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Presença da extrema direita no 2º turno já não desperta comoção na França

27/04/2017 06h00

Luis Miguel Pascual.

Paris, 27 abr (EFE).- Passados 15 anos desde que o candidato da extrema direita Jean-Marie Le Pen passou para o segundo turno das eleições presidenciais francesas, o movimento de protesto contra sua filha Marine não consegue reunir a mesma indignação popular que a de outrora contra seu pai.

Em 2002, quando Jean-Marie Le Pen chegou de forma inesperada ao segundo turno, milhares de pessoas saíram às ruas para expressar sua oposição ao velho líder ultradireitista, mas agora, depois que sua filha repetiu a façanha e enfrentará o social liberal Emmanuel Macron no dia 7 de maio, os protestos são em menor número e pouco concorridos.

O coletivo SOS Racisme, que luta contra a xenofobia e que não oculta sua aversão pela candidata da Frente Nacional (FN), conseguiu reunir apenas um par de milhares de pessoas em todo o país na segunda-feira passada para protestar contra Marine Le Pen.

Nada parecido com as manifestações espontâneas que há 15 anos protestaram contra Jean-Marie Le Pen.

Marine também não tem diante de si o "muro Le Pen" que tanto atrapalhou seu pai, quando nenhum dirigente político que não procedesse da extrema direita deixou de pedir votos para Jacques Chirac.

O presidente dessa ONG contra o racismo, Dominique Sopo, disse à Agência Efe que lamenta a "amnésia" dos franceses, que "esqueceram o espírito da FN ofuscados por sua maquiagem pesada".

"Para uma grande parte da população a FN é um partido a mais, esquecem que, embora tenham mudado a comunicação, continuam tendo a mesma ideologia", assegurou outro dirigente dessa ONG, Blaise Cueco.

Por sua vez, a presidente da Liga de Direitos Humanos (LDH), Françoise Dumont, declarou à Efe que "a maquiagem feita por Marine Le Pen no partido funcionou".

Por essa razão, a SOS Racisme vai iniciar uma campanha para mostrar "o verdadeiro rosto" do partido de Le Pen, "fundado por colaboracionistas do nazismo e que continua tendo dirigentes que procedem de grupos violentos da extrema direita".

"Há 15 anos votar em Le Pen te marcava. Mas, desde então, as declarações racistas se normalizaram", ponderou Cueco.

A dirigente da ONG também direciona suas críticas para o ex-presidente conservador Nicolas Sarkozy, que durante seu mandato pôs em primeiro plano "o debate sobre a identidade nacional que abriu a porta ao racismo".

Cueco sustentou, além disso, que o programa de Marine Le Pen "é mais perigoso que o de seu pai", que era "mais liberal na economia", frente a um projeto "fascista, de estatização generalizada", que é proposto agora pela candidata.

O patriotismo e a preferência pela França substituíram o racismo no imaginário popular na hora de identificar a FN.

Jean-Marie Le Pen, que minimizava o holocausto ou prometia limpar o país de muçulmanos, surpreendeu ao passar para o segundo turno. O voto da esquerda se pulverizou, o que debilitou o candidato socialista, o então primeiro-ministro Lionel Jospin, que ficou a menos de 200.000 votos do candidato da extrema direita.

"Agora é diferente. A FN vem fazendo bons resultados há vários anos e todo mundo anunciava que estaria no segundo turno. A consciência antirracista está anestesiada", opinou Cueco.

"Há pessoas que votam em Le Pen como forma protesto, mas sem pensar que ela pode realmente chegar ao Palácio do Eliseu", completou Dumont.

Na mira dos defensores dos direitos humanos está a postura do candidato de extrema esquerda, Jean-Luc Mélenchon, quarto colocado no primeiro turno e o único dos principais concorrentes que não pediu votos para Macron.

"É catastrófico. Acredito que ele se deixou levar pela decepção, mas o que está fazendo é extremamente dramático. Não há nada pior que o fascismo e, nestes assuntos, não se pode brincar com fogo", alertou Cueco.

O partido França Insubmissa de Mélenchon não deixou de criticar as propostas de Macron, algo que não aconteceu em 2002, quando a comoção provocada pela passagem de Le Pen para o segundo turno ofuscou todo o debate político.

O candidato social liberal "vendeu uma imagem triunfalista que não lhe está ajudando", comentou Sopo, que considerou "fora de lugar a festa da noite do domingo passado, quando a extrema direita estava no segundo turno".

Além de Mélenchon, alguns dirigentes do partido conservador Os Republicanos também se mostraram contrários a apoiar Macron contra Le Pen.

"É escandaloso. O principal rival agora é a abstenção e alguns políticos preferem pensar em seu futuro antes do que espantar o fantasma da extrema direita", advertiu Cueco.

Por fim, a presidente da LDH afirmou que Macron "é um candidato desconhecido que não revelou muitos aspectos de seu programa", o que "gera mais rejeição", mas alerta para o perigo de "ficar em casa".

"Se Le Pen ganhar, no próximo dia 8 de maio os franceses se levantarão da cama com a mesma comoção com a qual acordaram em 2002", previu.