A 'cúpula de calor' que fez temperaturas baterem recordes históricos nos EUA e no Canadá
Especialistas afirmam que mudanças climáticas ligadas ao aquecimento global aumentarão frequência de eventos climáticos extremos, como ondas de calor. No entanto, é complexo associar um evento isolado à alta da temperatura do planeta.
O Canadá registrou a temperatura mais alta de sua história num momento em que o oeste do país e o noroeste dos Estados Unidos enfrentam uma onda de calor sem precedentes.
Em Lytton, na Colúmbia Britânica, os termômetros alcançaram no domingo (27/06) a marca de 46,6ºC, superando o recorde de 84 anos atrás, segundo as autoridades.
Um fenômeno apelidado como domo ou cúpula de calor (alta pressão estática que atua como uma tampa de panela) tem levado a registros de temperaturas elevadas em outras regiões da América do Norte.
EUA e Canadá tem alertado os moradores sobre os perigos em torno desses níveis de calor que podem persistir durante a semana.
Especialistas afirmam que as mudanças climáticas ligadas ao aquecimento global aumentarão a frequência de eventos climáticos extremos, como as ondas de calor. No entanto, é complexo associar um evento isolado ao aumento da temperatura do planeta.
Nick Miller, meteorologista da BBC, explica que essa "cúpula de calor" não é um termo meteorológico com definição clara, mas ele costuma ser associado à descrição de grandes áreas de alta pressão que resultam em céus sem nuvens e dias quentes e ensolarados.
Quanto mais tempo perdura esse cenário de alta pressão, mais severa é a onda de calor, com temperaturas podendo aumentar a cada dia.
Esta zona de alta pressão é enorme, estendendo-se da Califórnia aos territórios árticos do Canadá passando pelo interior de Idaho.
As vendas de ares-condicionados e ventiladores explodiram e abriram-se abrigos de resfriamento. Alguns bares e restaurantes, e até uma piscina, foram considerados quentes demais para funcionar.
Lytton, que fica a cerca de 250 km a nordeste de Vancouver (oeste do Canadá), quebrou o recorde canadense anterior, de julho de 1937, quando a temperatura em duas cidades da província de Saskatchewan, Yellow Grass e Midale, atingiu 45°C.
David Phillips, climatologista-sênior da Environment Canada (departamento do Ministério do Meio Ambiente do país), disse à emissora CTV: "Gosto de quebrar um recorde, mas isso é como quebrá-lo e pulverizá-lo. Faz mais calor em partes do oeste do Canadá do que em Dubai (Emirados Árabes Unidos)".
O especialista disse que existe a possibilidade de regiões do país ultrapassarem os 47°C.
Os provedores de energia da Colúmbia Britânica disseram que houve um aumento na demanda por eletricidade para manter aparelhos de ar condicionado.
A Environment Canada disse que o alerta se estende para outras regiões do país e previu uma "longa, perigosa e histórica onda de calor que persistirá esta semana", com temperaturas de 10°C a 15°C acima do normal.
Calor 'histórico' no noroeste dos EUA
O noroeste dos EUA também quebrou recordes. O Serviço Nacional de Meteorologia do país (NWS, na sigla em inglês) classificou as ondas de calor de "históricas" e disse que elas persistiriam durante a semana, "com numerosos recordes diários, mensais e até históricos que provavelmente serão estabelecidos".
Portland e Seattle, cidades com climas famosos por suas chuvas, registraram as temperaturas mais altas de sua história. A primeira quebrou seu recorde anterior quando as temperaturas atingiram 44°C, e a segunda fez o mesmo quando atingiu 40°C, segundo dados oficiais.
O Estado do Oregon, onde fica Portland, flexibilizou as restrições adotadas contra a pandemia de covid-19 para permitir a abertura de piscinas e áreas com ar-condicionado, como shopping centers. Seattle, no entanto, teve que fechar uma piscina devido às "temperaturas perigosas e inseguras no deque da piscina".
Produtores de frutas estão correndo para colher as safras, temendo que o calor possa estragar as cerejas e outros produtores. Mas a colheita precisa ser interrompida no almoço porque a temperatura se torna insuportável.
BJ Thurlby, presidente da Northwest Cherry Growers, comissão que reúne os produtores de cerejas, disse ao jornal Seattle Times: "Estamos navegando em águas absolutamente desconhecidas."
No domingo, as eliminatórias olímpicas dos Estados Unidos tiveram que ser interrompidas em Eugene, no Oregon, por causa do calor. O público foi convidado a deixar o estádio por razões de segurança. Alguns centros de vacinação também fecharam pelo mesmo motivo.
Todos os cidadãos foram aconselhados a se manterem hidratados, evitar atividades extenuantes e monitorar vizinhos mais vulneráveis.
"Emergência climática", análise de Roger Harrabin, especialista em temas ambientais
Não podemos dizer com certeza que essa onda de calor brutal foi causada por emissões de gases que agravam o efeito estufa, mas cientistas argumentam que cada onda de calor que ocorre hoje é mais provável e mais intensa devido às mudanças climáticas induzidas pela humanidade.
Na verdade, cientistas melhoraram muito a capacidade de associar eventos extremos às mudanças climáticas, como a onda de calor que atingiu a Europa em 2019 e que, segundo pesquisadores, foi 100 vezes mais provável de ocorrer por causa das emissões de gás carbônico.
O que é mais preocupante é que essas temperaturas foram atingidas com temperaturas globais apenas 1,1°C acima dos tempos pré-industriais.
O Painel Intergovernamental sobre Mudanças Climáticas considera que provavelmente ultrapassaremos 1,5°C acima desse nível em um curto espaço de tempo. E nas taxas atuais superaremos um aumento de 2°C, e possivelmente ainda mais.
No entanto, a China e a Índia continuam a construir novas usinas termelétricas a carvão. E o G7, o grupo das economias mais ricas do mundo, (Canadá, França, Alemanha, Japão, Reino Unido e EUA) não estabeleceu um prazo para acabar com esse tipo de geração de energia.
O Reino Unido e outros países ainda estão perfurando poços para queimar mais petróleo e gás, sob o argumento de que eles serão necessários até o ano de 2050.
Tudo isso certamente aponta para uma emergência climática.
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