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Irã nega vínculo com agressor de Salman Rushdie e culpa o próprio escritor pelo ataque que sofreu

O escritor Salman Rushdie em evento realizado na Filadélfia, em dezembro de 2019 - Gilbert Carrasquillo/Getty Images
O escritor Salman Rushdie em evento realizado na Filadélfia, em dezembro de 2019 Imagem: Gilbert Carrasquillo/Getty Images

15/08/2022 07h46Atualizada em 15/08/2022 08h22

Após dias de silêncio, o governo do Irã negou hoje "categoricamente" qualquer vínculo com o agressor que esfaqueou na sexta-feira, nos Estados Unidos, o escritor britânico Salman Rushdie, autor do livro "Os Versos Satânicos", 33 anos depois da fatwa do aiatolá Ruhollah Khomeini que condenou o autor à morte.

"Negamos categoricamente qualquer relação entre o agressor e o Irã. E ninguém tem o direito de acusar a República Islâmica", afirmou Naser Kanani, porta-voz do ministério das Relações Exteriores.

Esta foi a primeira reação oficial de Teerã ao ataque contra o autor de 75 anos, ocorrida no anfiteatro de um centro cultural em Chautauqua, no estado de Nova York.

"Neste ataque, não consideramos ninguém além de Salman Rushdie e seus apoiadores dignos de culpa e até de condenação", disse Kanani durante sua entrevista coletiva semanal em Teerã.

"Ao insultar os temas sagrados do Islã e ultrapassar as linhas vermelhas de mais de 1,5 bilhão de muçulmanos e todos os seguidores das religiões divinas, Salman Rushdie se expôs à ira e à raiva das pessoas", acrescentou.

Hospitalizado com ferimentos graves após o ataque, o escritor britânico está melhorando, segundo a família. Ele não precisa mais da ajuda de aparelhos para respirar e iniciou a recuperação, informou seu agente literário Andrew Wylie.

"Revolta de milhões"

Salman Rushdie, que nasceu em 1947 na Índia em uma família de intelectuais muçulmanos não praticantes, incendiou parte do mundo muçulmano com a publicação em 1988 de "Os Versos Satânicos", livro considerado uma blasfêmia pelos mais rigorosos, que consideraram que a obra insultava o Alcorão e o profeta Maomé.

O fundador da República Islâmica emitiu em 1989 uma fatwa que pedia a morte de Rushdie, que viveu durante anos com proteção policial.

A fatwa contra o escritor nunca foi retirada e vários tradutores de sua obra foram alvos de ataques, incluindo o esfaqueamento que matou seu tradutor japonês em 1991.

"A ira mostrada no momento (...) não se limitou ao Irã e à República Islâmica. Milhões de pessoas em países árabes, muçulmanos e não muçulmanas reagiram com revolta ao trabalho de Salman Rushdie", afirmou o porta-voz da diplomacia iraniana.

Kanani considerou "completamente contraditório condenar a ação do agressor e absolver a ação do que insulta os temas sagrados e islâmicos ao mesmo tempo".

O agressor, Hadi Matar, é um jovem americano de origem libanesa de 24 anos, que foi acusado de "tentativa de assassinato e agressão". Ele se declarou "inocente" das acusações.

O secretário de Estado americano, Antony Blinken, disse no domingo que a imprensa estatal iraniana estava "celebrando" o ataque ao intelectual.

"É desprezível", afirmou em um comunicado.

O jornal ultraconservador iraniano Kayhan elogiou Matar ao ressaltar "este homem corajoso e consciente do dever que atacou o apóstata e vicioso Salman Rushdie".

O Javan, outro jornal ultraconservador, escreveu no domingo que este é um complô dos Estados Unidos com a "provável" intenção de "propagar a islamofobia no mundo".

No Irã o tema é delicado. Várias pessoas entrevistadas pela AFP nos últimos dias em Teerã se recusaram a comentar sobre o ataque a Salman Rushdie, enquanto outros celebraram a agressão.