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Canhão de água na Bélgica: as histórias por trás das imagens de 2021

Homem recebe um jato de canhão de água durante confrontos, enquanto pessoas se reuniam em um parque em desafio às restrições belgas devido à covid-19, em Bruxelas - Yves Herman/Reuters
Homem recebe um jato de canhão de água durante confrontos, enquanto pessoas se reuniam em um parque em desafio às restrições belgas devido à covid-19, em Bruxelas Imagem: Yves Herman/Reuters

28/12/2021 04h00

De imigrantes tentando chegar à Europa e aos Estados Unidos até conflitos armados e protestos ao redor do mundo, os fotógrafos da agência Reuters testemunharam alguns dos eventos mais importantes do ano.

Abaixo se encontra uma seleção de algumas fotos excepcionais registradas pela Reuters em 2021, juntamente com as histórias por trás delas, contadas diretamente pelos fotógrafos que as tiraram.

O UOL separou essas imagens em cinco textos que serão publicados ao longo da semana. Este é o segundo, clique aqui para ver o primeiro.

Yves Herman: "Para conter a crescente onda de contágios de covid-19, a Bélgica anunciou em março seu terceiro 'lockdown' desde o início da pandemia, fechando escolas e grande parte das empresas e comércio por quatro semanas.

Irritado com as restrições, um grupo no Facebook anunciou que uma festa não autorizada, ou 'La Boum', ocorreria em um parque em Bruxelas. O encontro, que atraiu cerca de 2.000 pessoas, desafiava o limite imposto pelo governo de reunião de não mais que quatro pessoas nas ruas.

Os confrontos entre policiais e manifestantes ocorreram em vários pontos do parque. O homem na foto, sendo atingido por um canhão de água da polícia, é um ex-professor que decidiu participar do encontro. Ele começou a caminhar na direção do cordão policial enquanto o canhão era disparado. O homem não sofreu ferimentos graves."

Manifestantes deitam no chão após a polícia abrir fogo para dispersar um protesto contra o golpe, em Mandalay, Mianmar - Reuters - Reuters
Manifestantes deitam no chão após a polícia abrir fogo para dispersar um protesto contra o golpe, em Mandalay, Mianmar
Imagem: Reuters

Soe Zeya Tun: "Mianmar enfrentou caos por todo o país após o golpe militar. Contatei fotógrafos que conhecia baseados em Mianmar para que nos enviassem fotos da situação que se desenrolava. Com a internet cortada em todo o país, tornou-se um desafio a comunicação com os fotógrafos presentes no local.

A 'Reuters' soube de uma mulher jovem chamada Angel. Também conhecida como Kyal Sin, que tinha sido morta em um protesto em 3 de março. Imagens dela começaram a circular nas redes sociais. Nesse dia em particular, nós recebemos fotos de um fotógrafo free-lance presente em um dos protestos e notamos que parecia ser o mesmo no qual Angel foi morta. Pedimos ao fotógrafo, cuja identidade a 'Reuters' não divulga para sua segurança, que checasse cuidadosamente todas suas fotos e, em questão de minutos, ele encontrou quatro ou cinco de Angel pouco antes de sua morte."

O fotógrafo free-lance disse: 'Estou tirando fotos do protesto contra o golpe desde antes da polícia e soldados começarem a dispersar os manifestantes. Essa foto foi tirada quando começaram a disparar balas de borracha, munição real e gás lacrimogêneo contra os manifestantes.

Após registrar essa imagem, consegui continuar tirando fotos por apenas mais poucos minutos antes de precisar me refugiar em um apartamento próximo, quando a situação se tornou perigosa demais. A foto foi tirada pouco antes de Angel morrer'."

Policiais em motos cercam um colega ferido durante uma manifestação contra a repressão policial contra aglomerações, em Atenas - Alkis Konstantinidis/Reuters - Alkis Konstantinidis/Reuters
Policiais em motos cercam um colega ferido durante uma manifestação contra a repressão policial contra aglomerações, em Atenas
Imagem: Alkis Konstantinidis/Reuters

Alkis Konstantinidis: "A Grécia é conhecida por confrontos durante manifestações, mas os protestos em 2021 contra a violência policial foram alguns dos mais difíceis de cobrir, dado que ocorreram em subúrbios populosos à noite.

Uma manifestação ocorreu em Nova Smyrni, um subúrbio de Atenas, provocada por um vídeo que parecia mostrar policiais batendo em um homem, durante checagens de cumprimento das restrições por causa da covid-19. Os manifestantes avançaram contra uma delegacia próxima e o clima foi se tornando cada vez mais tenso. Em um bloqueio policial em frente da delegacia, eles começaram a lançar bombas incendiárias, pedras e disparar sinalizadores. A tropa de choque da polícia cercou a multidão e disparou gás lacrimogêneo e um canhão de água para tentar dispersar os manifestantes.

Me aproximei de uma passagem subterrânea onde os principais confrontos estavam ocorrendo. Perto dali, vi um grupo de policiais em motos tentando passar pelo centro da manifestação. Um grande grupo de manifestantes pegou o policial do último veículo por trás e o derrubou no chão. Evitando pedras e as bombas incendiárias, segui na direção do policial cujos colegas correram para ajuda-lo. Ele estava seriamente ferido e não se movendo. O policial foi tratado por cortes, hematomas e uma concussão, mas se recuperou."

Polícia detém uma mulher enquanto pessoas se reúnem em um memorial no coreto de Clapham, após o sequestro e assassinato de Sarah Everard, em Londres - Hannah McKay/Reuters - Hannah McKay/Reuters
Polícia detém uma mulher enquanto pessoas se reúnem em um memorial no coreto de Clapham, após o sequestro e assassinato de Sarah Everard, em Londres
Imagem: Hannah McKay/Reuters

Hannah McKay: "Esta foto foi tirada após uma vigília por Sarah Everard, uma jovem cujo sequestro e assassinato por um policial em Londres, poucos dias antes, provocou uma onda de revolta no Reino Unido. Ela mostra uma manifestante, a estudante Patsy Stevenson, sendo detida por policiais. A foto se transformou na imagem que capturava o sentimento nacional de raiva com a insegurança que as mulheres enfrentavam no Reino Unido e ao redor do mundo.

Eu passei o dia no coreto de Clapham, onde centenas de pessoas formaram um anel ao seu redor, para realização de um minuto de silêncio. Quando um pequeno grupo de manifestantes começou a falar para a multidão, a polícia chegou imediatamente para acabar com a vigília, devido às restrições relacionadas ao coronavírus. À medida que escurecia, o clima passou de emotivo reflexivo para um mais furioso.

Patsy era uma das últimas pessoas que restavam no coreto e foi imobilizada com o rosto voltado para o chão, com suas mãos nas costas. Estava escuro, havia muita gritaria e ela claramente estava perturbada. Essa foto dela no chão foi tirada minutos depois, assim que a situação se acalmou levemente.

Continuei fotografando por mais outra hora. Apenas quando cheguei em casa, vi o Twitter e vi as reações ao protesto, foi que percebi quão importante aquela imagem tinha se tornado. Em questão de dias, a polícia de Londres enfrentou uma reação negativa pela forma como interrompeu a vigília e o assassinato de Everard repercutiu entre mulheres de todo o mundo que já sofreram violência e abuso sexual."

Homem é detido pela polícia após uma briga durante uma reunião do conselho escolar do Condado de Loudoun, em Ashburn, Virgínia, nos EUA - Evelyn Hockstein/Reuters - Evelyn Hockstein/Reuters
Homem é detido pela polícia após uma briga durante uma reunião do conselho escolar do condado de Loudoun, nos EUA
Imagem: Evelyn Hockstein/Reuters

Evelyn Hockstein: "As salas de aula americanas se transformaram em um campo de batalha político, com vários estados liderados por republicanos aprovando regras para limitar o que pode ser ensinado nas escolas públicas sobre o problemático legado de relações raciais dos Estados Unidos. Eu fazia a cobertura do noticiário local na Virgínia e esperava que a reunião do conselho escolar em Ashburn sobre esse assunto poderia se tornar acalorada. Mas não imaginava que a polícia retiraria duas pessoas algemadas.

Uma multidão de centenas lotou a audiência e ela se tornou tumultuada, levando o conselho escolar a encerrá-la e deixar a sala. Começou um pandemônio. Percebi uma comoção no lado oposto da sala e um grupo de policiais. Consegui chegar ao local, mas minha visão estava bloqueada. Consegui subir em um assento vazio e pulei várias fileiras de assentos até chegar mais próxima de onde a ação se desenrolava. Olhei para baixo e vi a polícia imobilizando um homem com a boca ensanguentada. Um homem agarrou minha manga por trás de mim e gritou para que eu saísse dali. Não sabia se ele estava tentando tirar fotos com seu celular ou se estava tentando me impedir de fotografar a cena, mas o ignorei e continuei fotografando.

Apesar de ter ficado surpresa com a forma como a noite se desenrolou, o caos e fúria que fotografei ao final pareceu mais outro reflexo das tensões que tomam todo o país há anos."