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Protestos despertaram Brasil para realidade, diz sociólogo francês

19/06/2013 08h07

Os atuais protestos em várias cidades brasileiras resultam do fato de que os brasileiros "caíram na realidade", na avaliação do sociólogo francês Alain Touraine, especialista em América Latina e autor de inúmeros livros sobre movimentos sociais.

"A situação (econômica e social) no Brasil vinha sendo descrita de maneira exageradamente cor-de-rosa", disse o sociólogo em entrevista à BBC Brasil.

Para ele, os protestos aproximaram a imagem que se tinha do Brasil da realidade do país.

"Construiu-se uma imagem do Brasil em que tudo vai bem e que o país se dirige rapidamente em direção ao crescimento e ao bem-estar", disse ele. "Fico feliz ao ver que o que acontece atualmente no Brasil corresponde melhor à realidade do país do que as imagens que vinham sendo transmitidas", afirmou.

"É ridículo ter a imagem de que há sucesso em todas as áreas, sobretudo em um país como o Brasil, onde as instituições são fracas e a corrupção é profunda", disse Touraine, que foi professor do ex-presidente Fernando Henrique Cardoso.

Ele disse que em uma comparação com o México, por exemplo, apesar de este país ter vários indicadores econômicos e sociais mais positivos, é o Brasil que possui a imagem de país "onde tudo vai bem".

O sociólogo definiu os movimentos de protestos no Brasil como a "quebra da esperança", um sentimento de "decepção, que cria uma situação favorável ao descontentamento".

"Quando há crescimento econômico e ele diminui, como é o caso do Brasil, isso representa exatamente o bom momento para protestar", disse ele.

"O balanço da situação brasileira é bom. Mas o país sofre desigualdades e benefícios do desenvolvimento são muito mal distribuídos", afirmou.

"O Brasil ainda está muito longe de ter um nível de distribuição de renda aceitável".

Nível baixo de vida

De acordo com Touraine, os protestos no Brasil demonstram "um sentimento real, justificado, de que o nível de vida é muito baixo".

E também, acrescentou, "o sentimento de que se constituiu, estranhamente, no topo do poder, um mundo de riquezas."

"A pobreza, que permanece imensa, é sacrificada em benefício do espetáculo", disse ele, se referindo aos gastos "gigantescos" com as obras da Copa do Mundo e Jogos Olímpicos, que geraram protestos "no país do futebol".

Mas Touraine ressaltou que os protestos no Brasil não assumiram, "pelo menos até o momento", uma forma política, com o objetivo de derrubar o governo, como ocorreu nas revoluções nos países árabes.

"O caso brasileiro é um pouco atípico. As reivindicações econômicas e sociais são, pelo menos aparentemente, mais importantes do que os protestos ou ataques puramente políticos", afirmou.

"Não há um furor pela democracia no Brasil como ocorreu, por exemplo, na praça Tiananmen, em Pequim. Em vários países os protestos se concentraram contra um ditador", disse Touraine à BBC Brasil.

"No caso do Brasil, não acredito que os protestos representem uma ameaça política contra o governo atual. Mas é possível que a situação evolua. Hoje, não posso dizer que o movimento seja voltado contra Dilma Roussef".