Opinião: Alemanha, o país do "continue assim"
Esta é a "profunda mudança" prometida pela DFB: Joachim Löw fica no comando da seleção alemã. O que esperar disso? Nada de bom, opina o jornalista esportivo Joscha Weber.Que eles não iriam deixá-lo em paz estava claro. Os paparazzi já estavam havia muito tempo a postos quando Joachim Löw passou pelo centro histórico de Freiburg no seu Mercedes-Benz 280 SL Pagode da cor preta, no sábado de manhã.
Enquanto o técnico da seleção alemã se sentava no Café Auszeit (sim, o café se chama mesmo Intervalo) e, de óculos escuros, camisa clara e cigarro na boca, meditava cheio de estilo diante dos fotógrafos, seu carro recém-polido brilhava no meio-fio.
Unidades semelhantes desse cabriolé dos anos 1960 são cotadas a 100 mil euros entre os aficionados. Trata-se, bem a propósito, de um clássico que nunca sai de moda.
Ok, a analogia entre o técnico e o seu carro pode até ser barata, mas faz sentido: nos dois casos, o brilho vem de tempos antigos.
E aí, de repente, o motor (meio de campo) da máquina, já entrado em anos, dá uma tossida. Pelo jeito, todas as partes (da equipe) estão defeituosas. E quem está no volante toma as decisões erradas. A perda, pouco depois do início da corrida na Rússia, é total. Na opinião de muitos especialistas, o melhor a fazer é encontrar um modelo com mais chances de vitória.
Mas há um porém: o carro é um clássico que todos amam – e supostamente o melhor disponível.
Em outras palavras: Joachim Löw fica no comando da seleção alemã, como a DFB confirmou nesta terça-feira (03/07). A decisão não chega a ser uma surpresa, depois de inúmeras figuras do futebol alemão terem passado os últimos dias implorando de joelhos para que ele ficasse.
Todos eles queriam Löw – apesar de ele ter fracassado e, "como técnico, ter a responsabilidade" pelo que aconteceu. Que Löw queira seguir adiante mesmo na hora mais difícil e queira ele mesmo tirar o carro do atoleiro é algo que merece respeito, assim como sua carreira de sucesso até a Copa da Rússia.
Löw poderia ter ido embora em 2014, como campeão e com a missão cumprida. Löw também poderia ter ido embora em 2018, como responsável pelo enorme fracasso e mostrando compostura. Mas Löw vai ficar. E a principal explicação para isso é: ninguém na DFB tem uma ideia melhor.
Não havia e não há um plano B para Löw na maior federação esportiva do mundo, com seus sete milhões de associados. O mundo é cheio de técnicos talentosos e experientes. Mas, pelo jeito, não deu para chegar a um acerto com nenhum dos possíveis candidatos, algo que deveria ser banal no futebol profissional.
Ralf Rangnick e Matthias Sammer poderiam modernizar o futebol alemão com seus novos conceitos. E, sim, Jürgen Klopp, Thomas Tuchel e Julian Nagelsmann são tremendamente bem pagos pelos seus clubes e têm contrato em andamento. Mas será que isso é mesmo uma barreira intransponível para uma federação rica como a DFB?
O que se pode esperar quando o presidente da DFB, Reinhard Grindel, fala em "mudanças profundas" e "reviravolta" e aparece com um "continue assim"? Nada de bom. Fica claro que a DFB tem medo de mudanças e se agarra ao consolidado, enquanto, à sua volta, o futebol se transforma.
O futebol de posse de bola de Löw, inspirado na Espanha, já deu o que tinha de dar, como mostra as eliminações precoces de quase todas as seleções que adotam essa filosofia. A seleção alemã fez dois gols minguados, nenhum outro time marcou menos nesta Copa e nenhum outro aproveitou tão mal as chances que criou.
Pelo jeito ninguém na DFB se deu conta de que as equipes que estão brilhando são aquelas que jogam um futebol de contra-ataque rápido, sem firulas e de pouca posse de bola.
Dá para entender que Löw queira ficar no cargo de técnico da seleção e manter a mordomias e a atenção que ele curte já há 12 anos. Também dá para entender que ele gostaria de se despedir com um título. Agora, que a DFB, depois dessa eliminação vergonhosa da Alemanha, simplesmente dê de ombros, alegando falta de opções, e aposte na mudança sem mudar nada é atestado de incapacidade.
Assim como a CDU, da chanceler federal Angela Merkel, a DFB tem medo de derrubar o rei, mesmo depois de uma longa fase de fracassos e derrotas.
Alemanha, o país do "continue assim".
Joscha Weber é editor-chefe da Editoria de Esportes online da DW.
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Enquanto o técnico da seleção alemã se sentava no Café Auszeit (sim, o café se chama mesmo Intervalo) e, de óculos escuros, camisa clara e cigarro na boca, meditava cheio de estilo diante dos fotógrafos, seu carro recém-polido brilhava no meio-fio.
Unidades semelhantes desse cabriolé dos anos 1960 são cotadas a 100 mil euros entre os aficionados. Trata-se, bem a propósito, de um clássico que nunca sai de moda.
Ok, a analogia entre o técnico e o seu carro pode até ser barata, mas faz sentido: nos dois casos, o brilho vem de tempos antigos.
E aí, de repente, o motor (meio de campo) da máquina, já entrado em anos, dá uma tossida. Pelo jeito, todas as partes (da equipe) estão defeituosas. E quem está no volante toma as decisões erradas. A perda, pouco depois do início da corrida na Rússia, é total. Na opinião de muitos especialistas, o melhor a fazer é encontrar um modelo com mais chances de vitória.
Mas há um porém: o carro é um clássico que todos amam – e supostamente o melhor disponível.
Em outras palavras: Joachim Löw fica no comando da seleção alemã, como a DFB confirmou nesta terça-feira (03/07). A decisão não chega a ser uma surpresa, depois de inúmeras figuras do futebol alemão terem passado os últimos dias implorando de joelhos para que ele ficasse.
Todos eles queriam Löw – apesar de ele ter fracassado e, "como técnico, ter a responsabilidade" pelo que aconteceu. Que Löw queira seguir adiante mesmo na hora mais difícil e queira ele mesmo tirar o carro do atoleiro é algo que merece respeito, assim como sua carreira de sucesso até a Copa da Rússia.
Löw poderia ter ido embora em 2014, como campeão e com a missão cumprida. Löw também poderia ter ido embora em 2018, como responsável pelo enorme fracasso e mostrando compostura. Mas Löw vai ficar. E a principal explicação para isso é: ninguém na DFB tem uma ideia melhor.
Não havia e não há um plano B para Löw na maior federação esportiva do mundo, com seus sete milhões de associados. O mundo é cheio de técnicos talentosos e experientes. Mas, pelo jeito, não deu para chegar a um acerto com nenhum dos possíveis candidatos, algo que deveria ser banal no futebol profissional.
Ralf Rangnick e Matthias Sammer poderiam modernizar o futebol alemão com seus novos conceitos. E, sim, Jürgen Klopp, Thomas Tuchel e Julian Nagelsmann são tremendamente bem pagos pelos seus clubes e têm contrato em andamento. Mas será que isso é mesmo uma barreira intransponível para uma federação rica como a DFB?
O que se pode esperar quando o presidente da DFB, Reinhard Grindel, fala em "mudanças profundas" e "reviravolta" e aparece com um "continue assim"? Nada de bom. Fica claro que a DFB tem medo de mudanças e se agarra ao consolidado, enquanto, à sua volta, o futebol se transforma.
O futebol de posse de bola de Löw, inspirado na Espanha, já deu o que tinha de dar, como mostra as eliminações precoces de quase todas as seleções que adotam essa filosofia. A seleção alemã fez dois gols minguados, nenhum outro time marcou menos nesta Copa e nenhum outro aproveitou tão mal as chances que criou.
Pelo jeito ninguém na DFB se deu conta de que as equipes que estão brilhando são aquelas que jogam um futebol de contra-ataque rápido, sem firulas e de pouca posse de bola.
Dá para entender que Löw queira ficar no cargo de técnico da seleção e manter a mordomias e a atenção que ele curte já há 12 anos. Também dá para entender que ele gostaria de se despedir com um título. Agora, que a DFB, depois dessa eliminação vergonhosa da Alemanha, simplesmente dê de ombros, alegando falta de opções, e aposte na mudança sem mudar nada é atestado de incapacidade.
Assim como a CDU, da chanceler federal Angela Merkel, a DFB tem medo de derrubar o rei, mesmo depois de uma longa fase de fracassos e derrotas.
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