As chances de sofrer um acidente aéreo --e sobreviver a ele
Além de comover, grandes tragédias na aviação costumam alimentar outro sentimento nas pessoas: o receio de voar.
Mas o fato é que morrer em uma catástrofe aérea é algo bastante raro. Atualmente, para cada 1 milhão de aviões que decolam, menos de dois (1,6) apresentarão problemas no percurso, revelam dados da Associação Internacional de Transporte Aéreo (IATA, na sigla em inglês).
Essa probabilidade inclui imprevistos de todos os tipos, não apenas os grandes infortúnios. Se consideradas somente situações com mortes, a proporção é ainda menor: apenas dez incidentes fatais ocorrem a cada 40 milhões de voos.
"A chance de um indivíduo sobreviver um acidente que ameaça a vida é boa, quase 56%. Se excluirmos acidentes onde todos os passageiros morreram e considerarmos apenas os que são 'tecnicamente sobrevivíeis', então, a média de sobrevivência sobe para 71,1%", explica o professor da Universidade de Greenwich Edwin Galea, que é matemático, especialista em engenharia de segurança e desenvolvedor de simulações.
Essa afirmação é baseada em estudos feitos por ele, independentemente da IATA, e que estão disponíveis no site da universidade.
"Acidentes que ameaçam a vida (inclusive aqueles que não têm sobreviventes) são muito raros. Um evento desses só ocorre a cada 5,7 milhões de partidas", afirma.
"Digamos que se uma pessoa voasse todos os dias, experimentaria um acidente catastrófico em algum momento dentro dos próximos 2.700 anos", afirmou à BBC Brasil meses atrás Perry Flint, o porta-voz da IATA, ao comentar o desastre com o avião da Chapecoense, que caiu na Colômbia, matando 71 das 77 pessoas a bordo.
Acidentes substanciais
A edição mais recente do anuário da associação --publicada semanas atrás com dados de 2016-- registrou um total de 65 infortúnios para mais de 40 milhões de voos. Destes, dez envolveram vítimas fatais, totalizando a perda de 268 vidas.
No ano anterior, em 2015, o número total de imprevistos foi de 68 em um universo de cerca de 38 milhões de decolagens. Desses, quatro quedas fatais resultaram na morte de 136 pessoas. As estatísticas excluíram dois voos: um derrubado por um piloto suicida e outro explodido por terroristas, uma vez que as causas das quedas não foram erro humano, falha técnica ou mau tempo.
Para a IATA, o conceito de "perda de casco" é a referência para se julgar quando um acidente dificilmente será "sobrevivível". Nesses episódios, a destruição da fuselagem do avião é irreversível, ou o dano é tão extenso que a companhia aérea declara perda da aeronave.
Em 2016, foram registrados 21 "perdas de casco", 13 de aviões de turbinas e oito de hélices. No período anterior, ocorreram 18 situações semelhantes (dez turbinas e oito hélices).
Por exemplo, se no último ano ocorreram 65 tragédias, das quais dez foram fatais, isso significa que 15,3% dos sinistros aéreos envolveram mortes. Repetindo essa relação acidente-morte para as 21 "perdas de casco" --ou seja, levando-se em conta somente casos nos quais a sobrevivência é mais difícil--, a porcentagem de óbitos sobe para 47,6%.
"A maioria dos acidentes não resulta em perda de vida, mas mesmo se tivermos apenas uma perda, isso já é muito", afirmou Perry, da IATA.
Acidentes 'sobrevivíveis'
A sorte, ou azar, do viajante está justamente na chance de o impacto não ser substancial.
"É extremamente improvável sobreviver a um acidente. As pessoas que conseguiram, no caso do Chapecoense, possivelmente devem isso também ao fato de a aeronave ter atingido as árvores na montanha, o que absorveu muita energia", avaliou em conversa com a BBC Brasil o consultor aeronáutico Heinrich Grossbongardt, em novembro.
O especialista destacou que, mesmo em situações de "acidentes sobrevivíveis", a violência do impacto ainda é muito grande.
"Uma aeronave a 200 km/h é como se fosse um carro a 20 quilômetros por hora. É um choque em velocidade relativamente baixa, mas as forças envolvidas são enormemente superiores ao suportável pelo corpo humano."
Nesses poucos desastres em que há a possibilidade de tentar se driblar o fim, a adoção de algumas medidas ajudaria a melhorar as chances de se dar bem.
Posição mais recomendada
Uma recomendação é adotar a postura conhecida como "brace", em que o passageiro permanece sentado com o cinto de segurança afivelado, as pernas em ângulo de 90 graus, com os joelhos juntos, os dois pés no chão e o peito apoiado sobre as coxas.
A princípio, os braços devem ficar cruzados, protegendo a cabeça, mas também se pode abraçar as pernas ou, alternativamente, apoiar o antebraço contra o assento da frente.
Todas essas versões estão corretas, mas pode existir uma mais adequada dependendo do avião.
Por isso, "sempre preste atenção na apresentação de segurança", recomenda o professor Galea --é nesse momento que a tripulação recomenda a "brace" mais apropriada. Fundamental é que as pernas não fiquem dobradas nem por baixo do próprio assento, nem esticadas sob o assento da frente, para evitar traumas que impeçam o passageiro de se movimentar.
"Assim, você consegue ter as melhores possibilidades de escapar, porque reduz as chances de desmaiar, ficar inconsciente ou sofrer ferimentos que possam dificultar a fuga", aconselha Galea.
Segundo o médico ortopedista Victor Rangel, a posição de brace "é a que melhor ajuda a reduzir as chances de um trauma que ponha a vida em risco".
A postura ainda protege contra outras lesões como o estiramento do pescoço, causado pelo efeito chicote resultante do forte impacto frontal repentino.
Planejamento
Os especialistas também aconselham que passageiros conheçam a "geografia" do avião, sabendo onde fica a saída de emergência mais próxima em ambos os lados. Decorar o número de assentos até a porta possibilita um escape mesmo no escuro, ou em meio à fumaça.
Sapatos devem ter sola lisa e baixa. Eles precisam ser vestidos durante a decolagem e aterrissagem, pois é nesses dois momentos que a maioria dos imprevistos ocorre. Os pés necessitam de proteção contra estilhaços. Atenção: os saltos finos são proibidos, pois podem estourar as rampas infláveis de evacuação.
Nas viagens em família, recomenda-se determinar a responsabilidade de cada adulto para cada criança. O ideal é escapar em duplas e pré-acordar que todos se encontrarão somente do lado de fora, para não atrapalhar o fluxo de saída.
Não se deve levar mais que 90 segundos para fugir, pois há sempre o perigo de incêndio e explosão.
Em caso de pouso forçado na água, os passageiros precisam vestir coletes salva-vidas, que só devem ser inflados fora do avião.
"Inflar um colete dentro vai fazer você ficar entalado no corredor lotado, além disso, se estiver afundando, você vai boiar dentro da aeronave", avisa Galea.
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