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1991: Espião Markus Wolf entregava-se à polícia

Doris Bulau (gh)

24/09/2016 07h50

A 24 de setembro de 1991, apresentava-se à polícia na fronteira da Baviera o ex-chefe do serviço de espionagem da ex-República Democrática Alemã (RDA). Markus Wolf havia conseguido passar um ano escondido em Moscou.Parecia um roteiro de filme policial. O espião mais bem-sucedido da Europa, Markus Wolf, fugiu misteriosamente da Alemanha Oriental, poucos dias antes da cerimônia oficial da reunificação. Sua esposa, Andrea, recordou aqueles dias tensos, numa entrevista à televisão:"Sabíamos que, no dia 3 de outubro de 1990, Markus seria preso. Os advogados nos aconselharam – e nós éramos da mesma opinião – que o melhor era fugir do país. Portanto, no dia 27 de setembro, juntamos nossos papéis e fomos de carro de Berlim para a então Tchecoslováquia e, de lá, para a Áustria."A Procuradoria Geral da República, em Karlsruhe, expedira o mandado de prisão de Wolf por traição à pátria. O espião, que há tempos abandonara o serviço público e se tornara escritor de renome, crítico das lideranças da Alemanha Oriental e autocrítico de sua atividade no Ministério da Segurança, era quase um dissidente. O que o tornava um personagem interessante, tanto para os serviços secretos ocidentais quanto do Leste Europeu.Missão de espionagemWolf deixou a barba crescer e conseguiu se esconder das autoridades austríacas. Quatro semanas depois de escapar da Alemanha Oriental, telefonou para um número secreto em Moscou. O casal foi levado para o aeroporto num carro da KGB – o serviço secreto soviético – e voou para Moscou. Assim, o ex-chefe de espionagem voltou, perigosamente, às suas origens. Após um ano de asilo político, o casal deixou Moscou e retornou à Áustria.No dia 24 de setembro de 1991, Markus Wolf se entregou às autoridades alemãs. A Alemanha Oriental, de onde havia fugido, já não existia mais. Com duas limusines blindadas, foi levado a Karlsruhe, onde permaneceu apenas sete dias na cadeia. Em maio de 1993, foi julgado em Düsseldorf. Condenado a seis anos de prisão por traição à pátria e suborno, pouco depois passou à liberdade condicional.Durante o processo no Tribunal do Estado da Renânia do Norte-Vestfália, ficaram evidentes as dimensões do aparato delator da Stasi (serviço secreto da ex-RDA). Mil funcionários fixos e 10 mil "colaboradores inoficiais" atuavam na Alemanha Oriental, enquanto 1500 informantes espionavam na Alemanha Ocidental. Eram "soldados" do Partido Comunista, aventureiros, criminosos por convicção, idealistas e até parlamentares.Milhares de espiões Os subordinados de Wolf espreitavam por toda parte: nos ministérios, repartições públicas, partidos e inclusive por cima dos muros dos vizinhos. A vítima mais famosa foi Willy Brandt. O líder social-democrata, precursor e arquiteto dos Tratados do Leste, tropeçou em seu assessor, Günter Guilleaume, informante de Wolf, e acabou tendo que renunciar.Sobre sua atividade, Wolf declarou, posteriormente, que a via como missão política da direção do partido. "Para mim, isso não fazia parte do aparato repressor, como se diz hoje. Aquilo era uma missão de espionagem, algo romântico, importante e respeitável, que eu conhecia de antigos filmes da União Soviética", alega.Markus Johannes Wolf sempre foi considerado brilhante. Nascido no sul da Alemanha em 19 de janeiro de 1923, filho de médico judeu, cresceu em ambiente burguês, mas foi educado no credo comunista. Em 1934, a família buscou refúgio dos nazistas na União Soviética. Wolf estudou na escola de aeronáutica de Moscou e em 1942 ingressou no Partido Comunista. Entre 1943 e 1945, trabalhou como redator e locutor numa rádio alemã em Moscou.Após a guerra, começou a trabalhar numa rádio em Berlim e fez a cobertura do julgamento dos criminosos nazistas, no Tribunal de Nurembergue. Aos 29 anos, assumiu o serviço secreto na condição de general mais jovem da RDA. Teve uma carreira fulminante e colecionou várias condecorações. Em 1997, publicou suas memórias .