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Britânicos recebem mal novas medidas restritivas contra covid-19 e criticam governo

Premiê britânico, Boris Johnson, em Northallerton -
Premiê britânico, Boris Johnson, em Northallerton

Vivian Oswald, correspondente da RFI em Londres

13/10/2020 07h23

Ninguém pode se dizer surpreendido. As medidas ainda mais restritivas que o Reino Unido anunciou ontem para conter o avanço rápido do novo coronavírus já vinham sendo ventiladas pela imprensa. Nem por isso foram bem recebidas. Teme-se que governo não esteja sabendo lidar com a crise, ou que não tenha um plano claro de ação.

Os casos de contaminação dispararam no país e estão crescendo exponencialmente: quadruplicaram em menos de um mês. Por isso, os cientistas que aconselham a equipe do primeiro-ministro Boris Johnson já vinham defendendo medidas mais duras há semanas. Mas eles não pareceram satisfeitos com o novo pacote anunciado ontem.

A partir de hoje, cerca de 22 milhões de pessoas estarão sob algum tipo de restrição ou confinamento local, o que representa um terço da população britânica. E o premiê disse que outros 9 milhões na capital podem em breve ter que respeitar as mesmas medidas.

Criou-se um sistema em que se dividem as regiões do país em três níveis de risco, que estarão submetidas a mais ou menos restrições dependendo da posição. Liverpool foi colocada no nível máximo e já está sob regras duríssimas.

População insatisfeita

Se os especialistas não estão felizes, a população, muito menos. Estão todos cansados dessas medidas restritivas. E o pior: sem saber se elas serão suficientes.

As pessoas se perguntam se não estão pagando um preço muito alto para que o vírus, ainda assim, avance desta maneira. Um dos maiores temores do primeiro-ministro é ter de anunciar que não haverá celebrações do Natal em família.

E esta é uma data pela qual os britânicos têm verdadeira obsessão. Mas Johnson admitiu que outras restrições podem estar por vir.

O grande problema é que o governo sabe que o resultado de novas medidas sobre a economia será o pior possível. No segundo trimestre desse ano, o PIB (Produto Interno Bruto) —a soma de todas as riquezas produzidas no país— encolheu 20,4%.

Cerca de 700 mil postos de trabalho foram suprimidos durante a pandemia no Reino Unido. A fila de trabalhadores atrás do seguro-desemprego subiu para 2,7 milhões. Quem ainda está empregado, não sabe até quando poderá contar com seus salários.

Clima de tensão

Tudo isso aumenta o clima de tensão. Além disso, a primeira onda da covid-19 aconteceu durante a primavera e o verão, estações que foram muito generosas este ano.

A segunda vai acontecer a partir do outono e entrar pelo inverno, quando as temperaturas baixam e os dias são mais escuros, o que deve influenciar o moral das pessoas e, até mesmo, a sua vontade de cumprir as regras.

Os prefeitos, sobretudo no norte do país, ficaram irritados. Não queriam que fechassem as suas cidades. Johnson afirmou que eles também terão de tomar outras medidas. O premiê está querendo repartir com os municípios um pouco da responsabilidade de dar as notícias ruins à população.

O governo anunciou mais £ 1 bilhão (cerca de R$ 7,2 bilhões) em ajuda financeira e disse que vai pagar dois terços dos salários dos trabalhadores que forem obrigados a parar.

Esse é o caso de muitos funcionários de pubs pelo país. Mas isso não vai ser suficiente para garantir os empregos, nem a sobrevida do setor. Associações de pubs dizem que mais de um terço do segmento já vinha operando no prejuízo e não descartam levar o governo à justiça contra as medidas recentes.

Protestos contra restrições e uso de máscaras

O país está dividido. Tem gente que quer, como em outros lugares da Europa, o fim das restrições e é contra o uso de máscaras. Houve protestos importantes no Reino Unido nas últimas semanas.

Além disso, neste momento, é o norte da ilha que vem sofrendo com o maior número de casos de Covid e restrições nesta segunda onda da epidemia.

Isso traz de volta o velho debate sobre o norte empobrecido e o sul rico do país. Johnson se elegeu nos currais eleitorais da oposição trabalhista no norte prometendo não esquecê-los, nem deixá-los para trás.

Para o líder trabalhista, Keir Starmer, que vem apoiando as medidas restritivas do governo, a equipe de Boris Johnson está vários passos atrás da curva da doença e já não sabe se ele conseguirá controlá-la.