Judiciário quadruplica despesas com pessoal
O Judiciário quadruplicou o gasto com pessoal em pouco mais de duas décadas, em termos reais, já descontada a variação da inflação. Comparado com Executivo e Legislativo, foi o Poder que mais expandiu as despesas com a folha de pagamento de 1995 a 2017, último ano com dados consolidados.
Especialistas em administração pública ouvidos pelo jornal "O Estado de S. Paulo" acreditam que essa tendência deve se manter, já que o presidente Michel Temer sancionou na semana passada o reajuste de 16,38% para o Judiciário e o Ministério Público.
Em 20 anos, o país e a demanda por serviços cresceram, e mais servidores foram contratados --parte deles para ocupar as vagas dos que se aposentaram. No caso do Judiciário, contudo, houve um descompasso entre o crescimento do número de funcionários e o dos gastos com pessoal. Em 2015, em comparação com 1995, a despesa com a folha salarial era 120% maior do que seria caso tivesse apenas acompanhado o aumento no número de servidores.
A comparação se dá em termos reais, ou seja, os servidores tiveram ganhos acima da inflação no período. Não foi possível fazer os cálculos em relação a 2017, porque o Boletim Estatístico Pessoal do Ministério do Planejamento, que detalhava o número de servidores dos três Poderes, deixou de ser publicado.
O Ministério Público da União, que não tem status de Poder, apresenta a relação mais estreita entre a expansão de pessoal e o crescimento dos gastos com folha de pagamento. No final de 2015, gastava 28% a mais do que se somente bancasse as novas contratações. Porém, no histórico da evolução de gastos com pessoal, o MP da União registrou aumento de despesas maior até do que o Judiciário: mais de 347%, em termos reais, de 1995 a 2017.
Estrutura maior e pressão
Na avaliação de estudiosos da administração pública, há dois motivos principais para explicar a maior expansão dos gastos do Judiciário: o crescimento da estrutura do Poder e a alta capacidade de pressão dos magistrados. O reajuste no contracheque dos ministros do Supremo Tribunal Federal (STF) foi negociado diretamente pelo presidente da Corte, Dias Toffoli.
"Essas (categorias, Judiciário e MP) têm poder de pressão porque estão próximas à tomada de decisão", disse o professor da FGV Sérgio Luiz Moraes Pinto. Segundo ele, historicamente, os funcionários do Judiciário e do Ministério Público da União já recebem salários mais altos.
Conforme a edição mais recente da publicação Justiça em Números, do Conselho Nacional de Justiça (CNJ), com dados de 2016, a despesa média do Judiciário com magistrados é de R$ 48,5 mil, e com servidores, de R$ 15,2 mil. Enquanto isso, no Executivo, a remuneração média mensal é de R$ 11,2 mil para ativos e R$ 9 mil para inativos, segundo o documento elaborado pelo Ministério do Planejamento para o governo de transição do presidente eleito, Jair Bolsonaro.
O documento do Planejamento atribui ainda o tamanho da despesa da União com pessoal ao que classifica como elevados rendimentos de servidores federais. "Os altos níveis de gastos são impulsionados pelos altos salários dos servidores públicos, e não pelo número excessivo de servidores. Isso se verifica principalmente na esfera federal, onde os salários são significativamente mais altos que aqueles pagos a servidores dos governos subnacionais, ou a trabalhadores em funções semelhantes no setor privado."
Gil Castello Branco, da ONG Contas Abertas, vê dois problemas nesse cenário. O primeiro é a disparidade entre salários da União. "Deveria haver uma harmonia maior entre os Poderes." O segundo é a indexação dos salários ao teto constitucional.
"O problema não é 11 ministros da Corte Suprema receberem R$ 40 mil, o problema são as indexações", disse, citando como exemplo o fato de um policial federal poder alcançar a mesma remuneração que recebem os integrantes da Corte.
Aumento da estrutura
Entidades representativas de juízes e procuradores federais atribuem a ampliação das despesas com pessoal nos últimos 20 anos a uma maior estruturação das instituições que, diferentemente do Executivo, eram bem menores.
Segundo o presidente da Associação de Juízes Federais do Brasil (Ajufe), Fernando Mendes, no período da redemocratização havia apenas cerca de 50 juízes federais no país. Hoje, conforme Mendes, são mais de 2.000 espalhados por capitais e pelo interior do país.
"Se a Justiça for vista como custo, realmente teve um aumento. Mas o aumento da estrutura também trouxe um lado positivo na arrecadação", disse.
A máquina pública cresceu e, no caso do Judiciário e do Ministério Público da União, se estruturou melhor nas últimas décadas. Até 1995, haviam sido implantadas 23 unidades do MP Federal em municípios e 33 nas capitais. O número saltou para 221 municípios após a sanção de legislação de 1993 que definiu a organização, as atribuições e o estatuto do Ministério Público da União.
"A instituição passou por um grande processo de interiorização, com a construção e instalação de procuradorias para atender a municípios em todo país", diz nota da Procuradoria-Geral da República.
Em duas décadas, o número de funcionários do MP da União aumentou 217%. Foi, de longe, o setor que mais cresceu proporcionalmente. O Judiciário, que fica na segunda colocação, aparece bem abaixo, com expansão de 67%.
Para José Robalinho, presidente da Associação Nacional de Procuradores da República (ANPR), há um número maior de carreiras qualificadas no MPU e no Judiciário. "
O Executivo é muito maior, você mistura as carreiras de elite com nível médio, aí a média é menor", disse. "Tenho certeza que, se você olhar as carreiras-chave deles, Tesouro, Receita, AGU, e falo isso com tranquilidade, tenho certeza que tiveram reajustes maiores que a magistratura e o MP."
As informações são do jornal "O Estado de S.Paulo".
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