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Escassez de registros de óbitos em países africanos dificulta monitoramento da covid-19

Funeral em Soweto, na África do Sul, durante a pandemia de coronavírus  - Siphiwe Sibeko -24.abr.2020 /Reuters
Funeral em Soweto, na África do Sul, durante a pandemia de coronavírus Imagem: Siphiwe Sibeko -24.abr.2020 /Reuters

Giulia Paravicini

Da Reuters, em Adis Abeba

13/07/2020 10h07

Muito tempo depois de o financiamento de seu projeto ser congelado, Bilal Endris mantém uma vigilância solitária nos cemitérios da capital da Etiópia dando dinheiro aos sepultadores para que eles alertem sua equipe para qualquer salto repentino nos enterros.

Em uma nação na qual menos de 2% das mortes são registradas, um aumento de enterros pode ser um dos primeiros sinais de que uma doença mortífera está se alastrando.

O programa foi criado para monitorar óbitos ligados ao HIV e à AIDS uma década atrás. Agora, o doutor Bilal monitora um aumento de fatalidades ligadas à Covid-19.

Projetos como o seu estão sendo montados em outros países da África em que muitas mortes não são registradas, o que torna difícil avaliar a escala de uma doença. Em alguns casos, países estão reativando programas criados durante surtos de Ebola.

O próprio Bilal conseguiu um financiamento adicional para reativar o programa em todos os 73 cemitérios de Adis Abeba, e não somente nos 10 atuais.

Sozinhos, oito países africanos — Argélia, Cabo Verde, Djibouti, Egito, Ilha Maurícia, Namíbia, Seychelles e África do Sul — já registraram mais de 75% das mortes, de acordo com a Organização das Nações Unidas (ONU).

Em outras regiões nas quais dados oficiais estão disponíveis de imediato, pesquisadores usaram o número de mortes de todas as causas que ultrapassam a média daquele período do ano para ajudar a calcular o número relativo à pandemia de coronavírus.

"Na Etiópia, e em todo canto da África... estamos ficando cegos", disse Bilal à Reuters. "Eu queria fazer com que o sistema de saúde se baseasse em indícios."

Na capital Adis Abeba, menos de 20% das mortes ocorrem em hospitais, disse Bilal, por isso monitorá-las exige conversar com líderes comunitários e locais de enterro.

Na Nigéria, a nação mais populosa do continente, reportagens que citaram sepultadores alertaram as autoridades para um surto não detectado de Covid-19 em Kano, uma cidade do norte, em abril, quando as mortes saltaram da média diária de 11 para 43.

Embora as cifras oficiais ainda sejam baixas — 7.650 casos confirmados e 127 mortes até a noite de domingo — o surto etíope está se acelerando. Agora a Universidade de Adis Abeba está dando apoio suficiente para Bilal reativar o programa em todos os 73 cemitérios da cidade.