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Suprema Corte britânica considera 'ilegal' suspensão do Parlamento

24/09/2019 11h54

Londres, 24 Set 2019 (AFP) - A Suprema Corte britânica considerou, nesta terça-feira (24), como "ilegal" a decisão do primeiro-ministro Boris Johnson de suspender o Parlamento e ordenou a retomada de seus trabalhos "assim que possível".

Johnson, que está em Nova York para a Assembleia Geral da ONU, afirmou estar "profundamente em desacordo com a decisão dos juízes".

"Não há dúvidas de que há muita gente que quer frustrar o Brexit", denunciou. Contudo, "este é obviamente um veredicto que vamos respeitar", assegurou.

Os 11 juízes consideraram de forma unânime que a decisão de Boris Johnson de pedir à rainha Elizabeth II a suspensão do Parlamento por cinco semanas, até 14 de outubro, faltando duas semanas para o Brexit, é "ilegal, nula e sem efeito".

A decisão "foi ilegal, porque teve o efeito de frustrar, ou impedir, a capacidade do Parlamento de desempenhar suas funções constitucionais sem justificativa razoável", afirmou a presidente da Suprema Corte, Brenda Hale.

Logo depois, o presidente da Câmara dos Comuns, John Bercow, disse que o Parlamento britânico vai retomar seus trabalhos nesta quarta-feira.

"Eu instruí as autoridades a tomar as medidas necessárias para garantir que a Câmara dos Comuns se reúna amanhã", disse Bercow aos jornalistas diante do Parlamento.

Bercow já havia denunciado a medida de Boris Johnson como um "ultraje constitucional".

"Precisamos responsabilizar o governo por suas ações. Boris Johnson deveria renunciar depois de agir contra a lei", tuitou o deputado nacionalista escocês Ian Blackford.

Do congresso anual do Partido Trabalhista em Brighton, o líder da oposição Jeremy Corbyn também exigiu a renúncia do primeiro-ministro.

"Corbyn está dizendo coisas ilógicas", disse Johnson, considerado que "o óbvio agora é organizar eleições".

Antes da suspensão parlamentar, Boris Johnson sofreu uma rebelião entre os deputados conservadores, perdeu a maioria absoluta no Parlamento, viu ser aprovada uma lei que o forçaria a solicitar um novo adiamento do Brexit e teve negada sua proposta de eleições antecipadas.

- Importante precedente judicial -As duas câmaras do Parlamento britânico tiveram seus trabalhos suspensos por cinco semanas, entre 10 de setembro e 14 de outubro.

Johnson justificou que o recesso era necessário para preparar e apresentar seu programa de políticas nacionais, uma prática comum quando há uma mudança de governo, mas que geralmente dura apenas dez dias.

Deputados e ativistas pró-europeus o acusaram de ter dado esse passo para amordaçar seus críticos e levar o Reino Unido a uma saída sem acordo da União Europeia em 31 de outubro.

A tradicional cerimônia de recesso foi boicotada pela grande maioria dos Lordes em protesto, enquanto alguns deputados gritaram "vergonha!".

A suspensão provocou uma onda de manifestações e várias ações judiciais que resultaram em recursos perante a Suprema Corte, depois que um tribunal de Edimburgo e outro de Londres emitiram sentenças contraditórias.

Segundo especialistas, o fato de a Suprema Corte ter considerado que o debate não pertence apenas à esfera política cria um precedente importante.

Não se tratava apenas de saber se a suspensão era legal, ou ilegal, mas também de determinar "se a Suprema Corte britânica se tornaria um árbitro, uma espécie de Tribunal Constitucional em um país sem constituição escrita", explica Tony Travers, cientista político da London School of Economics (LSE).

- "Silenciar o Parlamento" -

Dada a importância da questão, a Suprema Corte colocou 11 de seus 12 magistrados no caso, o máximo possível, para evitar empate.

Os 11 magistrados ouviram os argumentos dos autores e advogados do governo na semana passada por três dias.

Uma das principais queixas foi interposta pela conhecida empresária e ativista anti-Brexit Gina Miller, que em 2017 venceu uma importante batalha legal sobre o Brexit contra o governo de Theresa May.

Seu advogado, David Pannick, alegou que a duração da suspensão mostrava que o objetivo de Johnson era "silenciar o Parlamento".

Já o Executivo defendeu que não cabia à Justiça se pronunciar sobre a suspensão parlamentar, uma vez que a decisão do primeiro-ministro era "fundamentalmente de natureza política" e pertencia "ao campo do julgamento político, não das normas legais".

No início das audiências, a juíza Brenda Hale deixou claro que seus colegas analisariam apenas a legalidade da suspensão parlamentar, e sua decisão não teria efeito no calendário do Brexit.

"Não estamos interessados em saber quando, como, ou em que condições o Reino Unido deixará a União Europeia", afirmou.

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