A trajetória de Zelensky: de comediante na TV à Presidência da Ucrânia
Durante muito tempo, Volodimir Zelensky foi acompanhado pela imagem de ex-comediante de televisão eleito presidente da Ucrânia quase por acaso. Com a crise, e a agora guerra com a Rússia, adotou uma postura firme e serena, sem entrar em pânico.
Na madrugada de hoje, foi em uma mensagem de vídeo no Facebook que ele pediu aos concidadãos que não entrassem em pânico e estabeleceu a lei marcial, enquanto a Rússia realizava ataques contra infraestrutura militar e guardas de fronteira.
"Não entrem em pânico: estamos prontos para tudo. Vamos vencer", disse.
Zelensky, de 44 anos, está no meio da que pode ser a pior crise desde o fim da Guerra Fria, há mais de três décadas.
Primeiro, ele viu a Rússia cercar a Ucrânia com mais de 150 mil soldados e o governo dos Estados Unidos insistir nos alertas de uma guerra "iminente", que poderia começar a qualquer dia.
Ele, então, viu como a Rússia reconheceu a independência de duas regiões separatistas no leste da Ucrânia, Donetsk e Lugansk.
E, hoje, a Rússia lançou um ataque em grande escala, com explosões ouvidas em todo o país nas primeiras horas da manhã, depois que o presidente russo, Vladimir Putin, confirmou uma "operação militar".
Zelensky rapidamente aplicou a lei marcial e apelou aos aliados ocidentais, pedindo unidade europeia depois de falar com o presidente dos Estados Unidos, Joe Biden, e o presidente francês, Emmanuel Macron.
Mais tarde, anunciou que a Ucrânia estava rompendo relações com a Rússia.
Em 2019, Zelensky organizou a campanha presidencial como uma piada. Ele se tornou famoso ao interpretar na televisão um professor grosseiro que vira presidente depois que um aluno grava e divulga na internet o discurso revoltado dele contra a corrupção.
A comédia exibida em horário vespertino virou um grande sucesso em um país abalado.
A revolução pró-Ocidente de 2014 derrubou o presidente apoiado pelo Kremlin e provocou a chegada de novos governantes, que precisaram lidar com um crescente conflito na região leste e uma economia à beira do colapso.
Os ucranianos viram o presidente da comédia fazendo piadas grosseiras com a esposa ou pedalando para o trabalho com uma cara assustada de pânico. O personagem captou a empolgação do momento e proporcionou a Zelensky uma pequena fortuna.
Depois, ele derrotou o então presidente Petro Poroshenko, abalado por diversas crises, com mais 70% dos votos.
Alguns cidadãos se prepararam para o pior. Os críticos o compararam a outras celebridades que entraram para a política, como o italiano Silvio Berlusconi ou o americano Donald Trump.
A decisão inicial de incluir membros da produtora de televisão dele na própria equipe de governo também não ajudou a construir confiança.
As primeiras aparições de Zelensky com outros líderes mundiais também pareciam forçadas, pouco naturais.
"Acredito que nossos aliados internacionais tiveram problemas para lidar com ele. Não está no mesmo nível", disse a analista política ucraniana Mykola Davydyuk.
"Eles se movimentam em níveis muito elevados que ele não consegue alcançar e não consegue entender", acrescentou.
Mas alguns diplomatas ocidentais parecem ter sucumbido ao charme dele. "Ele não se saiu muito mal, para ser honesto", disse um deles.
"Ele tem um trabalho impossível. Está preso entre a pressão dos russos e americanos. Ele mostrou compostura", disse a fonte.
Momento de definição
A disputa com a Rússia pelo desejo ucraniano de entrar para a Otan (Organização do Tratato Atlântico Norte) - uma aspiração escrita na Constituição local, mas muito improvável nas próximas décadas - pode definir a presidência de Zelensky para os próximos anos.
Ele chegou ao poder tentando abrir linhas de comunicação com Vladimir Putin para resolver o violento conflito separatista na região de Donbas, que provocou 14 mil mortes.
Os dois participaram de uma reunião em Paris poucos meses depois da eleição de Zelensky, que o presidente russo descreveu como um "passo importante".
Mas Zelenski teve um roteiro diferente em sua aparição posterior. "Meus interlocutores disseram que é um resultado muito bom para um primeiro encontro. Mas vou ser honesto, foi muito pouco", disse.
As relações entre os dois pioraram desde então.
Putin acusou o governo Zelensky de "discriminar" os habitantes de língua russa e de renegar as promessas de solucionar o conflito no leste do país.
A proposta de Zelensky no mês passado de uma reunião de cúpula com ele, Putin e o presidente americano, Joe Biden, não teve resposta de Moscou.
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