Quatro divergências entre Obama e Putin sobre o conflito na Síria
Os presidentes dos Estados Unidos, Barack Obama, e o da Rússia, Vladimir Putin, se reuniram durante a Assembleia Geral da ONU em Nova York, após fazerem discursos expondo visões divergentes sobre a guerra na Síria.
O tema foi o mais espinhoso da reunião de 90 minutos entre os dois líderes. Ambos tem concepções diferentes sobre o papel do presidente sírio, Bashar al-Assad, e sobre possíveis soluções para a guerra civil que já dura quatro anos e já matou 250 mil pessoas.
"Para os russos, Assad é um bastião contra os extremistas (do autodenominado "Estado Islâmico", o "EI"); já para os americanos, Assad é um elemento que inflama as chamas de um conflito sectário", disse um integrante do alto escalão do governo americano.
Ambos os presidentes, entretanto, concordam com a necessidade de se buscar uma solução política para o conflito.
Em declarações após o encontro, Putin não descartou a possibilidade de a Rússia integrar uma aliança com a Europa e países da região em ações contra o "EI", caso a missão tenha mandato da ONU - ainda que tenha descartado enviar tropas à Síria.
Em seu discurso na ONU, Putin disse ter sido "um enorme erro a recusa em cooperar com o governo sírio e suas forças armadas que valentemente combatem o terrorismo".
Já Obama afirmou que trabalharia com qualquer nação para resolver o conflito, mas que não vê a permanência de Assad como viável. "Temos que reconhecer que não pode haver, depois de tanto derramamento de sangue, de tanta matança, uma volta ao status quo anterior à guerra."
Mas as palavras de Obama e Putin também indicaram que ambos estão dispostos a chegar a um compromisso, buscar algum terreno comum na luta contra o "EI".
Mas quais são as principais dificuldades para conseguir delinear um terreno comum? A BBC Mundo, o serviço da BBC em espanhol, listou os quatro principais pontos de discórdia entre Washington e Moscou sobre o conflito sírio:
1. O papel de Assad
Assad é um aliado histórico de Moscou, a quem a Rússia vê como parte da solução para o conflito sírio, mas que os Estados Unidos veem como parte do problema.
A Casa Branca está convencida de que o autoritarismo do presidente sírio é um das principais fontes de instabilidade do país, ao proporcionar terreno fértil aos extremistas islâmicos.
Obama, que já acusou Assad de torturar e assassinar seu próprio povo, certamente insistirá com Putin que uma solução a longo prazo passe pela saída do poder de seu aliado.
Já o presidente russo sempre defendeu a legitimidade do governo de Assad e deve insistir na tese de que qualquer discussão sobre uma transação política na Síria passa pela derrota definitiva do EI.
Mas, ao que tudo indica, ambos os mandatários poderiam considerar a possibilidade de um período de transição com Assad no poder.
2. Quem apoiar militarmente
Putin apoia diretamente as forças governamentais sírias. Já Washington, além de participar de bombardeios contra o EI, já apoiou opositores mais moderados ao governo de Damasco.
Uma estratégia que, no entanto, foi criticada e até ridicularizada por Putin às vésperas de seu encontro com Obama.
Putin também ressaltou que "apoiar militarmente organizações ilegítimas contradiz os princípios do direito internacional e a Carta das Nações Unidas".
Já a Casa Branca disse acreditar que o apoio russo ao Exército sírio fará com que Assad se sinta menos pressionado a negociar e, assim, colocar um fim no conflito.
3. Diferentes aliados regionais
Não é apenas em território sírio que EUA e Rússia elegeram aliados diferentes.
Em sua campanha de bombardeio contra o Estado Islâmico, os EUA contaram desde o início com apoio da Arábia Saudita, que compartilha com a Casa Branca o objetivo de derrotar Assad.
Já a Rússia, por sua vez, surpreendeu a todos no domingo ao anunciar um acordo para compartilhar inteligência sobre o EI com o Iraque e o Irã, um aliado do governo de Damasco.
E, dada a disputa regional entre iranianos e sauditas, muitos consideraram que isso estimularia o surgimento de coalizões rivais anti-EI.
Isso ficaria ainda mais pronunciado com a decisão russa de estender esse acordo às forças de segurança síria - e obrigaria Washington a questionar sua relação e a de Moscou com o Iraque, outro aliado da luta contra o EI.
4. Protagonismo incômodo versus protagonismo almejado
A maior diferença entre Obama e Putin em relação à Síria talvez seja a forma em como veem seu próprio protagonismo no conflito.
Os Estados Unidos parecem ter sigo arrastados para ele um pouco contra sua vontade. E Obama sabe que um maior envolvimento na guerra da Síria pode terminar enfraquecendo-o internamente.
Já Putin não tem esse problema: a situação fortalece sua imagem de líder capaz de devolver à Rússia o protagonismo internacional perdido após a queda da União Soviética. E pode inclusive ajudar a imagem do país no globo, prejudicada com a intervenção russa na Ucrânia e na anexação da Crimeia.
Efetivamente, os EUA poderiam ter na Rússia um aliado importante na luta contra o Estado Islâmico. E Putin sabe disso. E também sabe que a União Europeia também está em busca de uma solução capaz de deter o fluxo de refugiados que chegam à região vindos da Síria.
"Muito provavelmente, Putin utilizará a situação para cobrar redução das sanções contra a Rússia impostas após a Crimeia e fazer com que o Ocidente aceite sua volta ao clube de líderes mundiais", disse à BBC Munda Mijaíl Izmailov, da BBC Rússia.
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