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Oito motivos para a queda do preço do petróleo

Johannes Beck

16/02/2016 11h53

A baixa do preço da commodity causa problemas para produtores como Brasil, Venezuela, Angola e Nigéria. Entenda por que o "ouro negro" perdeu valor e por que provavelmente o mercado petroleiro nunca mais será o mesmo.

Nos últimos dois anos, o preço do petróleo caiu mais de dois terços. Em fevereiro de 2014 o barril do tipo Brent (qualidade de referência definida pelo campo de Brent no Mar do Norte) teve um pico de mais de 110 dólares. Desde então, o preço caiu para atualmente cerca de 30 dólares.

Parece que chegou ao fim a época dos preços de três dígitos, que começou em 2011. Uma fase pouco típica já que, durante muito tempo, o petróleo foi vendido por preços de um ou dois dígitos. Nas décadas de 80 e 90, era normal vender e comprar o barril de crude (petróleo bruto) por cerca de 20 dólares. Em 1999, o barril do tipo Brent até chegou a ser comercializado por menos de 10 dólares.

Será que vamos voltar a preços tão baixos? Ainda não sabemos até que ponto os preços vão continuar a queda livre dos últimos meses, mas podemos identificar um conjunto de fatores que mudou profundamente o mercado petroleiro.

1. Ascensão dos EUA como produtor

Entre 2012 e 2015, os Estados Unidos aumentaram sua produção de petróleo de 10 para 14 milhões de barris por dia e tornaram-se o maior produtor mundial, ultrapassando a Rússia e a Arábia Saudita.

A quantidade adicional que chega aos mercados através do aumento da produção nos EUA é gigantesca: os 4 milhões de barris por dia equivalem à produção conjunta da Nigéria, Angola e Líbia, três dos maiores produtores de petróleo na África.

O aumento foi possível graças a novas tecnologias inovadoras, como o fraturamento hidráulico, o chamado fracking. Através da injeção de água e líquidos químicos nas rochas subterrâneas, são ampliadas fissuras existentes. Esta tecnologia é relativamente cara, mas no ambiente de preços altos dos últimos anos foi rentável e possibilitou extrair petróleo e gás inalcançável através de poços tradicionais.

Nada ilustra melhor a mudança do papel dos Estados Unidos no mercado mundial do que o 20 de janeiro de 2016. Nesse dia, o petroleiro Theo T chegou ao porto francês de Fos, levando a bordo o primeiro petróleo exportado dos EUA em décadas. Nos anos 70, o governo americano tinha proibido as exportações para diminuir as importações, mas, graças ao aumento da produção, a proibição foi levantada em dezembro de 2015.

As exportações de crude americano ainda são esporádicas, mas os EUA dependem cada vez menos de importações. Mesmo que alguns produtores que usam o fracking desistam, devido à baixa dos preços que torna os seus negócios pouco rentáveis, o aumento da produção nos EUA decorrente das novas tecnologias mudou completamente o mercado internacional.

2. Aumento da produção no Iraque

Pouca gente notou, mas o país com o segundo maior aumento de produção em 2015 foi o Iraque. Apesar da guerra civil com o grupo jihadista "Estado Islâmico" (EI), o país passou de uma produção diária de 3,3 milhões de barris, em 2014, para 4,3 milhões de barris no final de 2015.

O aumento de 1 milhão de barris representa uma oferta adicional nos mercados que equivale aproximadamente à produção da Argélia, terceiro maior produtor africano. E o Iraque já produz mais petróleo do que antes do início da guerra com os Estados Unidos em 2003. O crude iraquiano é extraído principalmente na região autônoma dos curdos, no norte do país, a única relativamente estável do Iraque.

3. Regresso do Irã ao mercado depois do fim do embargo

Com a entrada em vigor do acordo nuclear entre o Irã e o Grupo 5+1 (Estados Unidos, Reino Unido, Rússia, China, França, mais Alemanha), em janeiro, foi levantada uma grande parte das sanções internacionais contra o país asiático.

As sanções dificultaram o acesso do Irã ao mercado petroleiro. Após as sanções, o país deve aumentar a sua produção, atualmente de cerca de 3 milhões de barris por dia, segundo relatórios da Organização dos Países Exportadores de Petróleo (Opep). A Agência Internacional de Energia (AIE) prevê um aumento de 300 mil barris ao dia até o fim de 2016, exercendo mais pressão sobre os preços mundiais.

4. Petróleo do pré-sal do Brasil

Outro país que aumentou significativamente seu volume de produção é o Brasil, que, de 2013 a 2015, passou de 2,6 para 3 milhões de barris por dia. Segundo dados da Opep, em 2015 72 novos poços entraram em função, depois de 87 em 2014. O Brasil tornou-se líder na exploração offshore em águas ultraprofundas. Foram descobertas grandes quantidades de petróleo no chamado pré-sal, camadas rochosas a uma profundidade de quatro a oito quilômetros.

Mas as perspectivas brasileiras não parecem muito animadoras. Para explorar estes jazigos são precisas tecnologias muito caras e sem viabilidade econômica em épocas de preços baixos. E a maior companhia petrolífera brasileira, a semi-estatal Petrobras, está envolvida numa série de escândalos de corrupção e já teve que cortar os planos de investimentos.

5. Arábia Saudita quer manter quota de mercado

Nas últimas décadas, a Arábia Saudita era determinante para o preço do crude. O país tem grandes reservas de petróleo e muitos poços que não operam no limite da sua produção. Portanto pode aumentar rapidamente - e com custos muito baixos - o volume de crude colocado no mercado e influenciar estrategicamente os preços. Ao contrário, também poderia reduzir sua produção para escassear o petróleo e tornar o "ouro negro" mais caro.

Mas, mesmo com um déficit orçamental recorde de 89,2 bilhões de euros em 2015 devido à queda do preço do petróleo bruto, a Arábia Saudita parece determinada a continuar a produzir mais e não menos, como seria de esperar.

Analistas dizem que o objetivo principal dos sauditas é manter a quota do mercado. O cálculo: com preços baixos, investimentos em poços com novas tecnologias como o fracking e em águas ultraprofundas deixam de ser rentáveis. Com a saída do mercado desses produtores concorrentes, a Arábia Saudita assumiria de novo um papel de país determinante.

6. Medo da crise na China

Com taxas oficiais de crescimento do Produto Interno Bruto (PIB) superiores a 6%, parece estranho falar de crise na China. Mas muitos analistas e investidores temem que, por trás desses números oficiais, se esconda uma realidade bem pior. A queda das ações nas bolsas chinesas é um indício de que o milagre econômico chinês possa estar próximo do fim.

Tais perspectivas causam muito nervosismo nos mercados, pois a economia chinesa fomentou em grande parte o boom dos recursos naturais na África, América Latina e Austrália. Nos últimos dez anos, a China aumentou seu consumo de petróleo de 7 para 11 milhões de barris por dia - o equivalente à América Latina e a África subsaariana em conjunto. Angola e o Sudão, por exemplo, vendem uma grande parte do seu petróleo à China.

Não é de estranhar que todos os indícios de uma crise na China exerçam uma enorme pressão negativa no mercado petroleiro.

7. Inverno ameno no Hemisfério Norte

O ano de 2015 foi o mais quente desde que começaram os registros de temperatura no século 19, segundo dados da americana Agência Federal para a Atmosfera e os Oceanos (NOAA). E 2016 deve ser mais um ano quente, devido ao fenômeno meteorológico "El Niño".

O inverno 2015/16 no Hemisfério Norte é tão ameno, que a procura de gasóleo para aquecimento diminuiu nos EUA, Europa e Japão. A menor demanda faz descer os preços.

8. Cartel da Opep já não funciona

Os 13 países-membros da Organização dos Países Exportadores de Petróleo - entre eles a Arábia Saudita, Iraque, Irã, Nigéria e Angola - são responsáveis por 32,3 milhões de barris por dia. Portanto, controlam cerca de um terço da produção global, de 97 milhões de barris. Teoricamente, deveria ser fácil cortar a produção para aumentar os preços. E seria de esperar, já que a Opep foi fundada como um cartel clássico, cuja função é manter os preços altos para o benefício do produtor (e em detrimento dos consumidores).

Mas até agora nenhum país membro da Opep implementou cortes. Quase todos mantiveram a produção estável ou até aumentaram o volume de crude extraído. Pelo visto, a Opep ainda não consegue travar a queda livre do preço.

O ministro do Petróleo da Venezuela, Eulogio del Pino, pediu uma reunião extraordinária da Opep e, numa ronda pelos países-membros e a Rússia, tenta reunir consenso para diminuir a produção e reverter a descida dos preços. O objetivo da Venezuela é um "preço justo", em torno de 70 dólares por barril, mais do dobro do preço atual.

Mudanças históricas

"Qualquer que seja a evolução dos preços, os mercados poderão nunca mais ser os mesmos", conclui a AIE no último relatório do mercado petroleiro. Para economias dependentes de petróleo, isso implica grandes mudanças. Angola, por exemplo, obteve com o "ouro negro" cerca de 70% das receitas fiscais em 2014. Mas, segundo dados do Ministério das Finanças angolano, esse valor caiu para a metade em 2015.

Os países petrolíferos precisam de se adaptar, para evitar um colapso econômico devido à baixa dos preços. Pois muitas das mudanças vieram para ficar.