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Etiópia vive profunda crise após dois anos de guerra

03/11/2022 11h01

Dois anos após o início da guerra no norte da Etiópia entre as forças federais e os rebeldes, o país continua em profunda crise, com sua economia em ruínas e um desastre humanitário assolando a região do Tigré.

- Balanço humano desconhecido -

Uma fonte militar entrevistada pela AFP afirmou que é impossível determinar um número preciso de combatentes na frente do Tigré. 

Dois países, Etiópia e Eritreia, enviaram seus exércitos para a região, reforçados por forças e milícias das regiões de Amhara e Afar. 

Por outro lado, os muitos combatentes do Tigré têm meios - especialmente equipamentos pesados - "que os tornam mais como um exército convencional do que uma força de guerrilha", diz Benjamin Petrini, pesquisador do Instituto Internacional de Estudos Estratégicos (IISS), em Washington. 

Eles têm o conhecimento do terreno e experiência militar dos 27 anos em que o partido da elite do Tigré, a Frente de Libertação do Povo do Tigré (TPLF), controlou o aparato político e de segurança em Adis Abeba.

Patrick Ferras, doutor em geopolítica e ex-oficial de inteligência, estima que centenas de milhares de soldados e combatentes estejam na linha de frente. O custo humano deste conflito é desconhecido.

Além das perdas em combate - que não são divulgadas pelos beligerantes -, há inúmeras vítimas civis, além de altas taxas de mortalidade por fome e falta de assistência médica na região, que está isolada há cerca de 18 meses.

- Esperança de paz prudente -

Após dez dias de reuniões em Pretória, sob mediação da União Africana (UA), o governo e os rebeldes de Tigré assinaram na quarta-feira um "Acordo para uma paz duradoura e o fim das hostilidades".

O acordo não foi publicado, mas ambas as partes resumiram em comunicado os seus principais compromissos, principalmente um cessar-fogo imediato, que é impossível saber se será cumprido.

Os observadores continuam cautelosos devido à longa lista de questões pendentes e às modalidades pouco claras de implementação dos compromissos. 

"O acordo é um desenvolvimento positivo", mas contém "muitas incógnitas", estima Benjamin Petrini.

- Divisões -

O primeiro-ministro Abiy Ahmed  recebeu o Prêmio Nobel da Paz em 2019 pelo acordo assinado com Asmara para encerrar 20 anos de guerra entre a Etiópia e a Eritreia.

Uma guerra que começou quando a TPLF governava a Etiópia. Desde então, o partido é inimigo declarado do presidente da Eritreia, Isaias Afeworki. 

Ao chegar ao poder, Abiy afirmou buscar a unidade da Etiópia, um mosaico de mais de 80 comunidades étnico-linguísticas. 

Quatro anos depois, ele é o chefe de guerra de um país dividido, muito além do Tigré. Suas promessas de abertura suscitaram reivindicações sufocadas sob sucessivos regimes: problemas identitários, rivalidades comunitárias e disputas por terras. 

A guerra no Tigré mascara múltiplos conflitos localizados, particularmente na região de Oromia, a maior e mais populosa. 

A ONG Acled, que recolhe dados de zonas de conflito, destacou recentemente "o aumento dos níveis de violência em muitas áreas da Etiópia", em particular "insurreições nas regiões de Oromia, Benshangul Gumuz e Gambela".

- Situação econômica desastrosa -

Ahmed prometeu modernizar a economia estatal da Etiópia, uma ambição que não foi cumprida. O crescimento sustentado de cerca de 9,7% entre 2010 e 2018 - então um dos mais altos do mundo - caiu para cerca de 6% em 2020 e 2021 e deverá atingir apenas 3,8% em 2022, segundo o FMI. 

A inflação, que se situou numa média de 13,5% entre 2010 e 2018, disparou para cerca de 33,6% em 2022, impulsionada pelos preços dos alimentos. 

"Isso se deve em grande parte aos contratempos na agricultura etíope, que recentemente sofreu com uma praga de gafanhotos, inundações e secas, diz um diplomata, que alerta que o impacto total da guerra na Ucrânia ainda não foi sentido.

A Etiópia é um grande importador e está vendo suas reservas estrangeiras se esgotarem drasticamente para o equivalente a apenas três semanas de compras estrangeiras, estimou recentemente o FMI.

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© Agence France-Presse