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Ortega rumo a uma reeleição garantida, com opositores na prisão

04/11/2021 10h24

Manágua, 4 Nov 2021 (AFP) - Nenhuma surpresa. A Nicarágua celebrará no próximo domingo (7) eleições em que o presidente Daniel Ortega, com seus rivais presos, confirmará o quarto mandato consecutivo após 14 anos no poder, sob o risco de não ser reconhecido por parte da da comunidade internacional.

Três anos e meio depois dos protestos que exigiam sua renúncia e cuja repressão deixou mais de 300 mortos, Ortega, que completará 76 anos na próxima semana, tem garantido outro mandato de cinco anos com a esposa Rosario Murillo (70), a quem chama de "copresidenta", à frente da ex-guerrilheira Frente Sandinista de Libertação Nacional (FSLN, esquerda).

Nas ruas ninguém duvida. Ortega enfrenta cinco candidatos desconhecidos e acusados de colaborar com o governo, após a detenção de sete pré-candidatos à presidência e da cassação de três partidos opositores em uma ofensiva que, desde maio, levou 39 políticos, empresários, agricultores, estudantes e jornalistas para a prisão.

A ação do governo provocou temores neste empobrecido país da América Central, de 6,5 milhões de habitantes.

Quase 4,3 milhões de nicaraguenses estão registrados para votar - também escolherão 90 deputados. Uma pesquisa do instituto Cid-Gallup mostra que 65% votariam em um opositor e 19% em Ortega, mas o instituto pró-governo M&R afirma que 70% votarão na FSLN e 11,2% nos candidatos desconhecidos.

Dos aspirantes de oposição, a favorita, de acordo com as pesquisas, era Cristiana Chamorro, filha da ex-presidente Violeta Barrios (1990-1997) e que está em prisão domiciliar.

Os detidos são acusados de atentar contra a soberania e promover sanções contra a Nicarágua, "traição à pátria" ou "lavagem de dinheiro", com base em leis aprovadas em 2020 pelo Congresso, sob controle governista, assim como o Poder Judiciário e as autoridades eleitorais.

Mais de 100.000 nicaraguenses partiram para o exílio, sobretudo Estados Unidos e Costa Rica, durante a crise política. Para Ortega, os mais de 150 opositores detidos desde 2018 não são políticos, e sim "criminosos" e "golpistas" patrocinados por Washington.

- Arsenal de sanções -A onda de detenções provocou tensão nas relações da Nicarágua com Estados Unidos e União Europeia - que adotaram sanções contra parentes e pessoas próximas a Ortega -, assim como com governos aliados, incluindo México e Argentina.

O Congresso americano aprovou na quarta-feira a lei "Renascer", um arsenal de medidas para aumentar a pressão contra Ortega e Murillo, acusados de corrupção, violação dos direitos humanos e de não permitir eleições "livres".

O chefe da diplomacia europeia, Josep Borrell, afirmou que eleições serão "ilegítimas". A Comissão Interamericana de Direitos Humanos (CIDH) indicou que buscam apenas "a perpetuação no poder de forma indefinida".

Ortega, que tem como principais aliados Venezuela, Cuba e Rússia, acusa Washington e a UE de "interferência".

A analista de questões de governabilidade Elvira Cuadra, no exílio, disse à AFP que o isolamento afetará investimentos e financiamento internacional,m com o risco de um agravamento a questão social e aumento da migração.

Ortega e Murillo afirmam que com a "paz" chegará a prosperidade. O governo projeta um crescimento econômico de 6% este ano e pretende convocar um diálogo após as eleições.

"Este diálogo é apenas parte da estratégia para buscar a legitimidade que não conseguiram nas urnas", afirmou à AFP o analista Eliseo Núñez.

O cientista político costa-riquenho Kevin Casas opina que, "assim como na Venezuela, dificilmente a comunidade internacional poderá fazer algo para mudar a autocracia" que o líder da FSLN está forjando desde que voltou ao poder em 2007, com reformas que instauraram a reeleição sem limites.

- "Estado policial" -O ex-guerrilheiro já havia governado o país nos anos 1980, depois de ajudar a derrubar o ditador Anastasio Somoza. Seus opositores o acusam ter se transformado em um ditador como Somoza.

Enquanto a FSLN multiplica a entrega de casas e rodovias, a oposição no exílio, sem liderança e fragmentada, pede aos nicaraguenses "que fiquem em casa".

Afetados pela pandemia, o custo de vida, o desemprego e a crise política, na Nicarágua a população demonstra apatia eleitoral.

A presidenta do Centro Nicaraguense dos Direitos Humanos (Cenidh), Vilma Núñez, considera que no país há um Estado policial "para ter o controle social da população, reprimir e esmagar opositores".

Dezenas de jornalistas nicaraguenses trabalham na Costa Rica e vários meios de comunicação internacionais denunciaram que tiveram entrada negada no país.

Para a eleição de domingo, com mais de 30.000 policiais e militares nas ruas, o governo não aceitou observadores internacionais, apenas "convidados".

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