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Azevêdo alerta EUA contra 'paralisia' da OMC

20/02/2018 10h30

Genebra, 20 Fev 2018 (AFP) - O diretor-geral da Organização Mundial do Comércio (OMC), o brasileiro Roberto Azevêdo, advertiu os Estados Unidos contra a "paralisia" do mecanismo internacional de solução de controvérsias, em um momento de escalada das tensões comerciais entre Washington e Pequim.

"O risco de guerra comercial está sempre presente", declarou Azevêdo, em entrevista à AFP, esta semana, em Genebra.

Depois da crise financeira de 2007, o risco de que países adotassem medidas protecionistas de modo unilateral era "muito elevado", mas isso não aconteceu, destacou ele, ressaltando que é necessário "continuar vigilante (...) porque está sempre presente o risco de que medidas unilaterais sejam adotadas, e é sempre um caminho muito perigoso".

Esse alerta surge no momento em que o presidente americano, Donald Trump, é acusado por alguns países - entre eles a China - de seguir pela via do protecionismo e do unilateralismo.

Desde sua posse, há pouco mais de um ano, Trump multiplicou as sanções comerciais contra importações, sobretudo, chinesas.

Com um importante déficit em suas trocas comerciais com Pequim e Seul, os Estados Unidos já impuseram sanções aduaneiras em janeiro deste ano sobre os painéis solares chineses e sobre máquinas de lavar sul-coreanas. Trump também evocou a possibilidade de adotar cotas de importação para o aço e o alumínio chineses.

Diante dessas medidas, a China ameaça recorrer ao Órgão de Solução de Controvérsias (OSC) da OMC.

Essa escalada acontece no momento em que esse mesmo órgão se encontra ameaçado pelos Estados Unidos. Há meses, os EUA bloqueiam a indicação de novos membros para esse organismo, em prejuízo da comunidade internacional, a qual acusa os americanos de fazerem a OMC de refém sem apresentar propostas.

Para Roberto Azevêdo, essa situação não se coloca sem riscos.

"Nós conversamos com eles sobre o bloqueio da nomeação dos membros da corte de apelações (do OSC). Eu falo com eles constantemente sobre esse tema, mas até agora... estamos tão longe de uma solução quanto antes", reconhece.

- Discussão 'franca' com Trump -A negociação dos conflitos comerciais é um "sistema que foi muito eficaz" até o presente, com mais de 500 disputas tratadas e mais de 90% das recomendações adotadas, segundo Azevêdo.

Composto de sete juízes, o órgão de apelação do OSC têm quatro membros hoje. E é imperioso, acrescenta, contar os esses outros três para poder examinar cada caso, ou a organização não tem condições de arbitrar os conflitos comerciais.

Esse "ponto de não retorno", como chamam alguns diplomatas, pode estar próximo. Em 30 de setembro, chega a ao fim o mandato de um dos quatro juízes ainda em atuação. E, em dezembro de 2019, é a vez do mandato de outros dois juízes.

"Se nada for feito e se continuarmos nesse caminho, haverá, claramente, uma paralisia do sistema", insistiu Azevêdo, afirmando que "não é para esperar que isso aconteça".

"Eu acho que os membros (da OMC) pensam em soluções alternativas, no que pode ser feito, e eu espero que haja uma espécie de mecanismo que vai ser adotado para nos permitir continuar nosso trabalho", continuou.

Rejeitando o multilateralismo e preferindo os acordos bilaterais, desde seu início, o governo Trump se retirou do acordo de livre-comércio na Ásia-Pacífico, a Parceria Transpacífico (TPP, na sigla em inglês), e volta e meia faz críticas ao funcionamento e à legitimidade da OMC.

Sobre esse tema, Azevêdo também parece otimista, mesmo que Washington ainda não tenha nomeado seu novo embaixador para a OMC.

"Não há nada nas minhas conversas com os Estados Unidos que indique que haja uma possibilidade de os Estados Unidos deixarem a OMC", afirmou.

"Eles têm preocupações sobre vários temas sobre o que acontece aqui, mas eles também me disseram que (...) a organização é muito importante (...) e que eles gostariam de reformas", completou o diretor-geral, garantindo que "a OMC está aberta para esse tipo de discussão".

Azevêdo disse ainda que está pronto para se reunir com Trump para "ter uma conversa franca" com o presidente americano.