesmo que isso venha a mudar posteriormente. Tudo isso será analisado para a eventualidade de inclusive não se utilizar a máscara", afirmou Aparecido.

Ao UOL, Aparecido afirmou que o cenário das próximas semanas deverá ser avaliado, com uma decisão a ser tomada sobre a utilização de máscaras entre o final de outubro e o início do próximo mês.

Não é só número de vacinados

Flexibilizar as medidas não farmacológicas é dar chance para o vírus voltar com força, para aumentar novamente os números, que é justamente o que a gente não precisa, não quer. Por isso, sou contra. Acho que esse tipo de flexibilização é muito aguardado, necessário em algum momento, mas não agora
Flávio Guimarães da Fonseca, presidente da SBV

Especialistas consultados pelo UOL dizem acreditar que o ideal seria aguardar que cerca de 80% da população já esteja imunizada para se pensar em liberar a necessidade de máscara, como avalia o presidente da SPI (Sociedade Paulista de Infectologia) e professor da Unesp (Universidade Estadual Paulista) Carlos Magno Fortaleza. "E número de mortes diárias abaixo de cem no país", diz. Atualmente, a média móvel de mortes está por volta de 500.

Médicos lembram que, mesmo a pessoa estando vacinada, ela poderá transmitir o vírus. Por isso, o infectologista Evaldo Stanilslau, do Hospital das Clínicas de São Paulo, também pontua que a taxa de transmissão deve ser considerada para a decisão sobre flexiblizar o uso de máscara. No Brasil, segundo dados do Imperial College, a taxa de transmissão está em tendência de crescimento.

"Se a gente não tiver uma transmissão comunitária baixa, e sustentada de maneira baixa, acho que é um equívoco a gente flexibilizar e liberar do uso de máscara", diz Stanislau, reforçando a necessidade de se fazer "testagem sentinela" para que se possa entender o real cenário da pandemia no país.

"As pessoas estão muito afoitas nesse relaxamento e o preço pode ser alto. Ao contrário, se fizermos tudo como se deve, aí teremos plenas condições."

Exemplos para o Brasil

Os especialistas também reforçam a necessidade de se observar as experiências de outros países. Alguns que flexibilizaram o uso da máscara antes do tempo tiveram que voltar atrás, como se viu em Israel e em parte dos Estados Unidos, por exemplo.

"Diversos estados dos Estados Unidos liberaram do uso de máscaras em maio, quando haviam vacinado um pouco mais da metade da população com as duas doses. É exatamente o mesmo cenário que estamos vivenciando em alguns estados no Brasil", observa Luiz Gustavo de Almeida, microbiologista e membro do Instituto Questão de Ciência.

Ele lembra que, mesmo vacinada, a pessoa ainda pode transmitir o vírus caso seja contaminada. "Portanto, máscaras ajudam a evitar que pessoas ainda não vacinadas sejam infectadas", diz. "Não é hora para pensar em baixar a guarda em nenhum fronte."

Avanço com tranquilidade

Almeida frisa a importância da máscara no caso do Rio também pensando no Carnaval, que Paes já indicou que deverá acontecer sem restrições. "Isso, certamente, atrairá turistas de todo o Brasil. Mas com 80% da cidade do Rio de Janeiro vacinada, já seria possível flexibilizar o uso de máscaras, sempre acompanhando o número de novos casos, internações e óbitos."

Juarez Cunha, presidente da SBIm (Sociedade Brasileira de Imunizações), diz entender que estamos em um momento mais tranquilo da pandemia, se comparado com o primeiro semestre, quando chegamos a ter 4.000 mortes por dia, mas que seria mais seguro esperar termos a maior parte da população imunizada.

Cunha, porém, está preocupado porque já tem observado que parte da população já não respeita o uso de máscara e o distanciamento, promovendo aglomerações. "Acho que a gente precisa avançar mais ainda na vacinação para ter mais tranquilidade."