Novo imperador do Japão visitou Brasil três vezes e tocou com orquestra sinfônica de São Paulo
O imperador Naruhito, entronado no Japão hoje, esteve no Brasil três vezes, onde visitou várias cidades e se engajou em atividades culturais, numa demonstração da importância do país para a Casa Imperial japonesa.
A tradicional cerimônia entronização, em Tóquio, foi acompanhada por centenas de representantes de outros países, entre eles, o presidente do Brasil, Jair Bolsonaro. Ela deveria ser celebrada por um desfile do casal imperial Naruhito e Masako em carro aberto, um luxuoso sedã Toyota Century, mas este foi transferido para 10 de novembro por causa das fortes chuvas que seguiram a passagem do tufão Hagibis na semana passada.
A decisão foi tomada pelo governo em respeito às vítimas do recente desastre natural que provocou 80 mortes e prejuízo de aproximadamente US$ 527 milhões em 35 das 47 províncias japonesas.
Na cerimônia, o imperador Naruhito disse: "Juro que agirei de acordo com a Constituição e cumprirei minha responsabilidade como símbolo do Estado e da unidade do povo".
O Japão deverá gastar cerca de US$ 148 milhões para marcar a entronização do 126º imperador do país.
A primeira parte da cerimônia começou às 13h locais, quando Naruhito, assim como fez seu pai 30 anos atrás, usou uma vestimenta tradicional e declarou sua entronização no "Matsu no Ma" (o espaço de maior prestígio do Palácio Imperial). À noite, estava previsto um banquete para convidados.
Mesmo sem o cortejo imperial, estima-se que muita gente tenha acompanhado a festa pela televisão e pela internet. Pesquisa realizada por telefone pela emissora de TV pública NHK revela que 72% dos 1.539 entrevistados têm interesse na família imperial e se sentem próximos a ela. O levantamento também mostra que para a maioria, a distância entre a nobreza e o povo diminuiu desde o início da era Heisei, em 1989, com o imperador emérito Akihito ? pai de Naruhito.
Laços com o Brasil
Em seu livro Kizuna (Laços, em português), o advogado e tradutor-intérprete Masato Ninomiya mostra a relação profunda que existe entre a família imperial e o Brasil. Esses laços teriam começado há quase um século, com a doação em dinheiro feita pelo imperador Showa (avô do atual imperador) para a construção do Hospital Santa Cruz, na capital paulista.
A importância do Brasil na agenda da Casa Imperial é visível. As primeiras visitas oficiais ao exterior dos três filhos dos imperadores eméritos Akihito e Michiko foram ao país. Naruhito, por exemplo, esteve três vezes. Em 1982, quando tinha 22 anos, ele passou por São Paulo, Rio de Janeiro, Brasília, Paraná, Bahia e Amazonas, e chegou a se apresentar — tocando viola — com a Orquestra Sinfônica Jovem Municipal na capital paulista, tocando choros de Ernesto Nazaré e Villa-Lobos.
O imperador retornou 26 anos depois como príncipe herdeiro, e no ano passado foi novamente para participar do 8º Fórum Mundial da Água. Seu irmão, o príncipe herdeiro Akishino, visitou o Brasil em 1988 e a irmã mais nova, princesa Sayako, em 1995.
Masato Ninomiya esteve em quase todos esses momentos servindo como intérprete da nobreza. Antes de atender os filhos, ele foi chamado pela Presidência da República para acompanhar a visita do imperador emérito Akihito (na época príncipe herdeiro) ao Brasil em 1978. "Desde então, passei a desfrutar da deferência de Suas Altezas que me convidavam de vez em quando para audiências privadas", afirma. Isso ocorria quando eles queriam tomar conhecimento das novidades que ocorriam no Brasil ou do paradeiro de algum imigrante com quem haviam se encontrado em alguma ocasião.
A proximidade com a família imperial levou Ninomiya e sua esposa Sônia Regina a traduzirem poemas do casal, além de algumas das obras escritas pela imperatriz Michiko e por outros membros da família. O livro do imperador Naruhito relatando os dois anos passados como estudante na Inglaterra também ganhou a versão em português, com o título Junto ao Rio Tâmisa.
Nos passos do pai
Naruhito, de 59 anos, tornou-se o 126º imperador do Japão no dia 1º de maio, inaugurando a nova era Reiwa. Em seu primeiro discurso no trono, ele prometeu ter em mente "o caminho trilhado pelos imperadores do passado" e disse que prosseguirá na defesa do pacifismo.
De acordo com a atual Constituição do Japão em vigor desde 1947, o imperador passou de "divindade viva" a "símbolo do Estado e da unidade do povo", exercendo basicamente funções cerimoniais.
Mesmo octogenários e com problemas de saúde, os imperadores eméritos visitaram vários abrigos com vítimas do terremoto e tsunami de 2011, e permaneceram longo tempo ajoelhados para ficar na mesma altura das pessoas com quem conversavam. Essas cenas tornaram o casal mais popular do que já era.
No caso da atual imperatriz Masako, 55, a admiração é por seu histórico e suas habilidades, porém ela não ficou imune à pressão dos tradicionalistas que cobravam um filho homem. O casal só tem uma filha, Aiko.
Em 2004, Masako foi diagnosticada com exaustão por estresse e continua fazendo tratamento até hoje. A agenda de atividades é administrada por uma equipe médica para não causar fadiga ou estresse. Ela diz estar totalmente focada em servir ao povo. O sinal de que sua saúde está melhorando é a aparição mais frequente em eventos, como a Convenção dos Nikkeis (nipo-descendentes) e dos Japoneses no Exterior realizada no início do mês.
Nesse encontro anual que acontece há 60 anos, em Tóquio, o casal imperial Naruhito e Masako recebeu a portas fechadas um grupo de representantes de 20 comunidades japonesas espalhadas pelo mundo. "Foi muita emoção. Assim que eles entraram na sala, senti uma aura em torno deles", comenta Norberto Shinji Mogi, empresário brasileiro e diretor-presidente do Serviço de Assistência aos Brasileiros no Japão (Sabja).
O imperador Naruhito quis saber detalhes da operação de socorro a sobreviventes do tsunami de 2011 realizada pelo brasileiro. Nessa ocasião, Mogi disponibilizou dois caminhões e um trator de sua empresa para ajudar na remoção dos entulhos formados pelas casas destruídas por aquele desastre natural. "Os imperadores pareciam muito interessados, fazendo muitas perguntas. Foi muito emocionante", lembra.
Fluente em cinco idiomas estrangeiros (inglês, francês, alemão, russo e espanhol) e formada em economia pela Universidade Harvard, a imperatriz Masako teve uma promissora carreira diplomática até aceitar se casar com Naruhito, que a cortejou durante seis anos.
Ambos têm muitos pontos em comum, como a paixão por música e gosto por esporte, em especial o tênis. Ela também aprecia o esqui e ele, o montanhismo.
O casamento, em 1993, trouxe promessa de renovação na família imperial, com a nova princesa plebeia sendo inclusive comparada à falecida princesa Diana. Mas conforme os anos se passavam, aumentou a pressão para que desse à luz um menino aumentava. Em dezembro de 1999, a imperatriz sofreu um aborto espontâneo, o que fez o imperador Naruhito pedir à imprensa para respeitar a privacidade do casal. Em 2001, nasceu a princesa Aiko.
Sem qualquer sinal da chegada de um herdeiro homem, em 2005 um comitê governamental recomendou a mudança na Lei de Sucessão Imperial para garantir a possibilidade de uma mulher assumir o Trono do Crisântemo.
O anúncio do nascimento do sobrinho do imperador Naruhito em 2006 foi um alívio e levou à paralisação do debate sobre sucessão feminina. O príncipe Hisahito, de 13 anos, foi o primeiro filho do sexo masculino nascido na família imperial do Japão desde o seu pai, o príncipe herdeiro Akishino, em 1965.
O peso do fardo de perpetuar a família imperial japonesa já é sentido pelo pequeno príncipe. Em 2016, ele e sua mãe sofreram um acidente de carro (sem ferimentos) que teve grande repercussão na imprensa, assim como ocorreu neste ano, a alguns dias da abdicação do imperador emérito Akihito. Um homem teria invadido a escola onde estuda o príncipe Hisahito e deixado duas facas de cozinha na sala de aula.
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