Trump sai do hospital para saudar simpatizantes, retorna e recebe críticas
Washington, 5 Out 2020 (AFP) - O presidente americano, Donald Trump, saudou de carro simpatizantes reunidos do lado de fora do hospital militar onde faz tratamento para a covid-19 no domingo (4), minutos depois de anunciar no Twitter uma "visita surpresa" a seus apoiadores, um dia antes de um possível retorno para a Casa Branca.
A saída foi considerada muito arriscada para os demais ocupantes do veículo, de acordo com especialistas médicos.
Visto usando máscara preta e acenando para a multidão, Trump passou rapidamente com seu comboio pelos simpatizantes antes de retornar ao hospital militar Walter Reed, perto de Washington.
Mas a iniciativa provocou muitas críticas, em especial pelos riscos para os agentes do Serviço Secreto que acompanharam o presidente.
"Todos no veículo durante esta saída presidencial completamente desnecessária devem ficar em quarentena durante 14 dias", disse James Phillips, do Departamento de Medicina da Universidade George Washington.
"Podem ficar doentes. Podem morrer. Pelo teatro político. Mandados por Trump para colocar suas vidas em perigos por este teatro político. Isto é uma loucura", completou.
Zeke Emanuel, presidente do Departamento de Ética Médica e Política de Saúde da Universidade da Pensilvânia, tuitou: "Fazer com que os agentes do Serviço Secreto dirijam com um paciente de covid-19, ainda mais com as janelas fechadas, os expõe de modo desnecessário a um risco de infecção. E para quê? Um truque publicitário".
O porta-voz da presidência afirmou que as precauções "apropriadas" foram adotadas para proteger Trump e a equipe, incluindo os agentes de segurança.
"A saída foi validada pela equipe médico como segura", disse.
- "Escola da vida" -"Vamos fazer uma pequena surpresa a alguns dos grandes patriotas que temos na rua", disse Trump em um vídeo postado em sua conta no Twitter momentos antes de sair do hospital.
"Estou prestes a fazer uma pequena visita surpresa", acrescentou.
No vídeo, Trump também disse ter "aprendido muito sobre a covid", ao "realmente ir à escola", em alusão à sua hospitalização para tratar a doença.
"Esta é a escola real. Não é uma escola do tipo 'vamos ler livros', e eu aprendi, entendi, e isso é muito interessante", acrescentou.
A decisão de deixar o hospital foi imediatamente criticada pela comunidade médica, que manifestou perplexidade de que o presidente não estivesse em isolamento ao se tratar de uma infecção altamente contagiosa.
"O SUV (carro utilitário) presidencial não é apenas à prova de balas, mas selado hermeticamente contra ataques químicos", disse James Phillips, chefe de medicina de calamidade da Universidade George Washington.
"O risco de transmissão da covid-19 dentro (do veículo) é tão alto quanto fora dos procedimentos médicos. A irresponsabilidade é impressionante. Meus pensamentos estão com o Serviço Secreto", acrescentou.
O episódio ocorreu horas depois de um boletim da equipe médica do presidente Trump indicar que sua saúde "continua a melhorar" e ele poderia retornar já na manhã de segunda-feira à Casa Branca, dotada de equipamento e médicos com a expertise necessária para acompanhar seu tratamento.
"O presidente continua a melhorar", disse o médico da Casa Branca, Sean Conley. "Como acontece com qualquer doença, há altos e baixos frequentes em seu curso".
O presidente foi levado de helicóptero para o hospital militar Walter Reed, nos arredores da capital americana, na sexta-feira, após uma "rápida progressão" da doença, com a saturação de oxigênio no sangue atingindo níveis preocupantemente baixos, disse Conley.
Especialistas sanitários reclamaram que a mensagem do governo, e particularmente da equipe médica de Trump, causou confusão generalizada.
Conley admitiu no domingo que em um boletim divulgado na véspera ele omitiu do público o fato de que o presidente havia recebido oxigênio suplementar, na tentativa de refletir uma "atitude otimista".
Para aumentar a confusão, Conley fez um relato suavizado sobre o progresso de Trump, antes de o chefe de gabinete da Casa Branca, Mark Meadows, dizer a jornalistas que a condição do presidente era "muito preocupante" e que não havia "ainda em um caminho claro para sua recuperação total".
E embora as atualizações médicas tivessem sido divulgadas regularmente, permaneciam as dúvidas sobre o tratamento dado ao presidente e suas implicações, a gravidade da febre que o acometeu, quando ele testou negativo pela última vez e se há algum dano pulmonar.
"Não se começa (um tratamento) com dexametasona, remdesivir e (dá) um coquetel de anticorpos experimental ao presidente com 'quedas' baixas de oxigênio a não ser que haja pneumonia (provocada por) covid", tuitou Vin Gupta, do Instituto de Métricas e Avaliação de Saúde.
"O que seu exame de tórax mostra? O povo americano merece receber informações básicas sobre seu presidente", acrescentou.
- 'Contando piadas' -Na reta final de uma dura campanha eleitoral contra o democrata Joe Biden, Trump e seus conselheiros fizeram o que podiam para projetar uma imagem de normalidade.
O presidente voltou a dar telefonemas e tuitar de dentro do hospital.
Seu vice-chefe de campanha, Jason Miller, disse à emissora ABC no domingo ter conversado com Trump por meia hora no sábado e que o presidente estava "contando piadas".
Combinada à frustração sobre a mensagem médica, tem aumentando a polêmica sobre a possibilidade de Trump ter exposto vários outros à covid-19 depois que uma assessora próxima testou positivo para a doença.
Uma retrospectiva feita por seus conselheiros e médicos sugerem que ele encontrou mais de 30 doadores na quinta-feira em Bedminster, Nova Jersey, mesmo depois de saber que a assessora Hope Hicks estava com covid-19 - e horas antes de anunciar que ele próprio havia testado positivo.
Havia mais de 200 pessoas no evento de arrecadação de fundos e uma operação de rastreamento de contatos foi adotada em Nova Jersey em busca de milhares de pessoas que potencialmente podem ter sido expostas.
Tudo isto acontece em uma semana em que uma pesquisa do Wall Street Journal e da emissora NBC - feita dois dias depois do virulento debate presidencial com Biden, mas antes da notícia de contágio de Trump - situou o democrata em uma vantagem significativa de 53% contra 39% entre os eleitores registrados.
Trump teria repelido eleitores em parte por caçoar de Biden por usar máscara durante o debate de terça. Membros de sua família também violaram as regras e apareceram sem máscaras na plateia.
Assim como Trump e Hicks, muitos membros da Casa Branca e pelo menos três senadores republicanos contraíram a covid-19, assim como a primeira-dama Melania Trump, que não apresentou sintomas graves da doença.
Especialistas em saúde pública expressaram alerta sobre o "foco da Casa Branca", que pode estar relacionado com a comemoração em 26 de setembro no Jardim Rosado pela indicação da juíza conservadora Amy Coney Barrett para a Suprema Corte.
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