JD Vance está errado sobre AfD e resistência ao nazismo

JD Vance está errado sobre AfD e resistência ao nazismo - Segundo futuro vice-presidente americano, partido da ultradireita alemã seria mais popular nas regiões onde houve maior resistência ao regime nazista. Pesquisadores contradizem essa afirmativa.Primeiro o homem mais rico do mundo, Elon Musk, agora JD Vance: às vésperas das eleições legislativas antecipadas da Alemanha, homens poderosos dos Estados Unidos se manifestam a favor do partido ultradireitista Alternativa para a Alemanha (AfD).

As declarações recentes do futuro vice do presidente americano eleito, Donald Trump, são polarizadoras. Além de criticar a mídia de seu país, que estaria difamando a AfD como sendo alinhada com o nazismo, numa postagem no X com mais de 5 milhões de cliques, Vance afirma que a AfD é mais popular nas regiões alemãs onde houve mais resistência aos nazistas.

Essa afirmativa é falsa: resultados de urnas e pesquisas sobre correlações geográficas do comportamento eleitoral sugerem antes o contrário.

Alguns veículos americanos, como o jornal The New York Times, ou mesmo a emissora Fox News, de orientação conservadora e alinhada ao Partido Republicano, de fato associam em parte a AfD com o nazismo – também pelo fato de ela própria em parte empregar palavras de ordem nazistas.

Eleitorado da AfD se concentra na antiga Alemanha Oriental

Assim, em 2021 o político da AfD e ex-professor de história Björn Höcke foi condenado por proferir publicamente o slogan "Tudo pela Alemanha" (Alles für Deutschland) – originalmente adotado pela organização paramilitar SA, do Partido Nacional-Socialista dos Trabalhadores Alemães (NSDAP) e, portanto, proibido.

Além disso, alguns diretórios estaduais da AfD, assim como o núcleo jovem Junge Alternative, foram declarados extremistas de direita e a sigla como um todo está sob suspeita de extremismo pelo serviço secreto interno da Alemanha.

A copresidente Alice Weidel chegou a definir o 8 de Maio, data da libertação da Alemanha do regime nazista, como uma derrota do país.

Quanto à afirmativa de JD Vance, de que os seguidores da AfD se concentrariam em regiões que combateram os nazistas, ela não é sustentada por fatos.

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A maioria das atuais pesquisas eleitorais para as eleições antecipadas de 2025 apresenta apenas previsões para o resultado de todo o país, sem nuances regionais. Porém, nas legislativas de 2021, a AfD teve desempenho forte em estados do leste, antes pertencentes à extinta República Democrática Alemã (RDA), sob regime comunista.

O quadro foi semelhante no pleito para o Parlamento Europeu de junho de 2024, quando a AfD saiu vitoriosa sobretudo no Leste Alemão: em Mecklemburgo-Pomerânia Ocidental, Brandemburgo, Saxônia-Anhalt, Saxônia e Turíngia, ela alcançou no mínimo 27% dos votos, enquanto sua média nacional foi de 15,9%.

Leste Alemão, bastião anti-Hitler?

Mas a questão central, no caso, é se nessas regiões a resistência ao regime de Adolf Hitler foi de fato tão forte quanto pretende o futuro vice-presidente americano. O NSDAP tomou o poder em 1933, e na eleição anterior para o Reichstag, em 6 novembro de 1932, ficara à frente com 33,1%.

Se forem considerados os resultados regionais, o NSDAP recebeu a maioria dos votos em grande parte da Alemanha, incluindo o Leste e também as regiões onde muitas pessoas hoje votam na AfD, mas também muitas outras regiões da Alemanha.

No pleito parlamentar seguinte, em março de 1933, o NSDAP se mostrou ainda mais forte, alcançando a maior parte dos votos na maior parte das zonas eleitorais, em especial no Norte e no Leste do país. Entretanto essa eleição é historicamente considerada não democrática, já que o partido e seus adeptos intimidaram maciçamente os votantes, em parte com violência.

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Nada disso confirma a postagem de JD Vance no X. "Os resultados de nossas pesquisas contradizem claramente essa afirmativa", reforça o pesquisador Felix Hagemeister, coautor de uma pesquisa da Universidade Ludwig-Maximilian, em que se analisam as circunstâncias geográficas da eleição que oficializou a tomada de poder pelos nazistas.

Ao contrário, do ponto de vista geográfico, houve em 1933 grande apoio eleitoral ao NSDAP em locais onde hoje a AfD é mais votada, diz Hagemeister. Ele ressalva, porém, que "seria falso apontar aí uma causalidade". Trata-se, antes, de uma continuidade, de tendências direitistas transmitidas de geração a geração. "Pesquisas demonstram que os filhos tendem a adotar os posicionamentos dos pais", menciona o pesquisador.

Num artigo para a Central Federal Alemã de Educação Política (BPB), o autor Christian Booss desaconselha comparações entre os eleitores da AfD e os do NSDAP, assim como entre as duas legendas. Uma análise mostrou em 2024, por exemplo, que o apoio à AfD é, em parte, também determinado por fatores socioeconômicos – ou seja, as condições de vida em cada região –, e fatores culturais e ideológicos são também relevantes.

Autor: Kathrin Wesolowski

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