Extrema direita russa está dividida sobre guerra na Ucrânia
Algumas dezenas de pequenos grupos compõem hoje o cenário nacionalista de direita da Rússia. Eles se chamam Movimento Nacionalista, Rússia Conservadora, ou simplesmente Os Conservadores. Alguns apoiam o presidente Vladimir Putin e estão lutando ao lado das tropas russas na Ucrânia, enquanto outros rejeitam o Kremlin.
Um exemplo de quão fragmentado é o cenário da extrema direita na Rússia foram as diferentes posições que esses grupos tomaram em 2014 em reação ao movimento pró-Europa Maidan e ao início do conflito na região de Donbass, no leste da Ucrânia.
A ofensiva militar russa na Ucrânia apenas alimentou as divisões entre nacionalistas. Quando a Rússia invadiu a vizinha Ucrânia em 24 de fevereiro, alguns extremistas de direita se juntaram imediatamente ao esforço da guerra, mas outros rejeitaram a invasão.
Kremlin contra qualquer oposição
De acordo com um novo relatório do Centro de Informação e Análise (Sova), um instituto de pesquisa sobre racismo sediado em Moscou, os grupos de extrema direita não estão muito difundidos pela Rússia. Isso se deve principalmente ao fato de que o Kremlin não tolera oposição.
Os protestos e manifestações de rua no país foram completamente proibidos, supostamente devido a preocupações de saúde com a covid-19.
Mesmo assim, as autoridades começaram a negar autorizações aos organizadores das marchas nacionalistas russas em 2019, antes do início da pandemia. Ainda antes, em 2016, o conhecido extremista Dmitry Demushkin foi condenado à prisão por dois anos e meio. Em 2017, as autoridades bloquearam o site do popular grupo nacionalista Sputnik e Pogrom.
Embora o Kremlin tenha conseguido desmantelar quase todas as organizações nacionalistas do país, as ideias que elas propagam continuam a refletir sentimentos populares entre muitos russos, diz Lev Gudkov, chefe do Centro Levada, um instituto independente de pesquisas sediado em Moscou que o Kremlin rotulou como "agente estrangeiro" em 2016.
Gudkov diz que muitos russos rejeitam outras etnias e cita o grupo online de direita Estado Masculino como exemplo. O grupo propaga uma visão patriarcal e nacionalista do mundo e chamou a atenção no verão de 2021 com uma campanha de assédio dirigida à cadeia de restaurantes asiáticos Tanuki.
O assédio se concentrou em uma campanha publicitária que apresentava bandeiras do arco-íris e modelos africanos. A Tanuki foi então submetida a uma onda interminável de falsos pedidos de comida e revisões negativas de restaurantes. Algumas lojas chegaram a receber ameaças de bomba.
De acordo com Gudkov, o principal impulso para a atividade desses grupos é um tipo de "racismo cotidiano não agressivo". "Eles não são nacionalistas que insistem na superioridade da raça branca", acrescentou. "Eles propagam a ideia de um sistema nacional-democrático."
Divididos sobre a guerra na Ucrânia
No entanto, há pouco consenso sobre como tal sistema deveria ser. E essa falta de acordo tirou dos nacionalistas a oportunidade de apresentar uma frente unida, diz Vera Alperovich, especialista do Sova e co-autora do relatório Xenofobia, Liberdade de Consciência e Antiextremismo na Rússia em 2021.
Um dos mais conhecidos grupos nacionalistas pró-Kremlin na Rússia é o autoproclamado coletivo de "sabotagem e reconhecimento" Força Tarefa Rusich. Segundo Alperovich, o Rusich, alinhado ao grupo mercenário Wagner, é uma organização neonazista que utiliza símbolos como as suásticas e o código numérico 14/88, que glorifica a raça branca e Adolf Hitler.
Entre os que atualmente apoiam o Rusich na Ucrânia estão vários membros do grupo musical Russian Banner. Em entrevistas, o líder da banda Evgeny Dolganov explicou que grupo quer espalhar opiniões nacionalistas patrióticas entre os seus fãs jovens.
Quando a DW o confrontou com as acusações de neonazismo e tendências fascistas no grupo, ele ofereceu o que chamou de sua "resposta padrão": "Não somos fascistas. Somos muito piores. Pior para nossos inimigos! Somos homens e mulheres normais que querem viver em nosso país e criar nossos filhos (meninos e meninas) de acordo com a tradição."
Com a guerra, Dolganov acredita que o Kremlin está protegendo "o povo russo na Ucrânia de serem forçados a ter uma identidade falsa, ucraniana e russofóbica imposta a eles". Dolganov diz que o objetivo do movimento é "lutar contra a injustiça e a substituição da população, e pela prosperidade".
Ele diz que uma grande maneira de resumir tudo isso é dizer que eles estão lutando "pelo nosso futuro e pelo de nossas crianças brancas".
Oposição ao "mundo russo" de Putin
Mas muitos outros grupos, que o sociólogo Gudkov chama de nacionalistas-democratas, têm se manifestado contra a guerra da Rússia contra a Ucrânia. Um deles é o ex-preso Dmitry Demushkin. "O Batalhão Russo e a Legião Imperial estão sendo liderados por um de meus ex-combatentes", disse.
Hoje Demushkin se vê como um "nacionalista tradicional", mas antes ele organizou "marchas russas" e liderou várias associações de direita que o governo rotulou de extremistas. Agora, ele usa redes sociais para pedir o fim da guerra da Rússia na Ucrânia, criticando-a como "fratricida".
Depois que autoridades em Moscou baniram a organização de Demushkin e ele foi preso por alegar que "a Rússia precisa de uma autoridade estatal russa", ele perdeu toda a fé em Vladimir Putin.
Ele também diz não acreditar mais na visão de Putin de construir um "mundo russo", uma civilização que seria única e não ocidental.
Demushkin diz que não está claro que tipo de "mundo russo" o Kremlin está tentando impor à Ucrânia: "Tribunais corruptos, governos poderosos não eleitos pelo povo, censura, restrições, leis penais e banimentos? É por isso que eles estão indo para lá com tanques e não ideias", afirma.
Lema "Rússia para os russos" atrai adeptos
Mesmo que os nacionalistas russos lutando na Ucrânia atraiam a atenção da imprensa, seus grupos não são tão populares em seu país. Os observadores dizem que as organizações e partidos de direita na Rússia estão muito longe do tamanho ou da influência que tiveram nos anos 2000.
A especialista do Sova, Vera Alperovich, diz que o número real de membros ativos afiliados a grupos nacionalistas no país é pequeno. Ela acrescenta que não há mais "grandes estrelas na constelação de ultradireita", o que provavelmente deve-se à falta de uma vida política no país.
Gudkov, no entanto, oferece uma visão diferente, e lembra do grito de guerra "Rússia para os russos", que ele diz ser mais popular agora do que em qualquer outro momento nos últimos 30 anos.
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