Toffoli derruba liminar que liberava presos em 2ª instância e poderia soltar Lula da prisão
Presidente do STF atende a reivindicação da procuradora-geral da República, Raquel Dodge, contra decisão de mais cedo do ministro Marco Aurélio de Mello.
Atualizada às 23h58 de 19 de dezembro de 2018
Atendendo a uma requisição da procuradora-geral da República, Raquel Dodge, o presidente do STF, Dias Toffoli, derrubou há pouco liminar que determinava a liberação de todas as pessoas detidas em razão de condenações em segunda instância.
A decisão liminar de mais cedo, expedida pelo ministro Marco Aurélio de Mello, poderia afetar em tese cerca de 150 mil presos, incluindo o ex-presidente Luiz Inácio Lula da Silva.
Toffoli justificou a suspensão da liminar do colega afirmando que a matéria deve ser apreciada de forma definitiva por todos os ministros do tribunal - "já pautada para o dia 10 de abril do próximo ano judiciário", conforme diz sua decisão.
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O presidente do STF menciona o "potencial risco de lesão à ordem pública e à segurança" dos efeitos da liminar concedida por Mello e aponta que a decisão do colega contraria decisões prévias do colegiado sobre a "controvérsia jurídica", conforme caracteriza o imbróglio sobre a prisão de pessoas condenadas em segunda instância.
Dodge recorreu ao Supremo para pedir a derrubada da liminar por volta das 18h. Uma vez que o recesso do Judiciário começou na tarde desta quarta-feira, coube a Toffoli a decisão - fica com a presidência do tribunal a análise de recursos durante o plantão.
Liminar mobiliza defesa de Lula
Marco Aurélio argumentou em sua decisão que, embora o plenário do STF tenha decidido provisoriamente, em 2016, autorizar a prisão após condenação sem segunda instância, o julgamento definitivo está pendente há meses.
Tomada individualmente em resposta a uma Ação Declaratória de Constitucionalidade feita pelo PCdoB, a decisão de Marco Aurélio tinha caráter erga omnes, ou seja, valia para todos, segundo criminalistas e especialistas em direito constitucional.
A soltura, no entanto, não seria imediata e não necessariamente afetaria a todos. Neste cenário, cabe aos juízes de execução, responsáveis pelas prisões dos detidos, analisar cada caso para fazer cumprir a determinação e liberar os presos individualmente.
Além disso, a decisão de Marco Aurélio excluía aqueles presos que estão sob medida cautelar - prisão preventiva ou temporária, por exemplo -, casos como o do ex-governador do Rio, Sérgio Cabral Filho, e o do ex-presidente da Câmara dos Deputados Eduardo Cunha.
Com base na liminar proferida por Mello, a defesa de Lula, que está preso na carceragem da Polícia Federal (PF) em Curitiba desde abril, pediu à Justiça a soltura do ex-presidente. A juíza da 12ª vara responsável pelo caso de Lula, Carolina Lebbos, no entanto, não concedeu imediatamente o pedido e solicitou ao Ministério Público Federal (MPF) que se manifestasse antes de uma decisão definitiva.
Após a decisão de Toffoli, a defesa do ex-presidente fez um novo pedido ao STF para que a decisão de Mello fosse reestabelecida.
Lula cumpre pena de 12 anos e 1 mês de prisão por condenação por corrupção passiva e lavagem de dinheiro no caso do Triplex do Guarujá. Ele ainda não foi condenado em última instância e nega as acusações. Segundo o PT, o motivo de sua prisão é político.
Longo embate no STF
O embate no STF sobre o tema se arrasta desde 2016 quando, por 6 votos a 5, o plenário permitiu o cumprimento antecipado da pena.
Um novo julgamento da questão da prisão após condenação em segunda instância estava marcado para abril. Marco Aurélio, porém, já demonstrou diversas vezes incômodo com a demora para que o caso fosse analisado pelo plenário.
Apesar de a Constituição Federal prever o cumprimento da pena somente após o esgotamento de todos os recursos, prevaleceu o entendimento de que a decisão de segunda instância é suficiente para determinar a prisão porque é ali que se esgota a análise de provas e do mérito do processo, enquanto nas cortes superiores cabem apenas discussões formais de aplicação das leis.
O julgamento de 2016, porém, foi liminar (provisório), de modo que a Corte ainda pode reverter a decisão no julgamento definitivo de duas ações declaratórias de constitucionalidade, cujo relator é Marco Aurélio.
A expectativa hoje é de que o placar tenha virado, pois o ministro Gilmar Mendes já declarou publicamente que mudou de posição e não votará mais pela permissão da prisão após condenação em segunda instância. Marco Aurélio cita essa mudança para justificar a decisão desta quarta.
Desde então, os ministros contrários à prisão antes do trânsito em julgado têm pressionado para que o caso seja definitivamente analisado pelo plenário da Corte. A resistência da presidente anterior, ministra Cármen Lúcia, em pautar essas ações para julgamento acabou abrindo espaço para que Lula fosse preso em abril. O petista teve seu pedido de habeas corpus rejeitado por 6 votos a 5, já que a maioria entendeu que estava em vigor a decisão de 2016 autorizando a prisão.
A expectativa é de que o Tribunal, no julgamento marcado para abril, adotará uma solução intermediária em que o cumprimento da pena ficará autorizado após decisão do Superior Tribunal de Justiça (STJ).
Operação Lava Jato
Procuradores da Operação Lava Jato criticaram a decisão do ministro Marco Aurélio. Em coletiva de imprensa em Curitiba, o procurador Deltan Dallagnol, coordenador da força-tarefa, afirmou que a medida "tem efeitos catastróficos sobre os efeitos da justiça penal no país".
Ele disse acreditar, porém, que a decisão seria revertida antes que pudesse surtir resultados.
"Entendemos que é uma decisão isolada de um ministro do Supremo Tribunal Federal que não vá resistir à análise do próprio Supremo."
Dallagnol afirmou que, atualmente, há 35 pessoas presas após condenações em segunda instância em decorrência da Lava Jato - e que, em tese, poderiam se beneficiar da decisão de Marco Aurélio.
Repercussão
A suspensão por Toffoli da liminar expedida anteriormente por Mello foi comemorada pelo presidente eleito Jair Bolsonaro (PSL) no Twitter: "Parabéns ao presidente do Supremo Tribunal Federal por derrubar a liminar que poderia beneficiar dezenas de milhares de presos em segunda instância no Brasil e colocar em risco o bem estar de nossa sociedade, que já sofre diariamente com o caos da violência generalizada!".
Mais cedo, a decisão de Mello fez com que as hashtags #Lulalivre e #UmCaboUmSoldado chegassem ao assuntos mais comentados do Twitter nesta quarta.
A última é uma referência a uma declaração do deputado federal Eduardo Bolsonaro (PSC-RJ), filho do presidente eleito Jair Bolsonaro. Em uma palestra para concurseiros, em julho, ele disse que bastavam "um soldado e um cabo" para fechar o STF.
Em seu perfil, o deputado criticou a decisão de Marco Aurélio: "não sei se o Brasil tem noção da real gravidade que essa medida do Min.STF Marco Aurélio pode impactar neste fim de ano. Milhares de presos podem ser soltos e ficarem livres pelo menos até fevereiro!"
Ele também disse que a decisão poria "em xeque" toda a "construção" feita até agora, com a eleição de seu pai e a nomeação de Sérgio Moro para o ministério da Justiça.
"É difícil deixar de ser um anão diplomático!", escreveu.
Também no Twitter, a senadora e presidente do PT Gleisi Hoffmann postou uma foto que mostrava a decisão do ministro e usou hashtag #Lulalivre. Logo em seguida, informou que a defesa já havia pedido o alvará de soltura do ex-presidente.
"Acabamos de peticionar a solicitação do alvará de soltura para Lula. Abrimos mão do exame de corpo de delito."
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