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"Espero que STF ou CNJ corrija falhas no juiz de garantias", diz Moro

9.dez.2019 - O ministro Sergio Moro durante seminário para comemorar o Dia Internacional Contra a Corrupção - Marcelo Camargo/Agência Brasil Brasilia-DF
9.dez.2019 - O ministro Sergio Moro durante seminário para comemorar o Dia Internacional Contra a Corrupção Imagem: Marcelo Camargo/Agência Brasil Brasilia-DF

Ricardo Brandt e Fausto Macedo

São Paulo

13/01/2020 12h00

O ministro da Justiça e Segurança Pública, Sérgio Moro, disse que é preciso resolver o que considera "problemas técnicos graves" na figura do juiz de garantias, medida incluída por deputados no pacote anticrime, de sua autoria, e mantida pelo presidente Jair Bolsonaro (sem partido). "Muitas questões ficaram indefinidas. É indicativo de que faltou debate, apesar de a Câmara ter sido alertada", afirma Moro em entrevista ao jornal O Estado de S. Paulo. "Espero que o STF (Supremo Tribunal federal) ou o CNJ (Conselho Nacional de Justiça) possa corrigir esses problemas."

A inserção do juiz de garantia, medida apelidada de "anti-Moro", foi um dos reveses sofridos no primeiro ano como ministro - na lista estão ainda a transferência do Coaf (Conselho de Controle de Atividades Financeiras) para a pasta da Economia e derrotas no projeto de abuso de autoridade. Para ele, isso faz parte do processo político. "Sempre que se envia um projeto de lei, há a possibilidade de que seja rejeitado total ou em parte."

Nos seus planos para 2020, Moro pretende usar o capital político de ministro mais popular do governo Bolsonaro e quer contar justamente com o Congresso para reverter derrotas causadas também por decisões do Judiciário, como a mudança no entendimento do Supremo sobre o momento da execução de uma pena de um condenado. "No campo legislativo, por exemplo, queremos ajudar o Parlamento, no que for possível, a restabelecer a execução criminal a partir da condenação em segunda instância", disse o ministro, ao falar sobre uma das principais bandeiras da Lava Jato.

A seguir, os principais trechos da entrevista:

O sr. reconhece derrotas na relação com o Congresso, em especial no pacote anticrime?

Sempre que se envia um projeto de lei, há a possibilidade de que seja rejeitado total ou em parte. Na minha opinião, muitas medidas importantes foram aprovadas no projeto anticrime, como a execução imediata dos veredictos do Tribunal do Júri, o que tem um potencial enorme para a redução da impunidade de assassinatos e, por conseguinte, a diminuição desses próprios crimes. O que não foi aprovado, paciência.

Por que o sr. é contra o juiz de garantias, também parte do pacote anticrime?

Não é uma questão tão simples ser contra ou a favor do juiz de garantias. Muitas questões ficaram indefinidas. Só vale para primeira instância ou também para as recursais e superiores? Vai ser aplicado às investigações e ações penais em andamento ou não? A falta de solução legislativa expressa dessas questões é indicativo de que faltou debate na Câmara sobre a medida, apesar de ter sido alertada. Tenho ainda presente que, nas comarcas com um único juiz, a medida é inviável.

Por quê?

Não tem como um juiz à distância, por meio eletrônico ou por meio de rodízio, cuidar da investigação ou da ação penal. Então, por exemplo, se o juiz em uma comarca pequena homologar uma prisão em flagrante já não poderá fazer a ação penal decorrente daquele caso. Como poderá um juiz de outro local substituí-lo em toda essa ação penal? A medida, no mínimo, deveria ter sido excepcionada para comarcas com um único juiz. Espero que o STF ou o CNJ possa corrigir esses problemas. O melhor, porém, seria a supressão desta parte da lei para que essas questões fossem devidamente debatidas no Congresso no âmbito do projeto do novo Código de Processo Penal.

Como o sr. vai se posicionar em relação à prisão de condenados em segunda instância?

No campo legislativo, por exemplo, queremos ajudar o Parlamento, no que for possível, a restabelecer a execução criminal a partir da condenação em segunda instância.

O sr. espera ter mais apoio do Congresso para aprovar seus projetos este ano?

Tive muito apoio no Congresso e conheci parlamentares fantásticos, muito dedicados. Há também resistência, às vezes até por questões político-partidárias. Penso que, demonstrando o acerto dos projetos e o resultado dos trabalhos, o apoio será crescente. Mas ressalvo que muitas ações executivas relevantes sequer dependem do Congresso.

Quais serão suas outras prioridades para este ano?

Um exemplo é o piloto da redução da criminalidade em municípios com índices elevados de violência, o Em Frente Brasil. Ele entra na fase da implementação das políticas sociais associadas à já implantada intensificação das forças de segurança. Nos cinco municípios escolhidos, houve uma queda de 44% de assassinatos. Com a fase social, esperamos queda mais profunda. Há planos novos, como a criação, ainda em estudo, de um laboratório nacional, em parceria público-privada, contra o crime cibernético, à semelhança do que existe nos Estados Unidos.

Na área da segurança pública, o que o sr. destaca?

A intervenção da força penitenciária em presídios no Pará foi, por exemplo, uma das causas da queda abrupta dos crimes na região metropolitana de Belém. A intensificação da política de combate ao crime organizado, com recordes de apreensão de drogas e bens, além do isolamento das lideranças, sem exceções, nos presídios federais, é também uma das causas da queda da criminalidade violenta. O desafio real é manter e aprofundar a queda da criminalidade.

Segurança pública sempre foi tratada como uma questão dos governos estaduais. O que mudou?

A partir de 2016, houve uma percepção geral de que os Estados estariam tendo dificuldades de, sozinhos, resolver os péssimos indicadores de segurança pública. Seguimos buscando melhorar a gestão e aprofundar o apoio aos Estados.

Isso gerou resultados?

Os crimes caíram significativamente em todo o país durante 2019. Já haviam caído em 2018, mas os porcentuais de 2019 são mais significativos. Por exemplo, houve uma redução de 22% no número de assassinatos; nos roubos a banco, 40%; nos roubos de cargas em estradas federais, cerca de 40%. Sempre tenho ressalvado que é um mérito conjunto das forças de segurança federais, estaduais e municipais. Não estamos neste trabalho para obter medalha. Mas sendo um fenômeno nacional e considerando as ações realizadas pelo Ministério da Justiça, não posso deixar de admitir que várias de nossas ações têm também refletido nessa queda.

O que o sr. diria que aprendeu neste primeiro ano trabalhando como ministro de Jair Bolsonaro?

A experiência revelou que é preciso aliar trabalho duro e eficiente, como - permito-me dizer - da equipe do ministério, com uma mensagem clara da missão, sem vacilos ou dubiedade. Essa mensagem, na área da segurança pública, é, em síntese: é preciso reduzir a impunidade para reduzir a criminalidade e, assim, aumentar a segurança para o indivíduo e para a sociedade. Isso vale para corrupção, criminalidade violenta e crime organizado.

As informações são do jornal O Estado de S. Paulo.