Topo

Dois anos após início da epidemia, Guiné pode ser declarada livre do ebola

Dionne Searcey

Em Dacar (Senegal)

18/11/2015 06h00

A pior epidemia de ebola da história deu um grande passo para o fim na terça-feira (17), quando a Guiné, o único país onde o vírus persistia, deu início à contagem regressiva oficial para ser declarada livre da doença.

A contagem regressiva teve início após uma menina de três semanas, Nubia Soumah, a última paciente conhecida em tratamento ativo no mundo, apresentou negativo nos exames do vírus por duas vezes consecutivas.

Dezenas de pessoas na Guiné ainda estão sendo monitoradas para ver se desenvolvem os sintomas do vírus. Mas se novos casos não surgirem na Guiné nos próximos 42 dias, o equivalente a dois períodos de incubação para o vírus, o país será declarado oficialmente livre do ebola, quase dois anos após o início da epidemia na região de floresta do país.

Nubia contraiu o vírus de sua mãe, uma vítima do ebola que morreu após dar à luz. Por vários dias, o bebê foi o único paciente em uma instalação de Médicos Sem Fronteiras em Conacri, a capital. Ela será monitorada atentamente na instalação para acompanhamento médico, devido à sua frágil idade.

"Ela pode vir a ser a última paciente desta epidemia", disse Laurence Sailly, um coordenador de emergência para ebola da Médicos Sem Fronteiras na Guiné.

A Guiné vinha tendo dificuldades em conter o vírus enquanto a Libéria e Serra Leoa –ambos com número maior de casos e mortes– eram declarados livres do ebola. A epidemia matou mais de 11.300 pessoas, quase todas nesses três países do Oeste da África.

Na Guiné, a mais recente cadeia de transmissão teve início em Conacri, onde uma criança contraiu o ebola e foi levada de volta à sua aldeia rural para tratamento por um curandeiro tradicional, expondo várias pessoas ao vírus em um pequeno aglomerado de aldeias. Uma família foi atingida de forma particularmente dura, a de Seydouba Soumah. Ele perdeu duas esposas e vários de seus filhos foram infectados. Nubia é sua filha mais nova.

Alguns membros da família Soumah foram levados para o centro de tratamento da Médicos Sem Fronteiras para observação, uma espécie de quarentena. Mas eles não contraíram o ebola e após o término do período de incubação, no final da semana passada, eles receberam alta. A volta deles para casa foi recebida com grande fanfarra, ao serem acompanhados pelo primeiro-ministro Mohamed Said Fofana.

"Nós fizemos uma grande celebração", disse o dr. Boubacar Diallo, o médico da Organização Mundial da Saúde (OMS) encarregado de rastrear os contatos das vítimas.

Fim do vírus será começo de reconstrução

Os próximos dias na Guiné serão estressantes para o país, que aguarda a declaração de livre do ebola para que possa dar início aos reparos dos estragos causados pelo vírus em sua economia e sociedade.

Trabalhadores de ajuda humanitária ainda monitoram qualquer um que esteve em contato com as vítimas do ebola nas aldeias. Uma mulher que fugiu no mês passado após estar em contato com uma paciente ainda não foi encontrada, disse Diallo. A Guiné e outros países ainda correm o risco de novos casos gerados por sobreviventes que ainda são portadores do vírus no sêmen ou nos tecidos do corpo.

Uma enfermeira escocesa ficou gravemente doente no mês passado após ter se recuperado do ebola, que ela contraiu realizando obras de caridade em Serra Leoa há quase um ano. Ela se recuperou de novo e recebeu alta na semana passada de um centro de tratamento especializado em doenças infecciosas em Londres, mas sua saúde ainda está sendo atentamente monitorada.

Representantes da Médicos Sem Fronteiras na Guiné disseram que o caso de Nubia foi um importante marco médico: ela se tornou o único bebê nascido de uma mãe infectada a sobreviver ao ebola que se tem conhecimento. Bebês e crianças que contraíram o ebola durante esta epidemia foram as que se saíram pior entre todas as faixas etárias, segundo a OMS.

Autoridades de saúde de todo o mundo vinham acompanhando o atendimento a Nubia, consultando com frequência os médicos em Conacri.

"Ela quebrou todos os recordes, essa menininha", disse a dra. Margaret Harris, uma porta-voz da OMS. "Ela é realmente algo especial."

Até o momento Nubia passou toda sua vida dentro do centro de tratamento onde nasceu, sendo cuidada apenas por trabalhadores vestindo trajes protetores da cabeça aos pés. Há duas semanas, uma tia, Fatoumata Cisse, foi a primeira familiar autorizada a vê-la no centro de tratamento.

"Você está bem?", balbuciava Cisse de vários metros de distância, isolada por dois conjuntos de barreiras improvisadas para impedir qualquer disseminação da infecção. Nubia dormia durante a visita.