Transporte de migrantes em caminhões é marcado por tragédias pelo mundo
A descoberta de 39 corpos no baú de um caminhão nos arredores de Londres hoje lançou luz sobre um esquema arriscado de transporte irregular de pessoas em direção a países europeus.
As vítimas ainda não foram identificadas, mas as informações preliminares indicam que seriam 38 adultos e um adolescente. A polícia de Essex não encontrou sobreviventes quando foi acionada pelos serviços de ambulância na madrugada desta quarta-feira.
A tragédia lembra casos anteriores em que passageiros de caminhões foram encontrados mortos como parte de perigosas rotas de imigração irregular ou busca de refúgio saindo de zonas de conflito. O principal motivo das mortes é a falta de ar no compartimento onde imigrantes ilegais se escondem das autoridades.
Segundo o especialista em imigração da BBC Mark Easton, a indústria do transporte de seres humanos vem crescendo na Europa e se tornando mais complexa com controles mais rígidos em fronteiras como a entre Calais, na França, e Dover, no Reino Unido.
De acordo com ele, os usuários e vítimas desse tráfico pagam cerca de 10 mil libras (equivalente a cerca de R$ 50 mil) para entrar no país, enfrentando graves riscos. "Entram até em contêineres de navios, muitas vezes até refrigerados. É uma consequência inevitável dessa indústria vil", disse.
A BBC News Brasil reúne abaixo três casos simbólicos na Europa e nos Estados Unidos.
58 chineses mortos na Inglaterra
Em junho de 2000, os corpos de 58 imigrantes chineses foram encontrados na traseira de um caminhão em Dover, na Inglaterra. Havia dois sobreviventes. Um motorista holandês, que fechou a entrada de ar, foi preso no ano seguinte acusado de homicídio culposo.
Ao todo, sete pessoas foram condenadas pela Justiça holandesa, entre elas um tradutor. Todos foram considerados culpados de negligência no incidente, mas absolvidos da acusação de assassinato.
Dois homens acusados de serem os líderes do grupo foram condenados a nove anos de prisão. Os outros receberam sentenças que variam de 30 meses a sete anos.
Os imigrantes chineses estavam sendo levados ilegalmente de balsa de Roterdã, na Holanda, via Zeebruggre, até Dover, na Inglaterra, quando morreram sufocados.
As 58 vítimas viajaram 12 mil quilômetros saindo da Província chinesa de Fujian.
71 imigrantes do Oriente Médio asfixiados na Áustria
Esse caso, que gerou indignação internacional, foi um dos principais marcos da crise de refugiados na Europa em 2015.
Ao todo, morreram 71 pessoas asfixiadas, sendo 59 homens, oito mulheres e quatro crianças vindos de Iraque, Síria e Afeganistão.
Eles haviam embarcado no caminhão na fronteira entre Sérvia e Hungria. A investigação apontou que o esquema cobrava até 1.500 euros (quase R$ 6.800) de cada uma das pessoas que fugia de países em guerra.
Segundo a polícia, pouco depois de o veículo partir rumo à Alemanha, os imigrantes começaram a gritar que estavam ficando sem ar.
O motorista então ligou para seu chefe e recebeu a orientação de seguir dirigindo, não abrir a porta do caminhão sob nenhuma circunstância e abandonar possíveis mortos em uma área florestal alemã.
Eles foram encontrados em uma rodovia austríaca a quase 50 km da cidade de Hofburg.
Ao todo, 14 pessoas foram julgadas pelas 71 mortes. A Justiça da Hungria condenou quatro por homicídio e outras acusações, que receberam pena de 25 anos de prisão. Outros dez foram condenados por contrabando de imigrantes e associação a organização criminosa, com sentenças de 3 a 12 anos de prisão.
No dia seguinte à descoberta dos 71 corpos no caminhão, a polícia identificou um outro veículo refrigerado da mesma quadrilha com mais 67 imigrantes, também em rodovias austríacas. Só que eles conseguiram abrir a porta do caminhão à força, evitando a asfixia.
19 latino-americanos mortos nos Estados Unidos em 2003
Em 2006, um motorista foi condenado pela morte de 19 imigrantes ilegais que três anos antes morreram sufocados na traseira de seu caminhão. Foi o caso de tráfico humano mais trágico na história recente americana.
As vítimas eram oriundas do México e de países da América Central. Outras 55 pessoas sobreviveram.
O motorista, um jamaicano que migrou legalmente para os Estados Unidos e trabalhava com transporte de leite, recebeu o equivalente a quase R$ 30 mil pelo tráfico das sete dezenas de imigrantes.
As pessoas seriam levadas de uma região para outra do Texas, Estado americano que faz fronteira com o México. A polícia afirmou que o sistema de refrigeração quebrou, mas o motorista foi orientado pela quadrilha de tráfico humano a seguir viagem.
Segundo uma testemunha, que viajava na cabine do veículo, ele ignorou os gritos das pessoas escondidas na traseira. As vítimas enfrentaram falta de ar, desidratação e altas temperaturas. O primeiro a morrer foi um mexicano de cinco anos de idade.
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