Topo

Esse conteúdo é antigo

Desvios na merenda: 'Caráter competitivo da licitação é letra morta', diz juiz

Polícia investiga se houve fraudes no fornecimento de merenda escolar entre 2013 e 2017 - Raimundo Pacco/Folhapress
Polícia investiga se houve fraudes no fornecimento de merenda escolar entre 2013 e 2017 Imagem: Raimundo Pacco/Folhapress

Paulo Roberto Netto e Fausto Macedo

26/11/2019 17h12

O juiz Augusto Martinez Perez, da 4ª Vara Federal de Ribeirão Preto (SP), afirmou não ter dúvidas sobre a participação de servidores públicos — entre prefeitos, secretários municipais e vereadores — em um amplo esquema de fraude em licitações e cartelização nos contratos de merendas de pelo menos cinquenta municípios paulistas. Por ordem do magistrado, a Polícia Federal foi às ruas para cumprir 27 mandados de prisão temporária e 57 de busca e apreensão nesta terça, 26.

A segunda fase da Operação Cadeia Alimentar mira fraudes no fornecimento de merenda escolar no período entre 2013 e 2017. Entre os alvos da operação estão três empresários, quatro lobistas, quatro servidores públicos, uma vereadora do litoral paulista, um procurador de município, três ex-prefeitos, dois secretários municipais e cinco ex-secretários de prefeituras.

Os alvos são acusados dos crimes de cartelização, fraude a licitações, falsidade ideológica e organização criminosa.

Ao abrir a decisão que autoriza a Cadeia Alimentar 2, o juiz Perez relembrou citação proferida por ele mesmo na primeira etapa da operação. "A Lei de Licitações é ignorada e o caráter competitivo da licitação é letra morta."

"Há indícios veementes da prática dos delitos de associação criminosa, além do crime de fraude nas licitações, tudo a recomendar a custódia temporária dos envolvidos", diz o magistrado.

Perez destaca, ainda. "Registro não existir dúvidas quanto à participação dos investigados em associação criminosa nos vários municípios relacionados pela autoridade policial, sempre de forma estável e com divisão de funções."

A segunda fase da operação foi deflagrada com base nas delações premiadas de José Geraldo Zana e Jorge Luiz Rodrigues, dono e funcionário do frigorífico Mult Beef, respectivamente.

Além de fatos já conhecidos dos investigadores, os delatores apresentaram provas de envolvimento de agentes públicos e políticos no esquema.

O Ministério Público aponta que os investigados direcionavam licitações para favorecer empresas mediante pagamento de propina de 10% do valor do contrato.

A fraude ocorria por meio de simulação de concorrência, ajuste prévio de preços e inclusão de exigências técnicas que limitavam a participação de outros interessados.

O processo corre em sigilo de Justiça.

De acordo com o juiz Augusto Martinez Perez, da 4ª Vara Federal de Ribeirão Preto, a Polícia Federal aponta para o envolvimento de integrantes do esquema delatados pelo dono da Mult Beef que não foram atingidos na primeira fase da Operação.

As provas obtidas nas buscas realizadas nesta terça, 26, serão usadas para comprovar os fatos citados pelo empresário.

"As medidas restritivas pleiteadas se prestam a obter provas de novos delitos, eis que provavelmente continuam a praticar fraudes até os dias de hoje, uma vez que alguns continuam exercendo cargos públicos, ou exercem atividade empresarial participando de certames licitatórios, ou são 'lobistas' buscando a satisfação de interesses próprios ou encobrindo a participação de terceiros (via de regra políticos)", afirma Perez.

A prisão temporária dos alvos visa impedir a "destruição ou ocultação" de provas, segundo o magistrado.

"Havendo indicativos de que os investigados continuam em atividade, envolvidos em crimes relacionados a fraudes em processos licitatórios e corrupção de servidores, com mais razão se justifica a prisão temporária, de modo a garantir a higidez da colheita da prova", afirmou o juiz federal.

Perez é taxativo. "De outro lado, a prática de crimes de forma habitual e profissional há anos é indicativo seguro de risco à ordem pública, valendo o registro de que é provável a manutenção pelos investigados de contratos ativos com a Administração Pública, tudo a recomendar a sua interrupção de modo a evitar que os mesmos esquemas delatados estejam sendo empregados nesses contratos."

Veja os locais onde as ordens da Cadeia Alimentar 2 são cumpridas:

  • Americana (3 mandados prisão e 3 busca/apreensão);
  • Atibaia (1 mandado de prisão e 1 busca/apreensão);
  • Campinas (1 mandado de prisão e 1 busca/apreensão);
  • Cotia (1 mandado de prisão e 1 busca/apreensão);
  • Cubatão (1 mandado de prisão e 4 busca/apreensão);
  • Franca (2 mandados de prisão e 3 busca/apreensão);
  • Garça (1 mandado de busca/apreensão);
  • Guarujá (2 mandados de busca/apreensão);
  • Itapevi (1 mandado de prisão e 1 busca/apreensão);
  • Jandira (1 busca/apreensão);
  • Matão (1 mandado de prisão e 2 busca/apreensão);
  • Orlândia (1 mandado de busca/apreensão);
  • Osasco (1 mandado de busca/apreensão);
  • Paulínia (4 mandados de busca/apreensão);
  • Praia Grande (2 mandados de busca/apreensão);
  • Rio Claro (1 mandado de prisão e 1 busca/apreensão);
  • Santos (2 mandados de prisão e 2 busca/apreensão);
  • São Carlos (1 mandado de prisão e 1 busca/apreensão);
  • São Joaquim da Barra (1 mandado de prisão e 1 busca/apreensão);
  • São José do Rio Preto (1 mandado de prisão e 1 busca/apreensão);
  • São Paulo (3 mandados de prisão e 8 busca/apreensão);
  • São Roque (2 mandados de prisão e 3 busca/apreensão);
  • São Vicente (2 mandados de prisão e 5 busca/apreensão);
  • Sorocaba (1 mandado de prisão e 2 busca/apreensão);
  • Sumaré (1 mandado de prisão e 1 busca/apreensão);
  • Taquaritinga (1 mandado de prisão e 3 busca/apreensão);
  • Votorantim (1 mandado de busca/apreensão).