A verdade por trás da festa da queda da Bastilha
Quando os franceses forem às ruas neste domingo comemorar sua festa nacional, que lembra a tomada da prisão da Bastilha em 14 de julho de 1789, muitos não saberão que, em vez do evento que foi o maior pontapé da Revolução Francesa, poderão estar festejando um episódio que aconteceu exatemente um ano depois: La Fête de la Féderation (A Festa da Federação, em tradução livre).
Para explicar como pode ter havido uma confusão entre as duas datas, é preciso fazer uma viagem no tempo e mergulhar na história francesa.
É muito fácil esquecer que no século que se seguiu aos eventos de 1789, a França foi submetida principalmente a regimes monárquicos, os mesmos que a revolução tanto havia combatido.
Primeiro veio Napoleão, depois os Bourbon. Em seguida, o rei Louis-Philippe, para depois o país experimentar um pequeno intervalo republicano, em 1848. Na sequência, veio o imperador Napoleão III.
Somente a partir de 1870, quando o país saiu derrotado da Guerra Franco-Prussiana, é que a França estabeleceu seu duradouro sistema republicano.
No final de 1870, muitos monarquistas haviam sucumbido aos ideais da República, a Assembleia Constituinte era composta por uma maioria republicanana e, portanto, havia chegado o momento de inaugurar uma nova era, com uma série de símbolos nacionais.
Reconciliação
Uma das primeiras tarefas foi estabelecer o dia festa nacional francesa.
Após analisar várias opções, a opinião da esquerda prevaleceu: dia 14 de julho. Eles argumentaram que a queda da Bastilha foi o estopim da Revolução, com a libertação dos presos ali confinados.
Contudo, havia um probelma. O evento também fora marcado por um banho de sangue, no qual dezenas de pessoas morreram, entre elas o governador de Paris, que foi decapitado.
Para alguns parlamentares, o dia nacional da França deveria ser também um dia de reconciliação. Foi quando os olhos de todos se voltaram para a Festa da Federação.
Um ano após a tomada de Bastilha, a esperança pairava sobre Paris. O rei Louis XVI ainda estava no trono, mas seus poderes haviam sido cerceados pela Assembleia Constituinte. Os privilégios da aristocracia haviam sido abolidos.
Foi uma época definida pelos historiadores como a "fase otimista da revolução".
E para marcá-la, as autoridades organizaram um evento ao ar livre extraordinário no Champs de Mars, onde hoje fica a Torre Eiffel.
Um arco triunfal de 24 metros de altura foi erguido, o lugar foi preparado para receber 400 mil pessoas. No centro, instalaram um altar onde podia-se ler os dizeres "A Nação, A Lei, o Rei".
Nas semanas que precederam ao evento, parisienses de todas as classes sociais se uniram nos esforços de organização da festa.
Choveu cántaros no dia 14 de julho de 1790. Ainda assim, delegações da recém-criada Guarda Nacional fizeram um desfile pela cidade, liderados pelo Marquês de Lafayette.
No Champs de Mars, canções militares foram entoadas; foram feitos juramentos ao Rei que, por sua vez, prometeu validar os decretos da Assembleia Nacional; uma missa foi celebrada.
E num episódio que lembra cenas contemporâneas do culto a celebridades, a multidão foi ao delírio quando a rainha Maria Antonieta levantou seu bebê, herdeiro do trono, para exibí-lo ao público.
'Dia mais bonito da França'
Nas palavras do historiador Georges-Henri Soutou, foi um momento em que ainda era possível imaginar que um novo regime poderia conciliar diferentes crenças religiosas e ainda contar com o apoio do Rei.
Não durou, é óbvio. Dentro de um ano, a revolução estava na rota que a levou ao seu fechamento sangrento.
Mas um século depois, a Festa da Federação era a única data em torno da qual todo mundo, desde os leais aos Bourbon aos pró-socialistas, podiam concordar.
Para o senador Henri Martin, que rascunhou a Lei do Dia Nacional, 14 de julho de 1790 foi o dia mais bonito da França, possivelmente da história da humanidade. Foi naquele dia em que a união finalmente foi conquistada.
Aprovada em 1880, a lei era propositalmente ambígua. Não mencionava a que 14 de julho se referia.
E hoje, é claro, todo mundo acha que é o dia da tomada da Bastilha.
Mas reserve também um pensamento ao outro 14 de julho, quando a França parecia estar vivenciando transformações mais pacíficas, graduais. Este dia também é parte da história.
Para explicar como pode ter havido uma confusão entre as duas datas, é preciso fazer uma viagem no tempo e mergulhar na história francesa.
É muito fácil esquecer que no século que se seguiu aos eventos de 1789, a França foi submetida principalmente a regimes monárquicos, os mesmos que a revolução tanto havia combatido.
Primeiro veio Napoleão, depois os Bourbon. Em seguida, o rei Louis-Philippe, para depois o país experimentar um pequeno intervalo republicano, em 1848. Na sequência, veio o imperador Napoleão III.
Somente a partir de 1870, quando o país saiu derrotado da Guerra Franco-Prussiana, é que a França estabeleceu seu duradouro sistema republicano.
No final de 1870, muitos monarquistas haviam sucumbido aos ideais da República, a Assembleia Constituinte era composta por uma maioria republicanana e, portanto, havia chegado o momento de inaugurar uma nova era, com uma série de símbolos nacionais.
Reconciliação
Uma das primeiras tarefas foi estabelecer o dia festa nacional francesa.
Após analisar várias opções, a opinião da esquerda prevaleceu: dia 14 de julho. Eles argumentaram que a queda da Bastilha foi o estopim da Revolução, com a libertação dos presos ali confinados.
Contudo, havia um probelma. O evento também fora marcado por um banho de sangue, no qual dezenas de pessoas morreram, entre elas o governador de Paris, que foi decapitado.
Para alguns parlamentares, o dia nacional da França deveria ser também um dia de reconciliação. Foi quando os olhos de todos se voltaram para a Festa da Federação.
Um ano após a tomada de Bastilha, a esperança pairava sobre Paris. O rei Louis XVI ainda estava no trono, mas seus poderes haviam sido cerceados pela Assembleia Constituinte. Os privilégios da aristocracia haviam sido abolidos.
Foi uma época definida pelos historiadores como a "fase otimista da revolução".
E para marcá-la, as autoridades organizaram um evento ao ar livre extraordinário no Champs de Mars, onde hoje fica a Torre Eiffel.
Um arco triunfal de 24 metros de altura foi erguido, o lugar foi preparado para receber 400 mil pessoas. No centro, instalaram um altar onde podia-se ler os dizeres "A Nação, A Lei, o Rei".
Nas semanas que precederam ao evento, parisienses de todas as classes sociais se uniram nos esforços de organização da festa.
Choveu cántaros no dia 14 de julho de 1790. Ainda assim, delegações da recém-criada Guarda Nacional fizeram um desfile pela cidade, liderados pelo Marquês de Lafayette.
No Champs de Mars, canções militares foram entoadas; foram feitos juramentos ao Rei que, por sua vez, prometeu validar os decretos da Assembleia Nacional; uma missa foi celebrada.
E num episódio que lembra cenas contemporâneas do culto a celebridades, a multidão foi ao delírio quando a rainha Maria Antonieta levantou seu bebê, herdeiro do trono, para exibí-lo ao público.
'Dia mais bonito da França'
Nas palavras do historiador Georges-Henri Soutou, foi um momento em que ainda era possível imaginar que um novo regime poderia conciliar diferentes crenças religiosas e ainda contar com o apoio do Rei.
Não durou, é óbvio. Dentro de um ano, a revolução estava na rota que a levou ao seu fechamento sangrento.
Mas um século depois, a Festa da Federação era a única data em torno da qual todo mundo, desde os leais aos Bourbon aos pró-socialistas, podiam concordar.
Para o senador Henri Martin, que rascunhou a Lei do Dia Nacional, 14 de julho de 1790 foi o dia mais bonito da França, possivelmente da história da humanidade. Foi naquele dia em que a união finalmente foi conquistada.
Aprovada em 1880, a lei era propositalmente ambígua. Não mencionava a que 14 de julho se referia.
E hoje, é claro, todo mundo acha que é o dia da tomada da Bastilha.
Mas reserve também um pensamento ao outro 14 de julho, quando a França parecia estar vivenciando transformações mais pacíficas, graduais. Este dia também é parte da história.
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